RAIMUNDO E A JUMENTINHA SUA ENTEADA.
DESACONSELHADO PARA MENORES DE DEZOITO ANOS.
Raimundo? Raimundo era um moleque dos seus doze para treze anos. Morava no interior do Ceará, numa das regiões mais inóspita do Estado: Irauçuba. Vivia no meio da caatinga, entre cactos, jumentos, cobras e calangos. Local onde a água é um bem muito raro, como em todo o Estado, só que em Irauçuba além da raridade da água ser uma das maiores do Ceará, a pouca existente ainda é salobra. Água lá é ouro. Mesmo assim, vivendo num recanto isolado e seco como aquele, ele levava uma vida alegre e feliz.
Como qualquer garota da sua idade, gostava de caçar passarinho; jogar bola; brincar de bila – bola de gude; soltar raia – pipa para os sulistas; brincadeiras típicas daqueles tempos, diferente do que fazem as crianças e os adolescentes de hoje, que vivem de jogo eletrônico, internet, droga, bebidas.
Entretanto, a idade já começava a despertar no garoto os interesses sexuais, as paqueras, as namoradinhas da escola. Incentivado pelos mais velhos e mais experientes começou a se conhecer e, lógico, daí para uma punheta foi rápido. Como não podia freqüentar os cabarés da cidade tanto pela pouca idade, como pela falta de dinheiro, o jeito era a mão.
Toda tarde, depois de fazer os deveres escolares, antes de ir para o campo de futebol, Raimundo caprichava uma bronha, sempre dedicada a uma garota de sua escolha. No racha, de tanto se masturbar, não tinha mais quem o quisesse como companheiro de time. Embora fosse craque de bola, faltava coragem. Pique? O forte dele; sumiu! Limitava-se a ficar na banheira à espera da bola chegar nele; fraco que estava de tanto tocar punheta. Se a bola chegasse até ele, tudo bem. Do contrário não ia atrás dele nem por muito dinheiro.
Certo dia, um amigo mais velho um pouco, de uns quinze anos, o levou para o mato. Lá no meio da caatinga havia uma jumenta e Peito de Aço, apelido do amigo de Raimundo, que era chamado assim por ter os ossos do peito para fora, ao invés de um pouco aprofundado para dentro como normal, pegou a jumenta, encostou num barranco e sem qualquer objeção da bicha, meteu-lhe o pau na boceta.
Raimundo viu aquilo, mas inocente, pois naqueles tempos um garoto de treze anos era inocente, os pais os proibiam de tudo, ficou observando os detalhes, e instintivamente também teve vontade de fazer o mesmo. Assim que Peito de Aço terminou de comer a jumenta, disse:
- Agora é tua vez, Raimundo, disse Peito de Aço.
- Minha vez? Mesmo querendo, perguntou espantado o pobre Raimundo. Espantado e com medo de fazer, embora a vontade fosse intensa.
- É. Vai lá e come a jumenta. Vai ver que é melhor do que tocar punheta.
Depois de muita insistência de Peito de Aço, meio acabrunhado, mas como a vontade era maior, Raimundo se rendeu. Depois de muita peleja, daqui e dali, meio envergonhado, com muito sacrifício, por ser também a primeira vez, e conseguir levantar direito o pau, dominar o medo e a vergonha, mesmo assim ele acabou comendo a jumentinha.. Terminou extasiado e com as pernas bambas. O inconveniente de se trepar em pé.
No dia seguinte, logo depois de seus afazeres escolares, por volta da três horas da tarde saiu para jogar bola, tão eufórico e apressado, que recebeu um comentário de sua mãe sobre aquela pressa.
- Eita, que pressa! Parece até que vai namorar!
Raimundo não se deu ao trabalho de responder e se mandou para o campo, porém antes de chegar lá fez um pequeno arrodeio para ir ao local onde, no dia anterior, tinha comido a jumenta e lá estava ela, como se à sua espera. Imediatamente, levou-a para o barranco e nem conversou, também como ia conversar com a jumenta, e mandou ver.
