A MALDIÇÃO DO FANTASMA - Parte IV - A Maldição
Um dia, enquanto ele, o meu amado, de olhos sorridentes e agora sempre com um sorriso largo, proferia uma palestra na Universidade, eu, no fundo do auditório, embevecida, o escutava. Como eu sentia orgulho daquele homem! Como ele falava bem! Ele era ímpar, adorável, educado, gentil, e como sabia falar para o grande público! Prendia a atenção de todos os ouvintes! Muitas vezes eu me emocionava quando o ouvia falar e me sentia a mais feliz das mulheres por ter o seu amor!
De repente, uma mão bateu muito forte em meu ombro. Foi uma verdadeira pancada! E logo outra, em seguida daquela. Doeu! Doeu e me assustou! Quando me virei, vi uma mulher atrás de mim, impecavelmente vestida, loura, muito loura, com uma pele clara, bonita, muito bonita. Com uma voz cheia de ódio, ela me disse, em um tom autoritário:
– Vem cá! Quero falar contigo!
Surpresa, levantei-me e, como hipnotizada, segui-a, pensando: Conheço esta mulher. Mas quem é ela? De onde a conheço? Enquanto caminhava atrás daquela mulher elegante, senti-me pequena, desengonçada; aquela mulher me assustava. Por quê?... Então me lembrei de uma cena, há muitos anos atrás, no Jardim da Universidade, em uma noite de luar...
Chegamos no mesmo jardim. Ela, que caminhava à minha frente, virou-se e me encarou com um olhar irônico e cruel, medindo-me de cima para baixo, consciente de sua superioridade em relação a mim.
– Sabes quem eu sou? Eu sou a “mulher dele”!! Ele é o “meu marido”. Tu não passas de uma “porqueira qualquer”. Pára de querer ficar com o meu marido! Ele é meu, só meu!”
Olhei-a amedrontada: a fina senhora gritava comigo no meio do jardim e com o dedo em riste, tremia de ódio, avançando e parecendo querer bater-me no rosto. Senti medo de sua violência: senti que aquela mulher seria capaz de tudo! Era um poço de ódio! Encarei-a, envergonhada, mas sem rancor. Imaginei-me perdendo o meu amor adorado. O que eu faria?? Senti pena daquela mulher que tinha tido tudo para ser feliz com o melhor homem do mundo e o “pusera fora”, desprezando-o, humilhando-o, tratando-o sem carinho ou respeito algum.
Ela chegou mais perto: tremia de raiva porque o homem “com quem ela havia gasto os melhores anos de sua juventude, irrecuperáveis e que dinheiro algum do mundo poderia indenizá-la” era agora feliz com uma mulher comum, mas que o amava e admirava. Caso ela me batesse, pensei, eu não reagiria. Olhei-a firme, mas com serenidade, e perguntei-lhe:
– Por que não o valorizaste, porque não o respeitaste, por que nunca o acompanhaste quando ele estava contigo? Ele te amou tanto! Agora...
Ela interrompeu-me bruscamente, e com seu rosto muito perto do meu, pois não recuei um passo, colocando sua mão em riste bem perto do meu rosto, disse entre-dentes:
– Afasta-te dele!! Ele destruiu minha vida e minha juventude! Nunca prestou para coisa alguma! Mas ele é meu! E eu não deixarei que ele seja feliz! Ele tem que pagar pelos anos que gastei ao lado dele! Deixa-o agora!! Se não o deixares, eu te amaldiçoarei! Eu tenho mais poder do que tu pensas! Eu destruo a ele e a ti! E vou destruir o trabalho de vocês, esta vida de “professorzinhos de merda!!”
Meu Deus, pensei, onde está a “finesse”? Senti seu hálito em meu rosto, mas, quando pressenti a bofetada que viria, algo a fez parar. Ela olhava por cima dos meus ombros.
– Não vais dizer nada? – perguntou, recompondo-se.
– Não, não tenho nada a te dizer nem a fazer.
– Então eu amaldiçôo vocês dois! – E deu-me as costas, fingindo chorar ou chorando, não sei. E, a passos rápidos, a elegante senhora se afastou!
Quando me virei para voltar ao auditório, percebi que o meu amado já havia terminado a palestra e estava do lado de fora, procurando-me com os olhos, mas impedido de chegar até onde eu estava porque seus alunos o estavam cumprimentando pelo brilhante trabalho.
Quando conseguimos chegar perto um do outro, ele me perguntou:
– O que houve?
– Nada, respondi.
Segurei as lágrimas da humilhação pela qual havia passado, pois vários alunos e alunas minhas estavam no jardim e devem ter visto e ouvido a terrível cena, pois em momento algum ela fora discreta. Percebi que ela não me bateu, apenas porque havia visto que a palestra havia terminado e que, em breve ele sairia.
Quando chegamos em casa, a dor nas costas, no lugar onde ela havia batido, era intensa. Olhei no espelho do quarto e vi a marca de suas mãos em meu ombro: marcas de duas mãos. Duas pancadas.
Aquela noite tentei dormir, mas não consegui. Não consegui, não por causa da dor e da vergonha, mas pela minha preocupação com ele: ela havia dito que iria destruí-lo!
Olhei para ele com todo o meu amor: dormia sereno, com um leve sorriso... O que eu deveria fazer? Ela tinha poder sim, para destruí-lo! A ele e a mim. Mas comigo eu não me importava. Minha preocupação era ele, somente ele!!
Na sucessão de imagens que vinham depois, fui recordando tudo o que sucedeu...
(continua)
[NOTA: Quaisquer semelhanças com fatos ou pessoas, mortas ou vivas, são mera coincidência.]