Os Cobradores da Noite (Parte 4 de 4)
IV
Quem poderia imaginar que os moradores que fugiram do castelo assim que notaram que as coisas que aconteciam ali dentro fugiam da sua compreensão foram os que sobreviveram por mais tempo, seus rostos pingavam suor gelado enquanto desciam a colina em direção à vila sob os primeiros raios de sol do amanhecer.
- O que houve? - uma das mulheres perguntou ao esposo assim que os homens chegaram. - Conseguiram vencê-los?
- A gente precisa ir embora daqui! - ele se limitou a esbravejar em resposta. - Agora!
Os gritos desesperados que se seguiram não deram espaço para que alguma resposta pudesse ser dada. Afinal, para aqueles homens que foram embora assim que viram a encenação de ritual satânico tudo o que acontecia no castelo não passava de uma blasfêmia contra Deus. Eles não chegaram a ver o porão como o falecido Damian vira e nem o portal altamente tecnológico e por isso não tinham como identificá-lo quando um outro desses portais apareceu na vila, bem no meio da praça principal, e dele saíam dezenas e dezenas de militares armados, disparando suas metralhadoras sem a menor hesitação.
Em meio aos gritos desesperados alguns tentavam inutilmente fugir, mas eram alvejados nas costas, outros se escondiam nas casas medievais mas a estes o destino era pior: alguns soldados carregavam lança-chamas e incineravam as casas. Código preto, nenhum resquício podia restar. Outros moradores choravam de joelhos pedindo piedade a Deus, não sabiam se aquele portal era enviado dos céus ou do inferno. Não sabiam se Deus mandara seus anjos para se vingar daquela vila que fizera um pacto anos antes, ou se eram demônios de Lúcifer, que importava quem os enviou? Seus tiros matavam igualmente.
Antes das oito da manhã, já não havia morador nenhum na vila, todo o equipamento médico guardado no castelo já havia sido enviado novamente para o futuro, e alguns soldados reviravam os escombros carbonizados para ter total certeza de que não sobraria nada daquele lugar enquanto dois dos cientistas responsáveis conversavam entre a destruição.
- Como você vai descrever os resultados no relatório?
- Bem, não foi de todo ruim - o mais alto dos cientistas ajeitou os óculos finos, releu algumas linhas do documento na sua prancheta. - A vacina que nós testamos neles funcionou para varíola, doze tipos de câncer e a peste negra. E olhe os cadáveres, todos morreram fortes e saudáveis.
- Mas não conseguimos controlar as mentes. Era para todos eles acreditarem em demônios e nunca se voltarem contra nós, eles nunca deveriam aparecer no castelo - o cientista se abaixou diante do cadáver de uma criança, olhou no braço dela a marca da vacina que eles estavam testando e que deram a todos os moradores, sempre visitando as casas no meio das madrugadas. - Você sabe que essa medicação só vai passar no teste quando criarmos soldados totalmente leais ao que nós quisermos que eles acreditem.
- Durou 13 anos, e funcionou com todos os que estavam presentes na igreja no dia em que o padre mentiu que viu Lúcifer em pessoa, o problema foi transmitir os efeitos aos filhos deles, que não estavam presentes naquele dia, quando testamos a paciente Meredith seu sangue não tinha todos os anticorpos do medicamento. - assinalou uma última linha na sua prancheta. - Tenho certeza que quando injetarmos o novo produto em um pelotão e dissermos que Jesus em pessoa desceu até nós e quer que lutem por ele, eles o farão cegamente.
- Assim espero, o governo gastou dinheiro demais nisso tudo para não dar em nada. - eles caminhavam de volta em direção ao portal. - Além do mais, se a Guerra não acabar logo, não vai sobrar pelotão para usarmos o remédio.
- Bom, pelo menos conhecemos a Inglaterra Medieval, e é tão nojenta quanto eu imaginava - sorriu antes de desaparecer na luz azul.
***
Revirando os escombros um dos soldados um dos soldados comenta:
- E se eu escrever alguma coisa nos postes, gerar uma lenda caso algum forasteiro encontre esse lugar.
- Não, o esquadrão 773 já fez isso em Croatoan e deu o maior problema nos séculos seguintes, lembra? Vamos só acabar com isso, aparentemete vão nos mandar numa missão para contaminar os holandeses com febre tifóide…
- O que a gente não faz em nome do Imperador - comentou lacônico, antes de acender outra vez o lança-chamas.
Fim.