A Cidade Sob a Pele

A Cidade Sob a Pele

O Dr. Pedro Ramos era um dermatologista renomado, especialista em doenças raras da pele. Seu consultório em São Paulo recebia casos estranhos, mas nada como o de Luísa Gouveia.

A mulher entrou no consultório com passos hesitantes, sua pele coberta por marcas escuras e irregulares, como uma rede de cicatrizes vivas. Mas não era apenas isso—os padrões pareciam... arquitetônicos. Pequenas linhas formavam corredores, praças, edifícios minúsculos que não deveriam estar ali.

Pedro tocou sua pele com luvas de látex. Ela estava quente, pulsante. Quando aproximou a lente de aumento, algo impossível aconteceu. As linhas se moveram. Não como uma erupção cutânea, mas como se fossem ruas minúsculas, e algo—ou alguém—caminhasse por elas.

— "Doutor... eu ouço vozes quando fecho os olhos."

Pedro reprimiu um calafrio.

— "Que tipo de vozes?"

— "Eles conversam. Trabalham. Rezam."

— "Quem são eles?"

Ela levantou os olhos, vermelhos e esgotados.

— "Os que vivem sob minha pele."

Pedro passou as imagens da pele de Luísa pelo microscópio digital. Ele esperava ver bactérias, talvez uma infecção fúngica extrema. Mas o que viu fez seu sangue gelar.

Pequenas figuras, humanoides mas não humanas, moviam-se lentamente entre as fissuras da epiderme. Eram translúcidas, como sombras de um outro plano de existência, e caminhavam em fileiras ordenadas. Algumas pareciam erguer estruturas microscópicas entre os poros.

Era uma cidade.

Dentro da pele de Luísa.

Ela gritou.

Pedro olhou para a mulher e viu algo pior. As estruturas estavam crescendo. Torres espiralavam pelos braços. Pequenos becos escuros se aprofundavam em sua clavícula. Algo maior se mexia sob sua pele, como um véu ondulando.

Ela caiu no chão, convulsionando.

A pele de Luísa se abriu como uma boca.

E a cidade respirou.

Quando os paramédicos chegaram, só encontraram Pedro encolhido num canto, murmurando.

Ele não piscava.

Não conseguia.

Pois quando fechava os olhos, via torres crescendo em sua córnea.

As ruas se formavam sob sua língua.

E os habitantes já estavam andando por ele.

E logo... estariam por todos.

(Eduardo Andrade)
Enviado por (Eduardo Andrade) em 16/03/2025
Código do texto: T8286534
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