MUTILAÇÃO
Destruída não pela idade que segue o curso do tempo. Destruída sim por si. Sim, é uma angustia que finda num vazio no peito. É como se ser triste não fosse o suficiente, tem de vir aquela dor em todo o corpo e me deixar ainda mais deplorável. Um fervilhar de pensamentos que penso serem reais. Mais reais que eu.
Uma mulher magra, quase anoréxica. Sua camisola branca não sabe se preenche apenas o ar ou a ela. Se fossem cuidados seus cabelos ruivos e ondulados seriam divinos ao enquadrar seu semblante de traços marcantes. Poderia ser uma belíssima mulher. Mas recusa-se a se drogar, a seguir os medicamentos que devem aliviar sua dor em existir.
Pelo corpo, diante de um espelho de corpo todo enxerga suas cicatrizes. Lembra como cada uma delas foi feita, as vezes com uma faca de mesa, com o isqueiro quente, facas afiadas, até as próprias unhas eram tentativas de aliviar o trucidar que é sua cabeça. Mas não acalentava seu ser momento algum. Olha as coxas, estão repletas delas.
Lágrimas escorrem, o espelho não é um bom lugar de se olhar. Ao lado do criado mudo há caixas abertas de medicação, na gaveta entreaberta um isqueiro. Seus olhos não sabem escolher o que deve ver. Sua mão tremula se aproxima de ambos, mas qual pegar? Qual deve aliviar suas emoções desequilibradas?
Na boca, engole o terceiro administrado neste dia.