O caçador

Era uma bela noite para caçar. ¬Adentrei a mata com minha velha carabina. O céu estava estrelado e a lua estava insinuante; e eu, disposto a abater qualquer presa. Caminhei algum tempo sem nada avistar, mas não foi difícil encontrar minha primeira presa. Era um grande porco selvagem, que devia pesar uns cento e vinte quilos. Ele alimentava-se calmamente, quando pus a mira do meu rifle sobre a cabeça dele, olhei fixamente – o tiro tinha de ser certeiro para não haver sofrimento – e o abati.

Senti umas gotas correrem sobre minha face. Eram as primeiras gotas de chuva, de uma tempestade que começou rapidamente. A caçada continuava, mas agora não havia aquele belo céu estrelado e a enorme lua hipnotizante, e sim trovões que riscavam o céu e iluminavam tudo em volta para logo em seguida escurecer novamente. Confesso que senti um pouco de medo em ver toda aquela mata em volta de mim ficando prateada e iluminada, e logo em seguida ficando escura e nefasta. Confesso também, que fiquei ainda mais atemorizado quando vi aquele corpo estirado no chão. Hesitei em chegar perto, mas senti que devia ajudar. Por mil demônios! Era o velho Thompson. E quando me aproximei vi que havia sangue por todo lado, e quem quer que fosse que tivesse feito aquilo, não tinha a intenção de deixá-lo vivo. Porém deixou. Deixei numa árvore a minha carabina, e pus o velho em minhas costas. Depois de um longo trajeto cansativo e assustador – assustador apenas pelo fato de eu estar carregando um semimorto e por causa daquela maldita tempestade que iluminava tudo para depois tornar à escuridão – finalmente cheguei em casa. Deixando o velho no sofá, dirigi-me ao banheiro onde lavei as mãos e peguei meu kit para casos de acidentes. Voltando à sala, tirei a camisa do velho, e com um pano úmido, lavei-o da cintura para cima. Em sua cabeça haviam marcas de golpes com algo como um bastão, em seu peito, haviam vários hematomas; e perto de seu coração, um enorme furo que pensei ser feito por uma bala. Examinei mas não encontrei bala alguma. Então presumi que fosse feito por uma espada ou algo como uma estaca. Atravessou-lhe bem ao lado do coração. Teve sorte em continuar vivo. Porém não sabia se por muito tempo, pois sua febre não parava de aumentar. Dei-lhe alguns remédios e cuidei de seus ferimentos. Enfim, fiz o que pude. Mas estava exausto e fui tentar dormir.

Deitado na cama, apesar de exausto, não conseguia dormir. Pensava naquele sujeito que estava em minha sala. Já ouvira inúmeras histórias acerca daquele homem, mas jamais havia o visto ou falado com ele. Mas ele era inconfundível com seus cabelos e sua barba branca. Parecia um ancião. Diziam que ele jamais descera de sua cabana na montanha desde que sua esposa e seus filhos foram mortos por um monstro. Ninguém sabe decerto que monstro foi esse, mas o velho Thompson garante que acertou-lhe um tiro na cabeça depois de ser mordido por ele.

Estava deitado em minha cama, com os primeiros sinais de sono, quando senti frias mãos tocarem meu pescoço. Tentei levantar, mas fui segurado firmemente. Assustei-me ao ver a figura do velho Thompson com aqueles grandes olhos vermelhos e os caninos enormes penetrando meu pescoço. Pensei que fosse morrer. – Antes tivesse mesmo morrido. –

Quando acordei pela manhã, o velho não mais estava. Soube mais tarde que ele fora morto. – Certamente pela mesma pessoa que falhou ao tentar faze-lo na noite anterior, pensei eu. ¬ –

Alguém batia à minha porta. Tive medo, hesitei em abri-la. E as batidas ficavam mais fortes, e quem quer que estivesse batendo, não estava disposto a esperar muito tempo. E não esperou. Com um chute na porta, quebrou-a e entrou. Eu estava desesperado, e olhava para aquele homem alto de sobretudo, seu chapéu não me deixava ver sua face, e com certo ódio disse:

– Você também é um deles! – Disse ele me acertando um tiro no braço.

Não sei por que, mas parecia não sentir nada, e quando olhei para meu braço, como um toque de mágica, ele se curou. Então o homem veio para cima de mim com uma estaca. Estava disposto a me matar. Quando ele estava muito próximo, joguei-me no chão e rolei. E nesse instante seu chapéu caiu, e eu pude ver sua face. Notei que em sua testa, bem no meio, havia uma marca – Provavelmente feita por um tiro. Tiro bem dado de um velho caçador. O velho Thompson. –. Rápido como a luz, ele investiu contra mim, e antes que eu pudesse me mexer, ele já estava segurando em meu pescoço. Olhou-me nos olhos, e sem piedade enfiou seus caninos em minhas entranhas.

E ainda antes que minha vida se esvaísse, pude perceber que o que ele queria de fato, era ser o único. O único demônio dessa espécie nojenta.

Derek Mendonça
Enviado por Derek Mendonça em 15/04/2008
Código do texto: T946188
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