O Homem Que Veio Antes
O Homem Que Veio Antes
A cidade inteira parou quando ele apareceu.
Era um desconhecido, de terno cinza e sapatos impecáveis, parado no meio da praça. Alto demais. Magro demais. Ele não carregava malas, não vinha de carro ou ônibus. Ele simplesmente estava ali.
E todos o reconheceram.
Cada morador de São Vicente, sem exceção, sentiu uma memória surgir. O nome dele estava na ponta da língua. O rosto, familiar como o de um parente distante. Mas ninguém sabia de onde.
— Você se lembra de mim? — ele perguntou.
E então, o sino da igreja parou de tocar.
Na delegacia, buscaram registros. Nada. Nenhum documento. Nenhuma prova de sua existência. Mas havia fotos antigas, espalhadas por álbuns de família, retratos amarelados…
E ele estava em todas.
Nos casamentos. Nos funerais. Na inauguração do hospital.
O Homem Que Veio Antes.
Sempre de pé, sempre olhando, sempre um segundo fora do tempo.
E a cada dia que passava, algo na cidade começava a se desfazer.
Primeiro, os cachorros fugiram. Depois, os espelhos ficaram embaçados. As sombras começaram a se mover quando ninguém olhava.
As pessoas esqueciam palavras.
Depois, esqueciam rostos.
Depois, esqueciam a si mesmas.
E o homem continuava ali.
Sorrindo.
Um por um, os moradores desapareceram. Não gritavam. Não fugiam. Apenas sumiam, como uma página em branco sendo virada.
Até que restou apenas um homem.
Ele se olhou no vidro de uma vitrine vazia.
O reflexo não o imitou.
E então, ele se lembrou.
Ele sempre esteve ali.
Ele sempre foi o Homem Que Veio Antes.
E agora, esperaria pela próxima cidade.