Pedras na vidraça; estilhaços

Pedras na vidraça; estilhaços

A mediocridade é como o entupimento nasal; incomodo e incurável, no entanto inerente à raça humana.

Eu na desprezo mãe ou pai, somente a mim e à minha sociedade torpe e “sem preconceitos”.

Desprezo essa manipulação psicológica vil. À qual chamamos de caridade, bondade. Pura falsa que atribui a crápulas disfarçados de moralistas adjetivos como: pessoa boa e alma cristã.

Desprezo pela segunda vez a mim mesmo que faço de tudo – idiota! – para ser o que as pessoas, ou melhor, os manipuladores esperam que eu seja e, no entanto jamais consigo. E os culpo por não perceberem – como se fossem telepatas - as mudanças que só consegui fazer dentro, aqui dentro.

Até as donas de casa são desprezíveis. Tão prendadas, velhas, solidárias, dativas. Na verdade têm no seu âmago os mais ramificados preconceitos.

Desprezo os louco por sexo, que não conseguem encontrar a si mesmos e procuram achar (que redundância) os corpos alheios que aplacam sua solidão.

Mergulhado nesse profundo desprezo que eu vejo raiar o dia sob o som ensurdecedor do despertador barato em meus ouvidos. Levanto assim, desprezando a tudo (quase tudo) e a todos (todos!).

Nesta manha, como as anteriores e as conseqüentes, certamente eu me sinto mais fracassado, farto, com o sentimento de inacabado e, sobretudo feio e com fome – o que eu queria? Se aqui em casa não há espelhos... muito menos comida. Minha madrasta saiu. Tomo um café - ralo pra não gastar – mordo um resto de pão que certamente um ratazana mordiscou. Há algo inacabado. Visto a camisa da escola (segunda-feira a camisa da escola está um horror de mal cheirosa porque tive preguiça de lavá-la no fim de semana. Perfume barato resolve), visto a calça comprida que foi de alguma classe media que me deu por caridade (idem). Sapatos barulhentos. Meia rasgada, mas bons livros.

A escola é um nojo, os professores intragáveis, os colegas são como o cheiro do fundo da casa da vizinha, morrinha a que a gente se acostuma.

Me apaixonei por quase todas as meninas bonitas – porem detestáveis – da escola. Todas me acham legal com aquele ar de deboche delas. “O antiquado enterrado na leitura” Leio muito, deveras, negro lendo amedronta e o medo das pessoas é refletido nas desculpas de que acham que vou ficar louco ou que não tenho o que fazer. Escrevo também, estou sempre de maresia e me relaciono hipocritamente bem com quase todos os professores. O pior de tudo: ostento a cara de quem realmente tira boas notas. E tirar boas notas é um absurdo.

A primeira professora entra na sala falando sobre universidade, vestibular, essas coisas.

Faço planos que meu ego não me deixa segredar já que falamos disso mesmo para aparecer, não acredito em nenhum deles. Graças a Deus que ela fala tudo resumido e de má vontade, suprimida pela consciência de ter que cumprir seu dever como vomitadora de conhecimento – esse é um chamamento carinhoso para os meus educadores devidamente (trans) formados pelo estado. Até Piaget acharia bonito.

Ela sai da sala acreditando que com dez palavras nos deu um amplo quadro do que é globalização. É. E ainda acha que deu a aula dos nossos sonhos. Claro, todos os vomitadores se acham realizados na sua profissão.

Segundo horário.

O barrigudo não veio só nos sobram as barrigudas.

Não tenho animo para paquerar garotas como os meus colegas acéfalos. Tão meigos!.

Também nunca tive mesmo. Sou daqueles zeros à esquerda que esperam a princesa encantada. Como explicar isso? Apaixono-me por todas as que vejo. As bonitas porque beleza interior é demagogia. Não respiro sexo também, nem falo, vivo, arroto e nem faço sexo. (Virgem por livre espontâneo abandono).

Terceiro-horário.

Após eu ter lido bastante, lá vem pontual o modelo de professor que eu serei um dia, o modelo de competência que eu almejo, o modelo de tudo quanto é coisa que eu jamais serei, mas que me consolo em ver que alguém já é: O vomitador veterano.

- Bom dia – ele diz com a voz de nojo.

- Como foram no feriado? – a pergunta disfarça a gentileza e todos se surpreendem e se empolgam. Ao que ele corta: - podem calar a boca e me mostrem os exercícios da aula passada.

Nos levantamos pesarosamente, desconsolados. A grávida, treze anos de idade, foi a primeira. Ele olhou sua barriga (e seu futuro) e balançou a cabeça negativamente.

-Assim não dá! – Exaltou-se com os murmúrios no funda da sala. Depois das devidas formalidades e eu não ter lhe entregue o caderno, óbvio, ele começou a aula. Alguém no fundo da classe murmurou algo e o desagradável disse: - Quero que vocês (se lenhem ele quis dizer) se virem. Deixou o assunto como dado e saiu.

Os alunos, patetas apalermados, incapazes de usar mais de neurônio, gostaram.

O último horário foi ocupado pelo vomitador intra-didática chefe.

Quando ela conseguia dar um pedaço de aula – aula consiste em textos ininteligíveis escritos no quadro. Finalmente faz o costumeiro: trabalhos extra-classe (ou trabalhos longe da minha fuça, miseráveis). Ela nos liberou 30 minutos antes do horário. Certamente ela iria cochilar na sala dos vomitadores.

Acompanhei umas colegas até o portão da escola. As elogiei com elogios nada casuais, delicadezas, gentilezas, charmes e risos.

Detesto e antipatizo as duas. Patricinhas decorebas, todas são.

Enfim, fui para casa para odiar mais uma porção do mundo. Amanhã trem mais aula. Espero que eu consiga vir. Se eu visse algo lucrativo nisso! Mas escola não é lucro nem prejuízo, é ajustamento.

Epílogo

Desculpem as redundâncias, travessões e parênteses. Desculpem a falta de alguma mensagem de esperança. Mas na falta delas: “salvem os pandas para que haja algum para congelar o sêmen e, quem sabe ressuscitá-los no futuro”...

Emerson Cruz 14.08.2008