O QUE LÁ SE ENCONTRA?
Já faz um tempo que busco evitar falar no assunto, porém agora é fato consumado a necessidade imperiosa que me leva a escrever estas páginas. Esquivei-me por tanto tempo pois o medo das memórias me era grande demais; ou melhor dizendo, a sensação desagradável das lembranças me provocava náuseas no corpo, na mente e no espírito. Para ser sincero, as memórias agora são insuportáveis, pois emergem a minha consciência imagens e sons horrendos numa torrente repulsiva. Sem mais delongas, devo iniciar o mais brevemente possível minha estória para que possa acabar o mais rapidamente que puder.
Tudo começou quando visitei a cidade de Monte Áureo, no interior das serras de Minas Gerais. É uma região que por sua geografia, encontra-se constantemente encoberta pelas nuvens acinzentadas. Quando meu carro chegou pela estrada de terra batida, deparei-me com a imagem da cidade que em muitas de suas casas consegue manter o passado colonial em suas paredes e telhados. Lá estavam ao meu redor os poderosos montes das região que cercavam a cidade, dando, associados à imagem das formações cinzentas no céu, a impressão opressiva de se estar aprisionado, intensificada pela pequenez do homem diante da imensidade das montanhas– talvez seja essa a sensação horrível do cataléptico quando desperta e se toca que está enterrado vivo. O que era aquela sensação em termos precisos não posso dizer, porém sei que trazia consigo o sentimento da melancolia, o peso da opressão sobre o espírito, uma forte idéia de infelicidade inefável. Era estranho, pois muitas regiões serranas apresentam esse caráter nebuloso no céu, apresentam a mesma imensidão de escarpas, porém jamais traziam consigo aquele desagrado. Somente penso que detalhes que os sentidos conscientes ignoram, ao serem contemplados pelo subconsciente acarretam neste estado tão ignóbil sobre a psiquê.
Eu viajava naquela época para visitar um amigo de meu pai, que depois de muito tempo sem vê-lo decidiu que eu lhe fizesse uma visita. Afirmava a necessidade ulterior de que eu me desloca-se até aquela região isolada de Minas, ratificava a todo o momento na carta que me mandara o desejo que tinha de me mostrar algo que me seria de muito interesse. Segundo suas próprias palavras: “o que tenho a te mostrar será de muita importância para que possa entender finalmente o mistério que acerca o caso de seu pai”
O mistério que acerca o caso de meu pai, como disse ele, se refere ao desaparecimento de meu pai quando eu tinha dez anos de idade. Numa dada noite meu pai saiu para se encontrar com esse amigo, Fernando, para conversarem um assunto de escritório muito importante pelo que meu desaparecido pai comentou com minha mãe naquela noite. Após dado tempo minha mãe pressentiu algo de estranho com meu pai– uma dessas sensações que as mulheres costumam ter com seus maridos e com seus filhos mais amados– e ao ligar para a casa de Fernando, descobriu que eles já haviam se despedido há muito tempo. A polícia foi acionada depois das quarenta e oito horas, iniciando uma busca por todos os locais onde meu pai tinha hábito de freqüentar, nenhum sinal; foi procurado por toda Belo Horizonte, nada. Depois de um tempo nos convencemos de que ele estava morto. Agora, com esta mensagem, eu sabia que Fernando sabia a verdade que envolvia o desaparecimento e possível morte de meu pai. Minha curiosidade foi enorme, não pude controlar a vontade de atender o chamado deste homem que poderia elucidar a verdade que está por trás do desaparecimento de meu pai.
Esse amigo de meu pai era um homem muito tímido; para ser sincero, poucas vezes eu o vi ao longo de minha infância, quando meu pai ainda estava vivo, e menos o vi quando era adolescente ou um jovem adulto. Foi somente por conta do endereço que se encontrava na carta que pude descobrir seu paradeiro, em virtude de ter sumido da vista de todos os amigos, os poucos que tinha, um ano depois da morte de meu pai, um ano que– segundo minha mãe me afirmou nessa época– já era marcado por um profundo isolamento e por um caráter cada vez mais neurótico; desta forma, já era passível de se esperar que ele, pelo menos, havia se mantido neurótico da mesma maneira que se encontrava antes de seu auto-exílio. Foi munido destas informações que eu, em meus vinte e cinco anos, me desloquei para a tão isolada Monte Áureo.
