O demônio
Melindrava-me com suas garras aduncas, plenas de um recheio abrasivo, de um veneno belicoso. Não era sempre, mas não havia a mínima necessidade de. Ele sabia. Seviciava-me com seus sussurros roucos, infiltrados de troça. Assediava-me com seus agouros, para depois me conceder o alívio da ignorância. Uma que adivinhava o amanhã sem ser capaz de enxergar o minuto seguinte.
Garantia ele que nasceu assim e, por nascer, o máximo a ser feito era aceitar o determinismo ou fugir para a esquina coadjuvante dos humildes, aqueles néscios denunciados pelo übermensch.
Eu o odiava. Não foi sempre que. Mas, agora sim. Um ódio ferruginoso. Um asco emético. Sua presença me ofendia. Uma escatologia abissal era seu registro.
Ali, no canto, o vejo de cócoras. Mexendo em alguma coisa no chão. Seus movimentos são frenéticos. Ouço preces vindas da boca sibilante. Mas, não as distingo. Nem mesmo sei como sei serem preces. Aproximo meu corpo, combalido pela necessidade de entrevista-lo e esclarecer o auto funesto.
Estou prostrado na cama, olhos fixos no teto. Uma nódoa negra, clichê, se lhe espalha. Ensaio levantar. Empurra-me uma força hercúlea de volta ao colchão puído. Grito. Tento. Não há um ruído que me deixa a garganta.
Um sorriso largo me alcança a vista. Presinhas serrilhadas, como os dentes do tubarão daquela estória sem sentido, se me apresentam. Devolvo a provocação. Ele recua. Com medo.
Seu grandessíssimo filho de uma puta! Peguei-o!
Eu sempre venço. Por que? Porque comigo há mais a ganhar. Muito mais.