Sorriso Macabro
A porta rangia lentamente, um som áspero que ecoava pelos corredores silenciosos da casa abandonada. O cheiro pútrido de carne apodrecida invadia minhas narinas antes mesmo de eu cruzar o limiar. Meu coração batia forte, e cada passo parecia arrastar-se em câmera lenta, como se a própria casa quisesse que eu reconsiderasse a entrada naquele quarto.
A madeira gasta da porta cedeu sob a minha mão trêmula, revelando uma penumbra opressiva. A pouca luz que se infiltrava pelas frestas das janelas empoeiradas desenhava sombras distorcidas nas paredes, criando figuras que pareciam se mover na escuridão. O ar ali dentro era pesado, carregado com o cheiro azedo de algo que há muito havia passado do ponto de retorno.
E então eu os vi.
As figuras... não, as coisas, estavam curvadas, quase agachadas no canto do quarto. Seus corpos estavam desfigurados, cobertos por uma pele acinzentada, mas com nuances esverdeadas, como se fossem cadáveres há muito esquecidos e agora expostos a algo muito mais perverso do que a simples decomposição. A pele flácida pendia de seus ossos como um tecido gasto, mas havia um brilho doentio em seus olhos semicerrados, uma faísca de... consciência.
Eles não eram apenas corpos sem vida. Eram algo mais. Algo que ainda mantinha fragmentos de quem um dia foram, mas agora distorcidos, presos em uma fome silenciosa, torturante. Cada movimento deles era hesitante, como se ainda estivessem se adaptando à sua nova realidade, experimentando os próprios corpos deformados.
O silêncio era absoluto, exceto pelo som suave e repulsivo de carne se movendo contra carne, como um sussurro nojento, rastejando pelos meus ouvidos. Eles não se lançaram sobre mim de imediato, como se o clichê dos filmes de zumbis não se aplicasse aqui. Não havia pressa. Eles estavam me observando, avaliando, como se tentassem entender o que eu era para eles agora: uma ameaça, ou apenas mais uma peça de carne viva que eventualmente se tornaria como eles.
Eu senti o suor frio escorrer pela minha nuca. Minhas mãos, úmidas, apertaram o cabo da lanterna, mas a luz não parecia incomodá-los. A fraca luz tremeluzente iluminava as cavidades fundas de seus olhos, revelando uma fome que não se saciaria facilmente. O que quer que eles fossem agora, não era algo que poderia ser morto de novo.
Eu estava preso entre o impulso de correr e a necessidade de compreender o que tinha causado aquilo. Havia algo mais sinistro naquele lugar, algo que se escondia além das paredes em ruínas e da carne pútrida. Algo que havia transformado aquelas pessoas em monstros, mas não de uma forma comum, e esse algo parecia me observar de volta.
E então um deles, o que estava mais próximo, abriu a boca. Não foi um gemido ou um grunhido. Foi um som gutural, como um grito abafado, engasgado pela própria carne morta. Mas no meio desse som horrível, eu pude ouvir uma palavra... ou o que restava de uma: “Ajude-nos.”