[CONTO] - FÚRIA SELVAGEM - Capítulo1 - EU. O LOBO.
CAPÍTULO 1 – EU, O LOBO.
Quinta-Feira, 21 de fevereiro de 2008.
Chega aquele dia do mês quase insuportável.
Com certeza muitos pensam em TPM, mas Gregório é um homem. Mesmo assim em certos dias do mês tudo lhe incomoda: o café fraco da copeira, a risada estridente do Office-boy e até mesmo sua barba cerrada, que precisa ser feita duas vezes ao dia.
Hoje, é a desgraçada da secretária, Cristina, uma ruiva nariguda com a bosta do pagode tocado no rádio.
Gregório é um sujeito alto, com quase um metro e noventa, é moreno claro e cabelos castanhos com uma leve ondulação.
Nada que o incomode. O que lhe incomoda mesmo são os pêlos.
Mesmo assim tem ojeriza da palavra “depilação”!
Quando chega a hora do almoço o rapaz dá graças a Deus por poder sair do escritório por alguns minutos.
Jonathan, o subgerente se aproxima na direção da baia do jovem.
- “Puta merda! É sempre a mesma história! É eu levantar pra almoçar e esse corno vêm com um monte de planilhas pedindo pra mim voltar rápido!” - pensa o assistente contábil.
- Ãn... Greg? Será que você poderia...
Com uma cara fina e cheia de espinhas, o subgerente usa o cabelo coberto de gel e sua gravata torta não ajuda em seu visual almofadinha.
Logo é interrompido por um rosnado gutural, quase inumano.
Todo o movimento no escritório para.
Escriturários, gerentes de Rh e vendedoras de telemarketing, todos olham para o moreno atlético.
Jonathan se sente assustado sem entender por quê. Pode jurar que viu um halo dourado em volta da íris dos olhos do funcionário.
- Ãn... Bem... Vou deixar esta pasta na sua mesa e... Ãn... Bom almoço!
As mãos de Gregório estão trêmulas de fúria contida.
- Tá.
Evitando bater a porta ao sair, o rapaz ganha a rua.
Logo em seguida uma voz feminina o chama.
- Greg! Ei! Greg me espera!
É a Fabiana a auxiliar de RH gesticulando na rua.
O Gregório suspira. Pode sentir o cheiro dela de longe e sua vontade é agarrá-la e fazer amor com ela no mesmo instante.
Contém seus impulsos, pois além de não ser o lugar adequado, a bela negra é noiva.
- Que foi Fá?
- Nossa cara! Você tá muito estressado! Precisa tomar uma “Maracujina”!
Os dois riem um pouco. Ele observa a curva dos seios pequenos na camisa social branca opaca e pensa:
- “Eu sei do que preciso...”.
Fabiana nota os olhares e martela em cima.
- Você precisa é arrumar uma namorada!
Gregório enrubesce, e para disfarçar sua confusão finge olhar no relógio.
- A gente vai almoçar ou vai ficar de papinho?
Conversando animadamente os dois vão até o “Nutrison” um restaurante sob o viaduto Nove de Julho.
O rapaz é fã de um bom churrasco, mas para contentar a moça que é Vegan, sempre vai a algum restaurante vegetariano. A duzentos metros de distância sente o cheiro.
- Ô meu Deus! Penne com almôndega de soja! De novo!
Fabiana gargalha.
- Mentira! Não dá pra sentir o cheiro daqui! – ela aperta o queixo bem barbeado do amigo.
Gregório ri também.
Não saberia explicar para a moça que ás vezes além de sentir o cheiro, consegue enxergar e ouvir muito melhor que qualquer outra pessoa.
Só não entende o por que.
Ao colocarem os pés no restaurante sente outro cheiro. Um cheiro enjoado e levemente ácido.
O cheiro do medo.
Apesar do calor, um homem magro, de moletom e capuz se vira para os dois recém-chegados. Tem uma cicatriz nos lábios finos.
Tem uma arma na mão.
- Deita! – ordena.
A negra, assustada, obedece imediatamente, sujando o terninho cinza.
Com uma sacola plástica repleta de notas e moedas, o assaltante encara Gregório.
- Deita seu viado!
Os olhos do rapaz se enchem de fúria mudando instantaneamente do negro profundo para o dourado.
Sem refletir ao menos por um instante, Greg agarra e levanta a mão armada. O ladrão atira contra o teto.
A arma voa para longe quando o criminoso é lançado contra a parede com uma força descomunal. Ninguém presencia a cena, pois todos estão apavorados e com a cabeça abaixada.