Passou o tempo e ininterruptamente todos os dias era a mesma coisa: terminado os afazeres escolares, Raimundo se mandava para o futebol, cedo para passar onde estava sua querida amante. Até nos estudos melhora bastante. Passou a estudar mais cedo, fazer suas tarefas com mais aplicação para não ter que repeti-las e ficar de castigo como muitas vezes ficara, por não apresentar na escola as tarefas diárias, ou por fazê-las malfeitas. Antes da jumenta, não havia castigo maior para Raimundo do que não poder jogar bola, castigo que sempre levava quando não ia bem na escola. E agora, depois da jumenta, um castigo seria suplício bem maior.
A jumenta com o passar do tempo também já estava gostando e na hora certa, parecia até encontro marcado, quando Raimundo chegava, ela já o esperava.
Certo dia, entretanto, Raimundo foi ao local de sempre e não a encontrou. A jumenta havia desaparecido como por encanto, sem deixar qualquer vestígio. Raimundo ficou triste, desesperado. Passou dias e dias naquela melancolia, parecia que lhe faltava alguma coisa. Garoto inexperiente, não sabia que aquela tristeza era paixão. Não queria comer, na escola passou a tirar notas baixas, com muito sacrifício ia ao campo de futebol, não para jogar, mas para poder sair de casa e passar lá onde sempre encontrava sua amante.
Algum tempo depois, quando ele já não alimentava mais qualquer esperança, eis que ela, simplesmente, apareceu, como desaparecera. Ao passar pelo local, quase que casualmente, pois até disso também já estava desistindo, porque suas buscas mostraram-se infrutíferas, e também, quase resignado com a perda do grande amor de sua vida, evitava um pouco de andar por ali, pois aquele local trazia-lhe lembranças amargas, de uma paixão perdida, que o torturava. Quando se deparou com o animal novamente que, contudo, estava acompanhada. Ao seu lado encontrava-se uma jumentinha, bem pequena, de uns três para quatro meses, filha da amante de Raimundo. Portanto, sua enteada, já que não era filha legítima, pois aparentemente quando Raimundo a conhecera, ela já estava grávida.
Vendo seu grande amor ali, Raimundo foi logo se ajeitando para reatar o antigo namoro e dar uma com ela para matar a saudade daqueles longos meses de ausência e saudades. Encostou-a no barranco, antigo refúgio de seus colóquios amorosos, e como nos velhos tempos foderam ali mesmo na frente da pequena jumentinha. Foi uma trepada inesquecível, para ambos.
Daí pra frente, tudo voltou a ser com dantes. Raimundo novamente frequentava o campo de futebol, com o mesmo fervor. Entretanto, sempre, antes de jogar ele dava uma passada pelo local de encontro. Revia o grande amor de sua vida, dava uma e ia jogar futebol, sereno, leve, feliz, mas sem aquele velho pique que o caracterizava como um dos maiores jogadores da sua região, terror dos goleiros.
Certo dia, porém, quando chegou no seu recanto de amor, Raimundo começou a dar mais atenção à enteada. E dos olhares passou à ação, mesmo sabendo que aquilo era um encesto, um crime, um pecado mortal, comer a própria enteada, ainda por cima menor de idade. Mesmo assim, assumindo as conseqüências de seus atos, foi à luta.
Daí partiu para pegar a arisca jumenta-filha. Animal novo, ainda não domesticado e pouco acostumado com as pessoas, é sempre extremamente desconfiado. Assim, toda vez que ele chegava perto, a jumentinha corria para o outro lado da mãe, contrário ao de Raimundo que não conseguia se aproximar. E nisso, ficou muito tempo; num jogo de gato e rato. Quando ele arrodeava por um lado, a jumenta-filha ia para o outro e nada de pegá-la. Nessa briga, ele teve uma idéia. Tirou as calças, e levemente a jogou por cima da jumenta-mãe no pescoço da jumenta-filha; abaixou-se e pegou a outra ponta suavemente para não espantar a filha. Feito isso, amarrou a jumentinha no pescoço da mãe, arrodeou e conseguiu chegar perto dela. Com a calça presa no pescoço da jumentinha, puxou-a lentamente até uma árvore próxima onde a amarrou e foi se chegando devagar, para tentar concretizar suas intenções.
