O CAVALO NA ESTRADA

Durante o verão Olga aproveitava todas as folgas e fins de semana para passear com os filhos em praias distantes, acostumou-se a percorrer estradas tranqüilas e silenciosas, especialmente ao entardecer. Por todo o trajeto, o reconfortante silêncio até a estimulava a juntar a voz desafinada ao som do carro.

Logo depois do almoço daquele sábado e de perda de tempo para escolher o quê jogar dentro das sacolas, eles estavam prontos para sair sob as primeiras sombras do ocaso.

Há poucos metros da encruzilhada antes da pousada onde pretendiam ficar o motor do carro começou a morrer. Com a intenção de retornar ao posto de gasolina avistado há pouco tempo à margem do caminho, depois de muita insistência ela convenceu as crianças a descer para empurrar. Por sorte o motor respondeu e chegaram ao posto; bastou o exame superficial de um mecânico jeitoso para identificar o motivo do pretenso defeito: esquecera de encher o tanque!

Resolvido o problema, depois de um bom lanche a viagem recomeçou. A noite desceu durante o percurso que os levaria finalmente à pousada, pela primeira vez Olga fazia o percurso de faróis acesos. Sentia os nervos à flor da pele, inquieta, ansiosa por chegar ao destino.

De súbito, sem que previsse um grande vulto correu na frente do carro. Tentou desesperadamente acionar o freio; diante do forte impacto e muito relincho perdeu por instantes o controle até conseguir parar. Ao ver o cavalo estatelado sobre o capô as crianças começaram um berreiro incontrolável. Na estrada escura e deserta, nada ou ninguém para justificar a aparição do animal desembestado.

O choro descontrolado de mãe e filhos ecoou pela escuridão. Por milagre não haviam sofrido lesões graves, além do pavor diante do pobre animal contra os vidros do pára-brisa.

Depois de algum tempo de pânico Olga ajudou as crianças a abandonar o veículo, apalpou-as nervosamente à procura de ferimentos e contusões para certificar-me que estavam bem, só então readquiriu o autocontrole. Apanhou a lanterna no porta-malas para clarear a estrada deserta, fechou o carro sem coragem de olhar o cavalo que involuntariamente atropelara, deu as mãos aos filhos e começaram a andar.

Acompanhados de vez em quando pelo coaxar de sapos e o piscar de vaga-lumes chegaram à pousada; somente quando entraram no quarto que lhes fora destinado ela se lembrou do celular na bolsa e chamou o socorro.

O reconfortante silêncio quebrado pelo contínuo marulhar de ondas

na areia da praia e o movimento das crianças pelo quarto antes de se acomodarem em suas camas serviu para devolver-lhe a necessária serenidade para enfrentar as conseqüências do acidente, o veículo danificado e todos os contratempos por não ter visto o cavalo solto na estrada erma.

Maria da Conceição Cardim Pazzola