Eu levei mais ou menos seis horas de viagem de Belo Horizonte à Monte Áureo. Uma viagem um tanto quanto desagradável por conta da sinuosidade das estradas que sobem até onde a serra engole o Vale onde se encontra aquela pequena cidade mineira. Como já disse, uma cidade– se não o fiz me desculpe– cujo centro era marcado pela série de casas coloniais organizadas em uma espécie de grade, excetuando-se aqui e ali por um prédio mais moderno, fruto da arquitetura modernista do século XX, ou o maciço prédio da Universidade Hoffmann-Finholdt ou o do Hospital Sírio Libanês Haruddin Nasser– dois colossos que se destacam sobre a visão monótona das casas brancas coloniais muito bem conservadas que, estranhamente, me davam uma impressão de decadência célere.
A primeira coisa que fiz ao chegar na cidade foi me deslocar a uma espécie de botequim, um lugar um tanto sórdido onde os homens se reuniam naquele dia para beber cachaça e assistir um jogo que passava na televisão. Sabendo que numa cidade como essa, com pouco mais de dez mil pessoas e isolada do resto do mundo, era grande a chance das pessoas conhecerem os forasteiros que ali se estabeleciam. Chamei a atenção do homem que parecia ser o dono do bar, um gordo de feição um tanto quanto amigável, apesar de desconfiada. Pedi um copo de cachaça e comecei a abrir conversa.
– Por acaso, meu amigo, você sabe se nessa cidade mora um homem chamado Fernando Lopes Matos? Ele veio para cá há uns quinze anos, me disseram que é meio alto e seu cabelo é ruivo. Sabe de quem eu estou falando?
– Uai! Acho que sei de quem você tá falando, esse daí é o Fernando doido, tadin… esse daí é um caso perdido.– pigarreou e prosseguiu– mas sempre o danado foi assim, desde que chegou por essas parte já era doido de pedra. De vez em quando ele aparece na rua falando sozinho, a gente não entende muita coisa só dá pra ter certez mesmo quando ele fica dizendo “que horror! Que horror!” pois aí ele já tá gritando doidinho doidin. Ele é maluco, mas deus fez com que ele pudesse tomar conta de si mesmo pois ele é bem rico e sabe se virar– também pela graça de deus-todo-poderoso-, a gente não tem medo dele não, pois ele é bem calminho e de vez em quando a gente até vê que ele pode falar com muita cabeça sobre muitos assuntos.
“É engraçado ver ele falando com criança. Ele chama a atenção de uma criança com uma facilidade incrível, coisa que muitos pais aqui gostariam de fazer igual, mas é uma pena que não sirva de nada. É triste, pois ele chama as crianças prum canto, onde todos os possam ver e começa a falar um bando de bobagem, não essas bobagem desse bando de cachaceiro– Não, longe disso! Ele fica falando de coisas que até criança acha que é mentira, fica falando que há sempre um perigo para a humanidade, que deus (olha só que absurdo!) não existe, que estamos sempre vivendo na… como ele diz mesmo… Ah! Iminência! Fica dizendo que estamos sempre na iminência do fim, que coisas maiores que nós nos esmagarão, que nós somos intrusos num reinado daquilo que nós chamamos de Deuses, que um dia alguém vai acabar, querendo ou não, despertando de sonhos além do tempo. Ele fica falando disso horas a fio, mas nunca consegue terminar os seus discursos, as crianças sempre saem no meio da fala dizendo que ele é um senhor muito chato. Esse é o único que eu conheço aqui nessas cidade que bate com o homem que você tá procurando, fi”
Fiquei pensando um pouco. A descrição que ele me passava do amigo de meu pai, parecia bater tanto física quanto psicologicamente com o que eu imaginava da pessoa de Fernando. Sinceramente, a situação que o dono do botequim relatou me soava bem pior que aquela que eu imaginava antes chegar até aquela região. A única coisa que me impelia ainda a procurar por ele fora a lucidez com que externara sua vontade de me ver, demonstrando uma lucidez precisa e sucinta, e o fato de esporadicamente demonstrar essa lucidez a outras pessoas.
