Diário de Takashi: O Cemitério de Okunoin
Takashi Sato já não era mais o jornalista cético que costumava ser. Depois de investigar várias histórias misteriosas, algumas que até mesmo ele tinha dificuldade em explicar, seu ceticismo havia dado lugar a uma curiosidade aguçada. Ele já tinha presenciado o inexplicável e sabia que, por mais que a razão tentasse afastar os mistérios, certos lugares guardam histórias que não se podem entender apenas com lógica.
Foi por isso que, quando soubera das estranhas ocorrências no Cemitério de Okunoin, no Monte Koya, ele sabia que precisava investigar. Rumores sobre vozes sussurrantes, passos que ecoavam sem corpo e aparições misteriosas haviam se espalhado entre os poucos que ousaram passar uma noite ali. Não era mais uma simples lenda para ele, mas uma oportunidade de buscar respostas.
Takashi havia investigado outros casos sobrenaturais antes, e todos tinham deixado uma marca em sua percepção do mundo. Não se tratava mais de provar ou desmentir, mas de tentar entender o que existia além do que os olhos podiam ver.
Ao chegar no Monte Koya, a atmosfera era pesada, como se o próprio lugar estivesse guardando algo profundo e antigo. A névoa, que parecia nunca dissipar, envolvia o cemitério, criando um ambiente entre o mundo dos vivos e dos mortos. As grandes árvores pareciam fazer parte de um guardião invisível, observando cada passo do visitante.
Takashi se adentrou no cemitério, sabendo que ali moravam histórias que precisavam ser desenterradas. A primeira parada foi a tumba de Kōbō Daishi, o monge que fundou o templo e, segundo dizem, permanece em meditação profunda até hoje. Takashi se ajoelhou diante da tumba, sentindo a energia do local, mas logo percebeu que algo estava fora do comum. Não havia turistas ou peregrinos como geralmente se via, apenas o silêncio absoluto. Uma sensação de vazio que parecia pesar ainda mais com cada segundo que passava.
Foi quando começou a ouvir o que parecia um arranhar no chão, como se alguém estivesse caminhando por ali. Ele olhou ao redor, mas não viu ninguém. O som persistiu, agora mais forte, e Takashi, que antes era apenas um espectador, sentiu uma onda de cautela tomar conta de si. Mas sua experiência com outros casos o impulsionou a seguir em frente. Era isso que ele procurava, uma pista, um sinal de que algo estava acontecendo ali.
Ele seguiu pela trilha até um caminho mais sombrio, onde as árvores se entrelaçavam e a neblina parecia engolir o mundo. E foi nesse ponto que ouviu, pela primeira vez, uma voz.
— “Você está perdido, Takashi Sato.”
A voz vinha de trás, suave, mas firme. Ele se virou rapidamente, mas não viu ninguém. Apenas o silêncio e a densa névoa. Takashi sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Já havia investigado muitos lugares, mas essa sensação era diferente. Ele não estava mais sozinho.
Tentando manter a compostura, Takashi seguiu adiante até uma capela abandonada, onde as tumbas estavam cobertas por raízes e pedras caídas. Foi ali que a figura apareceu pela primeira vez. Um monge de manto escuro, de rosto encoberto, que estava imóvel, olhando fixamente para ele. Takashi sabia, por algum instinto, que não era uma ilusão.
— “Quem é você?” Takashi perguntou, com a voz firme, mas seus olhos refletiam a dúvida que começava a crescer em seu peito.
A figura não respondeu. Em silêncio, apontou para uma lápide ao fundo. Takashi se aproximou, sentindo o peso de uma presença invisível, e ao olhar para a lápide, o nome Yoshio Takeda lhe congelou o sangue. Era o nome de um monge desaparecido há anos, cuja história sempre foi envolta em mistério. Diziam que ele havia sido visto pela última vez exatamente naquele ponto, antes de desaparecer sem deixar rastros.
Sem entender o que estava acontecendo, Takashi olhou de volta para o monge, mas ele já não estava mais ali. Apenas a lápide, com o nome gravado, e o som distante dos passos ecoando pelo cemitério. Os ecos se afastavam lentamente, como se alguém estivesse caminhando para longe, mas nada estava visível.
Takashi sentiu que sua missão ali ainda não estava completa. Ele continuou sua busca, mas o que encontrou não foram apenas respostas. O cemitério parecia ser mais do que um local de descanso eterno; era um ponto de encontro entre o presente e o passado, entre os vivos e os mortos, onde o tempo se dobrava e os segredos se escondiam em cada sombra.
Nos dias seguintes, Takashi conversou com monges e moradores locais, mas ninguém parecia querer falar sobre os mistérios do cemitério. Alguns olhavam para ele com um respeito distante, outros o evitavam completamente. O que ele descobriu foi que a maioria sabia o que realmente acontecia ali, mas não ousava falar.
De volta à redação, Takashi não escreveu uma matéria sobre o Cemitério de Okunoin. Ele sabia que, mesmo sendo um jornalista experiente, não poderia traduzir para o papel a sensação que havia vivido ali. Algumas histórias estavam além da compreensão humana, e a experiência de Okunoin era uma delas.
Mas, em seu coração, ele sabia que o cemitério guardava algo muito maior do que qualquer um poderia entender. E talvez, apenas talvez, ele nunca estivesse realmente sozinho naquele lugar.