O ladrão desmaia com o choque.
Gregório bufa por algum momento e logo seus olhos voltam à cor normal.
Pouco a pouco os clientes tomam coragem para olhar. A polícia é chamada e Fabiana dá um beijo no rosto do amigo.
- Você é meu herói! Aí! Sua barba está pinicando!
Ele passa a mão no rosto distraidamente. Vai ter que se barbear antes de voltar ao escritório.
Lá o pessoal o parabeniza por sua coragem e os mais invejosos dizem que ele podia ter levado um tiro.
Jonathan escuta com muita atenção tudo o que se passou com um sorriso estranho.
O restante do dia passa tranquilamente.
Parece que toda fúria foi embora, junto com a agressão.
O café aguado não lhe incomoda mais, assim como não liga para o riso do boy ou para o pagode da secretária.
Seis e quinze da tarde os cartões de ponto são batidos e o pessoal começa a se despedir. Chamam Gregório para uma cervejada, mas ele recusa.
Acompanha os amigos até a Avenida Ipiranga e resolve caminhar até seu apartamento na Rua da Consolação, próximo ao cemitério.
O ar na noite de fevereiro é quente e no céu a lua cheia se desenha redonda.
O moreno tira seu paletó, arregaça as mangas de sua camisa social e abre três botões, expondo o peito cabeludo.
Passando pela Rua Major Sertório, vê uma moça vestida um tanto vulgarmente.
- Nossa! Que gato! Quer curtir um pouco gatinho?
Gregório não é muito fã de prostitutas, prefere um relacionamento sério, porém esta noite ele não resiste.
- Quanto?
- Pra você é cenzinho, gato!
Ela o puxa com suas unhas vermelhíssimas para ruas cada vez menos movimentadas.
Chegam a uma rua deserta ao lado do viaduto Amaral Gurgel.
- Não é melhor a gente ir pra um motel?
Ela olha em volta.
- Que nada! Já chegamos!
De entre as sombras emerge um cara grande, com uma faca nas mãos.
- Eaê mauricinho! Vai passando a pasta aí!
Para a surpresa do rapaz, a prostituta arranca a maleta de suas mãos, passando para o lado do bandido.
- Issaí gata! Agora mano, vê a carteira!
Como acontecera durante o dia, uma fúria insana invade Gregório que solta um urro.
Sem pensar duas vezes o ladrão enterra a faca no peito do jovem. Os olhos amarelos se tingem de vermelho e o moreno perde a noção dos acontecimentos.
Do alto do viaduto um rosto conhecido assiste a toda a cena.
Ele acorda sobressaltado em sua cama. Os lençóis, totalmente imundos.
Lama, pó, fuligem e sangue.
Um gosto de ferrugem na boca.
A cabeça de Gregório lateja como se estivesse de ressaca.
- “Ô merda! O que aconteceu ontem?” “Ui! Dói até pra pensar!”
Como em um sonho lembra-se vagamente uma moça, uma prostituta, e um pouco antes, de seus amigos na Avenida Ipiranga convidando-o para beber.
- Caraca! Ontem eu virei o caneco mesmo! Nem me lembro de nada!
Toma um banho demorado seguido por um café preto. O lençol manchado o incomoda, puxando lembranças entranhadas.
... Gritos... O terrível som de ossos se partindo... Algo rasgando...
... O cheiro de sangue...
Gregório tem um calafrio. Logo dá de ombros, deve ser apenas a lembrança de algum filme que assistiu.
Acaba pondo os lençóis e a roupa suja em um saco de lixo preto. Veste seu paletó rapidinho e corre para o escritório Rua 15 de Novembro.
Ele que mora tão perto não pode chegar atrasado. Pega mal.
Naquela Quarta-Feira, seu escritório parece um cenário de guerra: os únicos inteiros naquela repartição são Cristina, a secretária, que é casada, Fabiana, que saiu com o noivo na noite anterior e Jonathan que nunca sai com os outros funcionários.
Aquele puxa-saco!
Todos os outros estão de óculos escuros e cada um com sua respectiva garrafinha de água ao lado de seu computador.
Tremenda ressaca coletiva.
O subgerente, depois da cena do dia anterior, se aproxima cheio de dedos.
- Ãn... Oi Greg. Eu... Tenho algumas planilhas de custos e... Eu... Quer dizer, o chefe, quer pronto até o almoço.
Com medo de mais uma explosão de seu subordinado, Jonathan coloca as planilhas com cuidado na baia do assistente contábil.