– Tudo bem.– disse eu– mas onde ele mora?
– Bom, até um certo tempo ele morava em uma casa ali no bairro dos ferros, uma casa bonita e sempre bem cuidada, com umas pinturas bonitas nas paredes. Eu sei disso pois ele virava e mexia pedia uma quentinha de galeto aqui no bar (se quiser, depois você me fala) pra ser entregue lá. Mas já tem um tempo que el tá morando lá num casarão na parte alta da cidade, ele tá morando lá desde que recebeu um troço estranho já tem um pouco mais de uns dois meses…– nesse ponto eu o interrompi
– Que negócio era esse?
– Pra falar a verdade, eu não sei.– se aproximou um pouco do meu ouvido– não sei mesmo, mas eu tenho uma má impressão do que ele recebeu. Vieram uns caras muito do mal-encarado, entregaram pra ele um enorme baú preto, mas muito grande mesmo! Era um baú de pedra bem preta, parecia grânito ou coisa mais escuro, tinha uns detalhes bonitos e que só me davam mais medo, uns desenhos em vermelho e que faziam imagens estranhas pra caramba.
– Pode me dizer onde é que fica a casa dele?
– Claro! Claro! Faz o siguinte: segue em frente por essa rua, vai seguindo em frente até que você vai ver uma Igreja meio mal-cuidada, nessa hora vira pra esquerda, segue reto depois e vira a direita; então você vai estar numa rua cheia de casarões, nessa rua é onde ele mora, na segunda casa a esquerda
– Entendi, obrigado.
Segui o caminho que ele me disse, levando coisa de meia hora de carro para fazer o percurso todo percurso dito. Estacionei o carro bem na frente da casa, uma enorme casa bastante confortável pelo que parecia, resquício que restava de alguma família tradicional que foi levada a falência pela quebra da bolsa. Os telhados e a fachada seguiam um modelo francês, com uma aparência que, segundo me diziam minhas noções de arquitetura, deveriam pertencer ao estilo que se espalhou em Paris depois da reforma empreendida pelo Barão de Hausmann. Seus vidros eram muito bem cuidados e tratados, embora não mostrassem os interiores da casa, pois atrás havia cortinas negras e pesadas pelo que dava para ver, essas cortinas davam-me uma sensação ruim, uma opressão muito maior que aquela que se encontrava no céu pesado e baixo, na minha pequenez ante a serra que me engolia como um leviatã, uma opressão maior que essas duas e maior até que o conjunto das três, o qual me causava a pressão vertiginosa que afeta o homem tomado pela claustrofobia, horrenda como o peso pétreo do féretro. Fiquei ponderando sobre a questão por um bom tempo desligado do mundo ao meu redor; voltando à realidade, toquei a campainha.
Quem me atendeu foi um homem de aspecto doentio, como já esperava que fosse Fernando Matos Lopes. Sua pele era macilenta, da consistência de um legume apodrecido, seus olhos estavam adornados com olheiras fundas e roxas e eram vermelhos quase ao ponto do albinismo, o olhar era neurótico e não conseguia se manter em um ponto fixo, demonstrando assim sua fisionomia toda a fragilidade mental que se encontrava. Não somente isto me dava a impressão de insanidade, mas sua postura quase de quasímodo, seus lábios que se contorciam freneticamente feito vermes, a agitação das mãos. Tudo me mostrava algo que estava situado no meio do campo que separa a razão da loucura, embora saiba hoje que esse campos não é nada mais que a continuação dos outros dois.
– Quem é você?– disse numa voz que soava patética e melancólica. Não respondi diretamente, pois duvidava que ele não fosse também paranóico, somente fiz com que ele lesse a própria carta que havia me escrito. A face que se desvelou ante mim naquele momento chegava a assustar de tão bizarra– ó Meu Deus! Arnaldo, é você mesmo? Nossa Senhora, está a cara de seu pai nessa idade. Foi isso o que de mais importante surgiu de suas falas iniciais, depois disso, foram somente lamentações e resmungos de louco.
