Era uma vez... - Parte 1

“Era uma vez um menino chamado Humberto. Não tinha bicicleta e não gostava de gatos. Cresceu e continuou com o mesmo nome, mesmo que muitos o chamassem Bertinho, ainda assim, na escola a professora o chamava de Humberto. Como não tinha amigos preferia se esconder debaixo das mesas. A mesa da cozinha de sua casa tinha quatro pernas e mesmo sendo quadrúpede não conseguia se locomover sozinha. Às vezes caminhava até o canto da cozinha pra que Dona Alzira lavasse o chão. Quando Humberto cresceu, não quis mais se esconder debaixo das mesas, mesmo não tendo amigos”.

“Era uma vez uma mesa que não gostava de gatos. A professora – ainda que estivesse bem próxima da aposentadoria – ia à escola todos os dias, e na escola tinha muitos alunos que tinham bicicletas. Alguns magros e outros gordos, mas sempre alunos, e caminhavam nem sempre sozinhos com suas bicicletas. A professora nunca mudou a mesa de lugar por não haver mesa alguma. Havia, sim, uma escrivaninha marrom pintada com verniz. Humberto, que não gostava de gatos e não morava debaixo das mesas, participou de um grupo de estudo que desenhou veias, artérias e o coração”.

“Era uma vez um gato que não sabia desenhar veias, artérias ou o coração. Humberto, ainda que não gostasse de gatos, nunca disse a ninguém que não gostasse de gatos por eles não saberem desenhar veias, artérias ou o coração. Alguns companheiros gordos da classe onde estudava, andavam em suas majestosas bicicletas. Alguns companheiros magros da classe onde estudava, andavam em suas majestosas bicicletas. Os gatos não sabem andar de bicicleta”.

“Era uma vez uma professora que não era quadrúpede como muitas mesas o são. Ela não sabia que Humberto não gostava de gatos. Ela não sabia que Humberto não possuía uma bicicleta. Os gatos, que jamais perturbaram a aula daquela professora, também nunca atrapalharam as andanças de bicicleta daqueles meninos magros e gordos. As veias de Humberto nunca se esconderam debaixo de escrivaninhas. As artérias de Humberto nunca sentiram o prazer de serem pintadas de verniz. O coração de Humberto seria incapaz de fazer mal aos gatos, mesmo sem sentir qualquer simpatia por eles”.