A tragédia de Proserpina* - parte I
Eu não o encontrei. Ele me buscou. Meu Hades. Um vampiro. Aquele que me arrancou da inocência e me mergulhou na escuridão junto dele. Assim como na história da Mitologia, ele me seqüestrou e me levou para viver no inferno ao seu lado. Não era o inferno literal, é claro. Mas era algo bem parecido.
Apesar disso, me salvou, de todas as maneiras possíveis, embora poucos acreditem que se possa ser salva quando se vive no inferno. Mas eu fui. Porque ao lado dele me tornei a senhora das almas, aquela que tem o poder de controlar a morte e seus desígnios. Esqueci meu passado. Tornei-me Perséfone. A doce romã banhada no sangue de meu Hades servia-me de alimento. E assim seria por toda a eternidade. Ou pelo menos foi assim que eu prometi.
Depois de alguns anos, a idade pesou e ele sentiu a necessidade de dormir, descansar por algum tempo. Quando cerrou seus olhos pela última vez, eu me despedi e jurei olhar por seu corpo e por nosso refúgio enquanto ele descansava, derramei meu próprio sangue e dei minha honrada palavra de que seria sua guardiã diante de tudo.
Mas fraquejei. Meu roteiro perfeito teve uma falha imperdoável e inexplicável. Senti-me caindo de um precipício quando depois de alguns dias e inexpicavelmente seu corpo desapareceu. Quem o havia levado?
Noites de angústia e dor se seguiram, até que resolvi parar de sofrer e agir. Li cada palavra de seus diários, decorei cada passo de seus rituais místicos, consultei cada um dos guias espirituais que consegui contatar. Diversas entidades diferentes me ofereceram ajuda, pedindo os mais variados favores em troca de trazer Hades de volta. Analisei um a um seus contatos, seus inimigos.
Tracei planos e estratégias para trazê-lo de volta para mim. Foram tantas horas seguidas de dedicação, de transes, de entrega, que em determinados momentos eu já não sabia mais se estava sonhando, delirando, ou acordada, só sabia que precisava continuar.
Sei que estou perto, mas faltam ainda algumas peças para completar o quebra-cabeças que me trará de volta meu senhor. Eu o farei, cumprirei meu legado e completarei minha missão. Me sinto pronta para essa caminhada que para mim só tem dois finais possíveis. Ele de volta, ou minha vida entregue em sacrifício, para compensar a falha. E ainda seria pouco.
* nome romano para Perséfone