A Prisão do Céu

A Prisão do Céu

Ninguém olhava para cima em Serafim, uma vila escondida entre colinas antigas. O céu não era confiável ali.

Miguel percebeu isso na sua primeira noite na casa herdada do tio. Ao sair para fumar no quintal, sentiu um arrepio ao notar o céu sobre ele. Não pelas estrelas — mas pela ausência delas. Uma escuridão compacta, sem fim, como um oceano de tinta derramado sobre o mundo.

E então, algo **se moveu** lá em cima.

Parecia um véu sendo deslocado, revelando... ossos. Crânios e costelas titânicas, orbitando lentamente em meio à escuridão. Não eram humanos. Eram maiores que qualquer coisa que Miguel conseguia conceber, disformes, de uma arquitetura errada.

Ele piscou, e tudo voltou ao normal.

Os moradores o advertiram no dia seguinte. “Não olhe para o céu por muito tempo”, disseram, desviando o olhar. “Eles percebem.”

Mas Miguel não conseguia esquecer.

Na terceira noite, ele viu mais. O céu não era apenas um cemitério — **era uma prisão**. Correntes enormes, feitas de algo que não era metal, atravessavam o vazio, segurando aquelas ossadas colossais. O tempo todo, algo invisível **se debatia** ali, tentando se soltar.

E então, **um dos crânios virou na direção dele**.

Miguel sentiu o ar ao seu redor mudar. O tempo desacelerou. Seu corpo se contraiu em espasmos involuntários. Ele queria correr, mas seus pés estavam colados ao chão.

Do alto, uma fissura se abriu.

Luzes mortas vazaram pela fresta, revelando mãos disformes, torcidas como raízes, esticando-se para fora. As correntes estalaram. O mundo tremeu.

Os sinos da vila tocaram em desespero.

Os moradores saíram de suas casas, carregando lâminas feitas de ossos fossilizados. Miguel viu quando eles começaram a cortar a própria pele, desenhando runas antigas no chão com o próprio sangue.

O céu rugiu.

E então, uma voz — **sem som, sem origem, mas que invadiu todas as mentes ao mesmo tempo** — sussurrou uma palavra esquecida.

A fissura se fechou.

As correntes brilharam por um instante e, com um último lamento além do tempo, as ossadas voltaram à inércia.

Miguel caiu de joelhos, sufocando.

Os moradores o observaram em silêncio. Então, o mais velho se aproximou e, sem qualquer emoção, disse:

“Agora você entende. Amanhã de manhã, você parte. Ou na próxima vez, **seremos nós que cortaremos sua garganta**.”

(Eduardo Andrade)
Enviado por (Eduardo Andrade) em 02/03/2025
Código do texto: T8275861
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