Entrei junto com ele. A casa tinha uns parcos móveis na sala, somente umas poltronas muito antigas e rústicas, uma mesa onde havia somente três cadeiras. Uma ambiente que me parecia normal para uma pessoa solteira, embora incompatível com os fundos que eu imaginava que ele tivesse para comprar uma casa dessas. Do pouco que pude ver, a cozinha era uma coisa quase deserta e pouco usada. Mas o que impressionaram-me realmente foram as prateleiras cheias de livros que havia no corredor do andar superior, não eram prateleiras como a da maioria dos amantes dos livros, cheias de livros novos e no máximo um ou outro livro de sebo ou que já está na família a certo tempo, eram naquele caso livros de toda sorte de velharia, muitos de páginas que mais pareciam papiro que papel. Senti um pouco de calafrio naquela situação, um calafrio tão pungente que me levou a certeza absoluta de não aceitar sob qualquer hipótese o convite que fosse para dormir ali. Eu deveria buscar chegar ao objetivo da minha vida o mais breve possível.
Eu estava agora muito sensível, para não dizer suscetível, havia toda uma impressão ali naquele ambiente que me dava idéias ruins e macabras. Talvez o leitor já tenha tido aquela estranha impressão que é olhar para um lugar e sentir uma onda percorrer a espinha, uma sensação de que talvez os médiuns mais sensíveis possam dizer com toda sua certeza e noção teológica de que é o espírito humano sentido a presença dos espíritos que passam, talvez alguém dissesse que ali era um pressentimento forte– conseqüência direta de capacidades do cérebro que a neurologia e a psiquiatria ainda não foram capazes de elucidar de uma maneira conclusiva. Eu olhava todo aquele desfile de livros negros e antigos e sentia um medo profundo, como se a memória coletiva da humanidade estivesse gritando o horror que aquele livros deveriam conter. Minha mente se agitava agora e desejava agir para que pudesse escapar de toda aquela atmosfera sombria, medonha, satânica! Eu estava desesperado, desejava ir embora, tudo ali me dava medo.
– Por favor, teria como o senhor me mostrar aquilo que gostaria de fazê-lo– disse bruscamente, rompendo com o silêncio pesado. É que infelizmente eu devo voltar ainda hoje para Belo Horizonte se o senhor não se importa.
– Claro, claro, imaginava que um rapaz da sua idade fosse me pedir isso, já estava levando para ver a verdade dos fatos. O pensamento de que ele sabia a verdade inerente ao desaparecimento de meu pai, em associação ao fato de que eu atravessava uma ambiente que me dava uma impressão de ser maligno– para não dizer diabólico– fez minha espinha tremer, fez minha pele arrepiar, fez meu coração pular de medo e ansiedade. Porém, não fora isso a causa do verdadeiro calafrio que eu senti, ele, o calafrio, era oriundo do fato dele ter previsto meu medo.
Pediu-me para acompanhá-lo. Continuamos a passar por aquele corredor até chegar a uma grande sala de porta de madeira maciça, que ele abriu na nossa direção, trazendo consigo um vento frio e ruim. Era uma sala que dava um aspecto muito fúnebre, mais que o resto da casa, pois as cortinas– que não vi da frente do casarão– eram negras e pesadas, feitas de um tecido muito grosso que impedia a luz de ultrapassá-lo. Não havia nada ali, exceto a luz fraca de uma lanterna posicionada no centro daquela imensa sala, que era daquelas luzes bem antigas que são suspensas por um cabo até uma altura boa, mas lá ela ficava balançando, criando um efeito bruxuleante de sombras nas paredes, fato que só reforçava a impressão que eu tinha de que havia fantasmas mas ali passando.
– Mas… aqui não há nada!- Disse abismado com o vazio daquele ambiente
– Meu amigo, você diz isso pois não estava vendo direito, olhe para aquele lado novamente– disse apontando para um lado oposto àquele onde estavam as janelas e que estranhamente havia uma cortina igualmente negra.
– O que há ali?
Chegou perto de uma da cortina, onde surgiu em sua mão, no meio daquela penumbra, uma corda. Disse para que eu me aproxima-se mas não muito de onde estava a cortina. Depois dele demarcar a distância que lhe parecia boa, pediu para que contempla-se o que ia me mostrar.