Mas Gregório está de ótimo humor, mesmo um pouco zonzo pelos excessos da noite anterior. Derrepente se lembra da prostituta.
- “Acho que a Fá tinha razão. Estava mesmo era precisando de sexo!”.
Mas suas lembranças começam a ficar turvas. Lembra também de um homem, uma briga e depois de ficar sobre a garota de programa e...
...Cheiro de sangue...
- Arrãn! Sr. Gregório? Por favor. Até o almoço sim? – quase implora o subgerente com sua cara de fuinha.
- Tá, tá.
Ele se senta em sua baia ligando o computador.
Repara que sua amiga Fabiana parece um pouco distante. Aproveita uma pausa no serviço e sob o pretexto de tomar a água suja que a copeira chama de café, para na baia da morena.
- Oi Fá! O que você tem?
Ela parece despertar de um transe.
- Ãn? Ah! Oi Greg. Não tenho nada não.
Ele toma um gole do caldo pardo e fervente fazendo uma careta não por causa da temperatura.
- Hum. Sei! Eaí? Saiu com seu noivo ontem?
A lindíssima negra fica transtornada e logo os lábios pintados de rosa começam a tremer. As lágrimas da garota transbordam deixando um risco de rímel na pele escura.
Fabiana se levanta cobrindo a o rosto com as mãos. Começa a soluçar alto.
- Fá?
Cristina sai de sua mesa na entrada do escritório e abraça a garota, levando-a para o banheiro.
- Fá? Fá? O que aconteceu? – quer saber o amigo.
A secretária o fuzila com o olhar.
- Vocês homens são todos uns insensíveis!
As duas entram batendo a porta do banheiro feminino.
Gregório fica igual a um pateta, enquanto vários de seus colegas o olham com ar de censura.
Volta carrancudo para a sua baia.
Mais tarde o Boy, tremendo fofoqueiro, vem lhe explicar o motivo de sua mancada.
O noivado de Fabiana havia terminado. Ela descobriu que o noivo estava lha traindo.
- O cara tava chifrando a coitada! – indigna-se o Boy.
Muito chateado com toda aquela situação, o moreno espera a moça vir falar com ele. Até a hora do almoço, porém Fabiana não se aproximara, e pior: evita ao máximo olhar para Gregório.
Arrasado, ele resolve ir comer uma bela bisteca no Sujinho – Bisteca D´Ouro lá na Avenida Ipiranga.
Após atravessar o Viaduto Santa Efigênia, olha casualmente a capa do Jornal Folha de São Paulo.
- [Lula BláBláBlá. Greve dos BláBláBlá. Juquinha eliminado no paredão do BláBláBlá. Casal despedaçado na Santa Cecília?].
Curioso, compre o jornal.
Vai abrindo o jornal até encontrar o caderno Policial.
Começa a ler andando, repetindo a notícia em voz baixa:
-... Assassinados ontem por volta das vinte horas na Rua Doutor Elias Chaves, junto ao muro do viaduto engenheiro Orlando Murgel. A polícia acredita em retaliação do tráfico de drogas, pois o homem identificado como Orlando Batista da Conceição, 37 anos era um conhecido cafetão e traficante de drogas da região. A moça, Regina Alves da Silva, 25 anos, foi morta provavelmente em função de sua presença no local...
O estômago de Gregório fica embrulhado. Não se lembra do homem, mas a foto da moça não lhe deixa dúvidas: é a prostituta com quem saíra na noite anterior.
- “AimeuDeus! Será que ... Não! Deve ter sido depois! Eu NÃO sou um assassino!
Atira as folhas na sarjeta, correndo de volta para o escritório.
- “Foram os traficantes! Foram os traficantes!” – tenta se convencer angustiado.
Não lê o restante da notícia que diz:
- [Os dois foram despedaçados, provavelmente por vários cães de grande porte.]
O assistente contábil trabalha o restante do dia sob tensão, mas algumas semanas depois nem se lembra mais do fato.
Pagode, risada do Boy e planilhas. Cervejas na sexta, Fabiana gatinha e Jonathan puxa-saco do gerente.
Piadas sem graça, café aguado e almoços solitários.
Os dias passam iguais e um mês depois, Gregório já está estressado de novo.
Na quinta feira, véspera do feriado da paixão, Fabiana para na frente da sua baia.
- Oi! – sorri ela com as mãos na cintura.
Greg fica bobo. Ela está simplesmente linda.
O cabelo crespo preso em um coque deixando o pescoço à mostra. Vestida com uma blusinha creme cinturada, colada ao corpo.
- Ãn... Oi! Pensei que você não ia mais falar comigo...