Como a jumenta era muito brava e arisca, começou a pular, e a dar coices para todos os lados. Raimundo, assim mesmo, não se deu por vencido. Pegou sua camisa, que estava pendurada na árvore, e com ela amarrou as duas patas traseiras do animal. E pôde chegar perto. Entretanto, por falta de experiência ou de força, o nó que deu na árvore soltou-se e a jumenta disparou no meio do mato levando sua calça pendurada no pescoço, deixando-o somente com a camisa na mão, e se embrenhou mato a dentro. Raimundo, atônito saiu atrás de pegar a enteada, para reaver sua calça, mas o animal quando mais se via perseguido, mais corria e entrava na mata, afastando-se dele, que vendo a impossibilidade de alcançar o animal se resignou e se sentou num tronco de pau e pôs as mãos na cabeça já imaginando com sair daquela situação.
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Vendo-se sua calça, amarrada no pescoço da jumenta longe de seu alcance, apenas com a blusa na mão, no meio do mato, Raimundo se desesperou. E sentado ali começou a chorar. E chorou copiosamente imaginando com chegar em casa nu, tendo que atravessar toda a cidade pelado. Depois, assombrava-o mais ainda a justificativa que teria que dar a seu pai e convence-lo a não lhe dar uma grande surra.
O velho era brabo, do interior cearense, e quando batia nos filhos, batia com relho de amarrar animal. Cada chicotada que dava ficava a marca, depois a mãe do menino tinha que cura-lo, botando compressas de água morna e sal para não inflamar.
Chorando e imaginando tudo isso, Raimundo não se deu conta de um vaqueiro que chegou perto dele montado num cavalo. O vaqueiro falou com Raimundo que, absorto em seus pensamentos, teve um sobressalto. Até pensou que era seu pai, que o flagrava naquela condição. Porém, vendo o vaqueiro, tentou de todas maneiras disfarçar sua nudez, mas não houve jeito.
O sujeito perguntou-lhe o que fazia nu no meio do mato.
Sem uma justificativa plausível para o caso, Raimundo resolveu contar a verdade, pois não via outra forma.
- Eu estava aqui tentando comer aquela jumentinha acolá, e apontou na direção do animal que se encontrava a uns quinhentos metros do local, acompanhada da mãe que correra para perto da filha, e não tendo como amarrá-la, por falta de uma corda, resolvi usar minha calça. Acho que não amarrei direito, ela se soltou e fugiu levando a calça no pescoço. Tentei pega-la, mas quanto mais eu tentava mais ela se afastava. Quando vi que não conseguiria me sentei aqui e fiquei chorando com vergonha, imaginando, caso não reouvesse minha calça, como chegaria em casa tendo que atravessar toda a cidade, nu e também como explicar para meu pai a perda da calça e convence-lo para não apanhar.
Comovido com a situação do menino, o vaqueiro se prontificou a apanhar sua calça e foi atrás da jumenta. Algum tempo depois, ele volta com a calça de Raimundo, que aliviado pôde ir tranquilo para casa.
Não apanhou, mas perdeu a amante, pois a história se espalhou pela cidade. Envergonhado, sabendo que as pessoas o vigiavam, para ver se ele ia atrás da jumenta e flagrá-lo comendo o animal, nunca mais foi ao local de encontro. Contudo, de vez em quando passava por uma vergonha, a jumenta não agüentando a saudade do amante, procurava-o pela cidade e quando o encontrava, relinchava insistentemente para chamar-lhe a atenção. Com muita vergonha, Raimundo procurando disfarçar, se retirava para casa tentando se livrar do assédio sexual do animal.
HENRIQUE CÉSAR PINHEIRO
FORTALEZA, JUNHO/2008