Quando a cortina negra e pesada foi puxada, revelou-se ante mim um espelho e um baú que estava a pouco mais de um metro. Era enorme, devia ter talvez uns quatro metros de altura por uns dois de largura; sua moldura era de mármore negro, onde foram entalhadas serpentes de ambos os lados e que convergiam no exato meio e sobre as quais se localizava uma bizarra escultura de um corvo negro de asas abertas e olhos vermelhos e bico aberto. A superfície do vidro era cristalina e muito bem polida, denotando uma singular beleza no trabalho. O conjunto era magnífico apesar de bizarro e – por que não dizer?– gótico, apesar de não se enquadrar ao stricto sensu da palavra.
– O que é isso?– disse sem encontrar o elo entre o desaparecimento de meu api e o espelho estranho.
– Isto, meu rapaz, é o espelho de Umbadur! Nele seu pai desapareceu.
E prosseguiu:
– Seu pai, assim como eu, apreciava de pesquisar sobre esse tipo de coisa, e descobrimos os incríveis poderes que esse artefato trazia consigo.– disse se aproximando, ficando atrás de mim e à minha direita– nossas pesquisas demonstraram que aqui há mais que um espelho, aqui há todos os universos, todas as dimensões, todos os espaços e todos os tempos, e seu pai se arriscou demais ao se aproximar desse espelho. Olhe– e atirou uma caneta que tinha em sua mão. Num átimo, toda a superfície cristalina havia se transformado numa massa prateada e amorfa, ela se deslocava para frente, na direção da canta, gerando projeções que se transformavam em pequenos tentáculos; tentáculos que em poucos segundos já haviam engolido a caneta. Por um breve tempo, a superfície virou negra como o mármore a sua volta.
– O que eu quero lhe propor, Arnaldo, é que continue comigo o trabalho de seu pai. Eu quero que continue comigo as pesquisas que levarão a sermos deuses nos universos que estão nascendo, nos universos que vão além do espaço-tempo contínuo. Se me ajudar, você será um javé novo! Eu acredito que alguém da sua linhagem não recusará este pedido, não é?
Pensei então naquilo que o dono do bar comentou, nas coisas que Fernando dizia para as crianças em sua tão suposta loucura– aquelas coisas da ameaça cósmica que um dia alguém despertaria para findar com o tempo do homem no universo. Aquele pensamento me trouxe um grande calafrio, pois eu sabia que tudo que podia entrar, se fosse forte o suficiente poderia sair também. O bom senso, e não a noção de bem, me guiavam para dizer não. E foi o que eu fiz.
– Então você não deve sair daqui, meu amigo– disse num pulo.
O pulo, em virtude da sua idade, não teve destreza nem agilidade suficiente para me surpreenderem. Desviei com facilidade, porém ele fora longe demais, seu corpo se aproximou demais do espelho. Numa velocidade espantosa a superfície se estendeu em projeções bizarras sobre o corpo do Amigo de meu pai. Foi engolido em meio a uma profusão de gritos e choro de medo. A última imagem que tive dele foi a de seu corpo contorcido de pavor desaparecendo no interior da infinidade cósmica que o espelho mostrava dessa vez.
Depois disso, fugi de medo e voltei para a Belo Horizonte com a mente muito abalada.
Agora, que estas páginas já estão por terminar, devo preparar meu espírito para aquilo que devo fazer. Depois de anos procurando por este espelho maldito, finalmente o encontrei e posso destruí-lo. Porém antes, a pressão da mente me leva a cometer esse ato horrível– eu me jogarei no interior da superfície para pagar o pecado de ser responsável, em parte, pelo ocorrido com Fernando Lopes Matos; embora não saiba se o que eu faço é melhor ou pior que o suicídio (tendo a pensar na segunda opção). Além disso, eu programo agora um explosivo para que possa explodir assim que eu entrar nos interiores daquele portal macabro. No fim, o espelho será fechado para sempre e não mais nada de ameaça poderá vir por aquele lugar.
É hora de entrar naquelas zonas da Loucura…