Os cachorros sempre sabem

Uma coisa que os mais velhos sempre me diziam quando eu era criança é que os cachorros enxergam muito mais do que a gente, eles tem o sentido muito mais aguçado, mas será que isso é verdade mesmo ? na época eu não acreditava muito nisso, hoje eu sei que é isso é verídico.

Quando criança, me vinha a dúvida: as pessoas falavam que os cachorros enxergavam tudo, mas ao mesmo tempo falavam que eles viam tudo em preto e branco, não sabia em qual dessas duas afirmações eu poderia acreditar.

É normal apontarem um gato que está olhando para o nada, simplesmente parado, com o seu bigode tentando farejar algo, depois de muito tempo encarando uma parede manchada, eles simplesmente perdiam o interesse, lambiam as patas e pulavam para outro lugar. O que será que os gatos estavam olhando ? será que algum espírito acenando para eles? certas coisas a melhor coisa é fingir que não acredita e sair de fininho, acho que enlouqueceríamos se pudéssemos enxergar com os olhos dos gatos ou cachorros, deve ser uma coisa muito estranha, de explodir mentes.

Mas essa história começa realmente no dia que eu ganhei um filhote de vira-lata, morava sozinho pela primeira vez na vida, tinha arranjado um emprego, juntado um pouco de dinheiro e saído da casa dos meus pais, vindo morar em um pequeno apartamento, um pouco afastado do centro da cidade, era um bairro muito calmo, ali todo mundo se conhecia e por uma razão que na época eu não sabia explicar, eles mantinham uma certa distância do prédio de três andares que eu morava, inclusive só morava pessoas que vinham de bairros distantes, moradores locais não alugavam aqueles apartamentos, deveria me preocupar ?

Saía cedo para trabalhar, fazia carinho no meu cachorro, limpava o sua sujeira, enchia o seu pote de ração e ia embora com um pouco de aperto no coração, deixa o pobre animal em casa sozinho, com o tempo ele acostuma, eu pensava. conforme os dias foram passando nada de anormal eu percebi, chegava em casa, ele já me esperava atrás da porta, me enchia de lambidas e eu pegava a coleira para darmos uma volta pelo bairro.

Em um desses passeios, topei com uma senhora que tinha um apreço especial pelos cachorros, ele abaixou a mão e o meu cachorro ficou doido, se enroscou na perna da senhora, nunca tinha visto ele tão feliz com alguma outra pessoa. dizem que os cachorros sentem quando a pessoa é boa e quando a pessoa é má, aos poucos eu tenho reparado que essa afirmação fazia todo sentido. Ela parou de fazer carinho nele, precisou puxar forte o ar e me fez uma revelação bombástica:

- Tem alguma coisa tirando energia do seu cachorro, um encosto ou algo do tipo, tenha cuidado!

Bastou algumas palavras para eu ficar todo arrepiado, eu quis fazer mais algumas perguntas, mas a senhora andou rápido para longe e atravessou a rua, parecia preocupada e querendo dar o fora o mais rápido possível. O pior que ela deixou a bomba armada e foi embora sem dar mais explicações. Deveria ser proibido as pessoas começaram a revelar algo e não terminar. enfim, era hora de voltar para casa.

Fiquei na cama por muito tempo sem conseguir dormir, preocupado e pensativo, olhando para o teto e imaginando o que poderia sugar a energia de alguma pessoa ou animal. Espírito malignos ou algo do tipo. quando já tinha desistido de dormir, me levantei e fui no meu computador olhar na internet, fazer uma pesquisa. E a internet é um ambiente muito bom para achar tudo que você deseja, o problema que é bastante cruel também, você acha cada coisa de deixar o cabelo em pé, filtrar o que fazer era realmente um grande desafio.

A noite chegava ao fim, desliguei o computador e acabei ao invés de dormir para repor as energias, cochilei de leve, acordando com o barulho do meu cachorro fazendo bagunça pela casa. Chamei o nome dele que veio prontamente me lambendo, estava feliz que eu não tivesse morrido. Precisava me adiantar para o trabalho.

Estava fritando um ovo quando percebi de rabo de olho um vulto passando, levei um susto e olhei rapidamente para o lado, não vi nada, talvez tenha sido apenas impressão, ainda estava com aquela história na cabeça, precisava de um dia inteiro de bastante serviço para esquecer, o trabalho árduo deixa a mente vazia, você esquece de pensar nessas coisas. Coloquei o ovo no pão e comi, achei estranho que meu cachorro não estivesse perto me pedindo comida, acho que é o horário que ele mais espera do dia. Chamei ele pelo nome e nada.

