O QUADRO
Aquele famoso pintor acabara de se casar com uma mulher belíssima.
Extasiado com a beleza de sua esposa, decidiu que a pintaria num retrato.
Partiram para uma casa no campo, afastada de qualquer interferência de terceiros.
Lá chegando, o artista preparou a tela, arrumou as tintas. Pediu para que sua mulher se sentasse num banco e começou a pintá-la.
Pintava com firmeza e perfeição, dignas do seu talento, dignas desta nobre arte.
A esposa permanecia imóvel, qual uma estátua, não esboçando qualquer movimento, por menor que fosse.
Os dias se passaram e o pintor se esquecera de comer ou dormir. A conclusão daquela obra lhe tirava qualquer apetite ou sono.
Passava horas a fio pintando; se julgava que a pintura não estava perfeita, jogava-a fora e começava tudo novamente. Fazia esboços no papel freneticamente, tomado por uma paixão avassaladora.
Os pais da mulher queriam visitá-la, mas ele impedia qualquer pessoa de aproximasse da sua modelo, alegando que atrapalharia a sua obra-prima.
Passaram-se meses e o quadro ainda não estava concluído. Ele nunca estava satisfeito: sempre havia algum detalhe, alguma nuance que deveria ser acrescido ou retirado.
Permitia à esposa e a si mesmo poucas horas de sono e uma alimentação incipiente.
A saúde da mulher começava a se deteriorar, mas por muito amar o seu esposo, nada lhe revelava.
Numa tarde de primavera, o artista, finalmente, deu os traços definitivos à sua obra.
Tomado por uma incrível euforia, exclamou a plenos pulmões:
- Terminei! Veja querida! Venha ver! Como ficou perfeita!
Mas, esposa não compartilha a alegria do marido. Fica inerte, sem pronunciar palavra.
Preocupado, o homem caminha em sua direção.
Parece que está adormecida. A toca, levemente, e se enche de horror: está gélida. Está morta.
2003