Ela fica sem graça por alguns instantes.
- Ah! Você tá falando daquele dia né? Desculpa. Eu estava acabada... Dois anos terminando assim derrepente... – a voz de Fabiana fica embargada.
Com medo de que ela volte a chorar, o rapaz moreno se levanta, e pega nas mãos dela.
Separados por um estreito balcão de madeira, sentem uma espécie de eletricidade fluir.
A magia acaba ao mesmo tempo em que o Boy assovia:
- AÊÊÊ! Isso aí vai dar namoro!
Gregório se encolhe e a moça negra fuzila o contínuo com o olhar.
- Fui! Diz o magrela saindo do escritório.
Quando o expediente acaba as seis e quinze todos vão para uma cervejada no Bar.
Entre chopes e bolinhos de bacalhau aproveitam para botar o papo em dia.
Nessa noite, apesar do mal estar causado pela proximidade da lua cheia, é à noite em que mais conversa com Fabiana.
Empolgados, acabam perdendo o horário do metrô. A moça mora na Cidade Adhemar e não tem como voltar para casa.
Como quem não quer nada, o rapaz convida Fabiana para dormir em seu apartamento.
- Você está cheio de más intenções comigo! – reclama ela de brincadeira.
- Não! Eu juro que não!
A moça negra se pendura no pescoço de Gregório.
- Ah! Que pena! – ri a negra maliciosamente.
Os dois atravessam o Largo do Arouche indo em direção à Consolação, pegam a Rua Amaral Gurgel e uma figura sombria os observa do alto do Elevado Costa e Silva.
Ao passar pela rua do assassinato, o assistente contábil não pode deter um arrepio na coluna.
Um homem estranho os segue de longe, observando seus passos e o lugar onde entram.
Rindo e conversando, eles chegam a Rua Piauí. O porteiro estranha, porém não diz uma única palavra.
Acreditava que Gregório era gay, pois nunca o tinha visto com nenhuma mulher.
Entram no apartamento e Fabiana tropeça no salto plataforma. Greg a agarra antes que ela caia no chão.
Os lábios tão próximos...
A moça toma a iniciativa. Enlaça o pescoço do rapaz tímido e lhe aplica um formidável beijo. O gosto da caipirinha de saquê com amora que ela tomou se espalha pela boca dos dois.
Derrepente ela se solta e fica dependurada nos braços musculosos do rapaz.
Ele chacoalha a garota.
- Fá? Fá?
Desmaiou de tão bêbada.
Com extrema delicadeza, Gregório carrega a moça até sua cama. Fica dividido entre despi-la e matar seu desejo de vê-la nua, ou respeitá-la.
Opta pela segunda opção.
Só tira os saltos plataforma do pé dela e coloca um copo d’água e duas aspirinas sobre o criado mudo.
Dorme no sofá.
Ele é acordado as onze, pelo ruído da cafeteira.
Fabiana já está de pé. A roupa um tanto amarrotada, mas linda.
- Oi soneca! Como você ronca!
- Ãn... Oi.
Ela já tinha colocado pão um tanto amanhecido e café em dois copos.
- Bonito seu apartamento! É até arrumado, considerando que é de um homem solteiro!
Gregório ri um tanto sem graça. Os dois tomam café em silêncio. Ela resolve tomar a iniciativa do assunto:
- Ontem. A gente... Você sabe... Rolou?
Transpirando muito o moço nega.
- NÃO! Não!Não! Ontem você apagou e... Eu não achei certo, sabe?
Ela toma mais um gole de café e o observa bem antes de continuar.
- Nossa! Que “gentleman”! Mas... Você queria?
O assistente contábil enrubesce.
- Eu? Eu... Não. Quer dizer... – se atrapalha todo gesticulando muito.
Ela baixa os olhos amendoados.
- Sei. Somente amigos né?
Vermelho até a raiz dos cabelos, Gregório tenta consertar seu erro.
- NÃO! Não! Eu sempre fui apaixonado por você! Sempre imaginei como você é, mas... Você era noiva e ontem estava bêbada! Não achei certo... – conclui hesitante.
Fabiana sorri, mostrando os dentes alvos.
- Sempre imaginou é? Pois eu não sou mais noiva e não estou bêbada.
O moreno fica lívido.
- Fá...
Ela se levanta, colocando os dedos de leve sobre os lábios do rapaz. Quando ele se cala ela cola sua boca à dele.
Logo um furor os atinge e eles não conseguem chegar ao quarto. Ardendo de desejo, Gregório arranca roupa de Fabiana, beija a pele escura, porém brilhante.