Acabei com o pão em poucas mordidas e fui para sala chamando o nome do meu cachorro, sem resposta. procurando pela casa, o encontrei no canto do quarto, sentado e com a cabeça baixa de costas para mim. Chamei pelo nome e ele não respondia, fui me aproximando bem devagar, até que o puxei, ele caiu no chão, cansado, respirando com dificuldades e com metade da língua para fora. Desesperado o levei para um veterinário que tinha no final da minha rua.

Bastante solícito, ele me assegurou que o cachorro ficaria bem, só estava exausto, parece que tinha gastado mais energia do que deveria, mas que ficando ali no soro em poucas horas recuperaria a vitalidade. naquele dia não fui trabalhar e voltei para casa. Andei de cômodo em cômodo, procurando alguma coisa que não saberia o que é, nada. queria respostas. Investigando a fundo na internet, encontrei artigos terríveis sobre o prédio aonde morava.

O terreno pertencia a um homem muito poderoso, que era conhecido por torturar seus empregados, na construção do prédio, dezenas de trabalhadores haviam morrido por estafa e exaustão, eram obrigados a trabalhar de sol a sol, com o mínimo de descanso e sem proteção nenhuma. Um verdadeiro absurdo. Logo após a inauguração. um dos primeiros inquilinos enlouqueceu e jogou fogo no apartamento, os bombeiros conseguiram agir rápido, mas os pais desse homem ficaram trancados e acabaram morrendo.

Confesso que eu não tive coragem de prosseguir lendo e encontrar coisas ainda mais pesadas, a internet é cruel nesse aspecto. Aproveitei que meu cachorro passaria o dia internado e saí a procura de um novo local para morar. O contrato era com um homem velho e esquisito, mais no boca a boca mesmo, acredito que ele compreenderia a minha saída e não causaria problemas.

Depois de muito procurar e não achar nada que eu pudesse pagar, voltei exausto e acabei dormindo. Meus sonhos logo se transformavam em pesadelos terríveis, essa história toda do prédio com certeza estava afetando o meu psicológico. Cedo fui trabalhar e na hora do almoço fui buscar o meu cachorro, esqueci de mencionar o nome dele, se chama: Malandro.

Ele ficou super feliz quando me viu, mas assim quando chegou no prédio e começamos a subir as escadas, ele empacou, não queria subir de jeito nenhum, mas eu não poderia levá-lo para o trabalho, tinha que deixar em casa e voltar para vê-lo de noite, tinha boletos para pagar, não poderia me dar ao luxo de faltar de novo. Com muito custo consegui colocá-lo em casa, troquei a sua água e enchi o seu pote de ração. Me ajoelhei e prometi para ele que não ficaríamos muito mais tempo naquela casa, ele parece ter entendido.

Não consegui me concentrar no trabalho, toda a hora me vinha a mente a imagem do malandro desmaiado, distraído, contando os minutos a hora de ir embora parecia nunca chegar. Quando meu turno havia finalmente chegado ao fim, corri para casa. um lado do meu subconsciente me dizia estar tudo bem, o outro que não tinha nada certo. Chegando em casa, assim que eu coloquei a chave da porta, percebi que meu cachorro não estava atrás da porta me esperando, meu coração começou a palpitar forte, chamei o nome dele, antes de abrir a porta, escutei um ganido bem fino vindo do quarto. Tratei de abrir rapidamente a porta e correr até lá.

O que eu vi, fez a minha espinha gelar, meu cachorro estava suspenso como se agarrado pelo pescoço, notei um contorno ali e mandei que largasse o malandro, o contorno parecia não ter gostado do que falei e apertou ainda mais o pescoço dele, o cãozinho começou a choramingar. Lembrei que uma forma de espantar espíritos poderia ser através do fogo. Corri na cozinha e peguei um isqueiro. assim que eu toquei o contorno, ele largou o cachorro, que correu para longe.

O espírito parecia estar com muito raiva, partiu com tudo pra cima de mim. Leitores, nessa hora eu admito não saber muito bem o que aconteceu. Sei que rolou uma briga, eu usando o isqueiro, o malandro latindo, depois eu me lembro de muita fumaça e sendo arrastado pelas escadas abaixo do prédio, acordando deitado no asfalto, Malandro ao meu lado lambendo o meu rosto e um paramédico me fazendo perguntas.

Assim como aquele homem do passado, o incendiário do apartamento dessa vez fui eu, por sorte não tinha mais ninguém além de mim, todos evacuaram o prédio e ninguém se feriu, os bombeiros controlaram rapidamente as chamas. O prédio parecia entender e se proteger de receber danos maiores.

Os cachorros, eles sempre sabem!

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