O Aluno Nota 10

O Aluno nota 10

Marcinha está animada.

Apesar das férias merecidas, estava ficando maluca em casa. Há cinco anos que ela dá aulas na cidadezinha vizinha.

Todo final de ano ela deseja ardentemente que o ano letivo comece logo.

Sente-se muito sozinha em casa.

Não que não tenha amigos, nada disso!

É que desde a morte de seu marido Jerônimo, não gosta de ficar na casa.

Muitas lembranças talvez...

Ela é uma jovem viúva, tem apenas vinte e quatro anos.

Seu marido havia morrido há quatro anos, mas ela ainda o enxerga nas pequenas atitudes diárias.

Às vezes se põe colocando dois pratos na mesa. Coisas assim.

Não tiveram filhos.

O cemitério da cidade, aliás, comum as duas pequenas cidades, é um lugar habitual para Marcinha.

Todo dia ela passa pelo lugar.

Não que fosse ver o marido falecido, nada disso, mas é que todo o povo das duas cidades atravessa o cemitério que fica no meio do caminho.

Ao invés de dar uma grande volta, dia e noite todos cortam caminho pelo tétrico lugar.

Durante o dia, Marcinha não se importa de atravessá-lo, pois tem a companhia de muitas pessoas.

À noite, tenta passar pelo lugar o mais rápido possível.

Não acredita em fantasmas, mas já tinha visto muitas coisas estranhas por lá.

Barulhos de dentes batendo com frio intenso, chaves e correntes caindo e até seu nome sendo chamado, uma ou duas vezes.

- Coisa de criança malcriada! – bufa ela para si mesma, depois de sair do local.

Mas naquela noite resolve visitar o túmulo de seu falecido marido. Precisa confessar algo a ele.

Não acha que o morto vá escutar, mas tem certeza que se sentirá muito melhor.

Precisa desabafar.

Havia percebido que estava apaixonada por um aluno. Seu nome é Maurício e é seu melhor aluno.

Um aluno nota dez.

Sempre o havia visto como um estudante dedicado, nunca fizera nada que a desagradasse.

Participa de todos os cursos em que ela dá aula.

É extremamente aplicado, e sempre a acompanha até o ponto de ônibus, depois de atravessar o cemitério.

Marcinha apenas o via como um amigo.

Até o dia em que as garotas comentam que seu aluno é apaixonado por ela.A professora acha divertido, mas secretamente também sente uma atração por ele.

Seu sorriso tímido é maravilhoso.

Mauricio é um rapaz feito. Havia entrando na oitava série, no supletivo quando se mudou para a cidade.

Agora ia fazer o último ano do colegial.

Ela pretendia declarar seu amor, certa de que seria correspondida.

Com o começo do ano letivo ela pretende declara seu amor, certa de que seria correspondida.

Aquele dia, o primeiro da volta às aulas, ao passar pelo caminho habitual no cemitério, para em frente à lápide do marido.

Conta-lhe tudo e apesar de achar aquilo uma idiotice, parece que haviam lhe tirado um peso das costas.

Pega o ônibus e chega à escola no horário normal.

As horas passam e logo começa o período noturno. Poucas pessoas aparecem o que já era esperado.

Mas ela fica muito chateada ao ver que Maurício faltou.

Ela resolve ser discreta e não pergunta por ele. Nota, porém, que ninguém fala no nome dele a noite inteira.

As aulas chegam ao fim e ela vai embora, sozinha, para sua casa.

Na viagem de vinte minutos de volta, evita pensar nele. Chega à rodoviária quase a uma da manhã.

Ela se esquecera como é desagradável atravessar o cemitério sozinha.

Com seus livros apertados contra o peito, respira fundo e refaz o caminho que fizera pela tarde.

Mal andara cem metros e ouve passos atrás de si. Seu jovem coração dispara de medo.

Quando olha para trás, apavorada, vê Maurício. Seu medo transforma-se em alegria.

Ela corre em sua direção e o abraça com força.

O rapaz está frio.

A noite não está tão fria, visto que é fim de fevereiro, mas ele está apenas de camiseta e jeans.

- Você faltou hoje.

Ela sorri para sua paixão.

- É. Está difícil sair daqui agora...

Ele continua com seu jeito tímido.

- Está morando para cá?

Marcinha está muito feliz.

- É. Bem ali. – ele aponta para o lado.

Ela olha interrogativamente para o local onde ele aponta. Uma lápide nova.

O nome dele está gravado e em baixo, uma frase:

- [Um filho perfeito]

A professora sente o sorriso morrer em seu rosto. Ao se virar para pedir uma explicação do que ela imagina ser uma brincadeira de muito mau gosto, Maurício sorri.

Seus dentes caninos estão maiores do que ela se lembra. Proeminentes.

- Eu te amo. E você? Me ama?

Os olhos do rapaz começam a emitir um brilho avermelhado.

Antes que ela possa gritar ele a silencia e morde seu pescoço profundamente. A escola perde uma ótima professora e o mundo ganha uma nova vampira.

Três noites após beber do pulso de seu criador, Maurício, levanta-se do túmulo e foge junto com seu companheiro das trevas, para viverem seu amor imortal.

Fim.

Humberto Lima
Enviado por Humberto Lima em 25/04/2008
Código do texto: T961116
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