Os dois se tocam, se mordem e se amam. A sintonia dos corpos é perfeita, de uma maneira que nunca encontraram em outras pessoas.
Mais tarde, exaustos, ficam deitados na cama. Os lençóis, desfeitos.
Gregório alisa os contornos do corpo nu da moça.
- Eu me apaixonei por você no momento em que te vi... – murmura ele.
Ela sorri compreensivamente. Passam à tarde na cama.
Com a chegada da noite, resolvem ir ao Shopping Frei Caneca assistir a um filme.
Fora do prédio, o homem magro de olhar nervoso os espera. Está rondando o lugar desde a noite anterior.
Toma conhaque vagabundo e fuma um cigarro do Paraguai. Daqueles carinhosamente apelidados de ”Estoura-Peito”.
Apalpa o objeto metálico sentindo seu peso. Um revólver calibre trinta e oito.
- Hoje tu não escapa, filadaputa! – diz consigo mesmo.
O casal desce para aruá de mãos dadas, ele sobem a Consolação rumo a Rua Frei Caneca.
Aquele homem estranho os segue cuidadosamente.
Os observa do alto de um prédio. Já notara o outro que os segue de longe.
A lua desponta no céu, cheia, redonda. A lua dos amantes e das feras.
Com o aparecimento do satélite natural da terra, o corpo todo de Gregório se arrepia, mas ele está relaxado. O dia passado ao lado de Fabiana apagara seu furor.
Dando a volta no quarteirão, o homem armado pretende lhes encontrar de frente. Ele entra correndo na Visconde de Ouro Preto e sobe a Rua Augusta.
Antes de ver o homem, ele sente o cheiro conhecido e seu rosnado chama a atenção da bela negra.
- O que foi Greg?
Ele não precisa responder.
Na confluência das ruas Antônia de Queiroz com a Augusta, o assaltante que fora derrubado e posteriormente preso por causa de Gregório os encontra, já com o trêis-oitão apontado.
- Lembra de mim seu filho da puta?
Sem ao menos esperar um a resposta acerta dois balaços no peito do assistente contábil. O rapaz desaba com os olhos vítreos, fixos na lua redonda, poderosa no céu.
As pessoas correm em todas as direções, fugindo da cena medonha.
Fabiana grita, apavorada.
O assaltante a puxa com violência pelos cabelos crespos.
- Tu vem comigo sua puta! Vô fazê com você o mermo que me fizeram lá na gaiola!
Um rosnado gutural rompe a noite.
O criminoso se vira, assustado.
A criatura já está sobre ele. Imensa.
Mal os olhos de Fabiana encaram o horror e ela desmaia sem sentidos. Soltando a garota, o ladrão descarrega o tambor da arma no monstro, sem efeito algum além de irritá-lo mais ainda.
Do alto de seus três metros, olhos dourados incandescentes avançam sobre o homenzinho de um metro e setenta.
Ele é despedaçado em segundos. Tendo seus órgãos internos sido espalhados em alguns metros quadrados.
A moça geme baixinho, como em um pesadelo, atraindo a atenção da criatura.
Em um instante ele está sobre a negra, as mandíbulas poderosas escorrendo sangue.
Ele a fareja.
E para sua s surpresa percebe o cheiro de sua semente dentro dela.
Põe-se de pé, uivando solenemente para sua senhora, a Lua. Ao longe outro uivo lhe responde.
Fica confuso entre deixar a garota ou seguir o resto de sua matilha. Acaba optando pela segunda opção.
Atravessa a Rua Antonio Carlos, subindo a Peixoto Gomide correndo sobre as quatro patas.
Fabiana geme novamente como se estivesse tendo um pesadelo.
Nas ruas em volta, não há ninguém para escutá-la. Apenas uma criatura a observa, de pé na beirada do parapeito, apoiado nos calcanhares, no alto de um prédio.
- Interessante... – sorri expondo os caninos proeminentes.
Pisca os olhos incomuns, um verde e o outro azul-turquesa e solta o corpo no ar.
Aterrissa momentos depois, sem dano algum, bem em frente à moça e ao cadáver destroçado.
Levanta-a suavemente. Não se contêm ao sentir o cheiro do sangue fresco dentro das veias.
Seus caninos tocam a jugular delirante.
- Não – ordena uma voz sinistra atrás dele – Ela serrá útil nas dias que virrão.
Os dentes se retraem...
- Sim, mestre...
Coloca a moça sobre os ombros e os dois somem na noite.
Continua...
FIM DO CAPÍTULO 1