O CÓDICE DA PERDIÇÃO
Parte 1 – Ecos de um Futuro Perdido
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Dr. Victor Moreau observou resignado o fim do download. Era a sua última atividade na GenTech Industries, empresa que o empregara por cerca de doze anos. Recolheu seus pertences, removeu o data center portátil da unidade. Deu de ombros: não tinha remorso, fez o que podia.
Foi conduzido por dois seguranças para fora da imensa planta industrial. Atrás de si, o portão metálico se fechava em um estrondo, enquanto à frente jazia a cidade cinza e o céu plúmbeo. Estava escuro, mas não sabia dizer se era dia ou noite: o vapor fechado que emanava da urbe obscurecia qualquer luz.
Victor, em passos rápidos, conduziu-se para a estação de metrô mais próxima, onde tomaria o primeiro trem disponível para o bairro Heaven-08. Era o local designado, pelo governo, para que ele vivesse. Antes, mordomias eram pagas pela GenTech. Agora, dependia de auxílios: naquele tempo, todos eram dependentes do Estado, exceto uns poucos iluminados.
Não tinha esquecido de seu taser, caso alguém tentasse roubá-lo. Também havia tomado uma dose de Neuroflux para ficar mais alerta. Sabia dos perigos da cidade, embora ela lhe fosse estranha.
Depois de quase uma hora de espera na estação escura e fria, sem que notasse viva alma, o trem de Heaven-08 finalmente chegou. Abriram-se as portas. Ninguém desceu.
O resignado cientista adentrou sorrateiro no vagão. Olhou para os lados. As luzes piscavam, de forma que divisou apenas um indivíduo encostado no último banco. Parecia cochilar. Fora isso, não notou perigo. Victor então desabou em um assento, mas não tirou as mãos de seu taser. O trem pôs-se em movimento.
A viagem durou cerca de duas horas. Intermináveis foram as estações, quase todas vazias. Enquanto o vagão rugia, as grandes luzes da cidade tracejavam rápidas em seu interior. Mensagens publicitárias em neon e conjuntos habitacionais enormes contrastavam com a decrepitude do trem obscuro.
Aproveitando-se daquela aparente tranquilidade, Victor pôs-se a refletir sobre o que o levara até ali.
Um prodígio, havia concluído a faculdade aos treze anos. Embora o rápido desenvolvimento humano fosse uma realidade naquela época, a trajetória de Victor era considerada assombrosa. Antes de completadas duas décadas de vida, ele já era o maior expoente na ciência do aprendizado de máquina.
Ao sair da universidade, megacorporações o procuraram oferecendo-lhe contratos, cientes de seu projeto de doutorado, que estabelecia as bases para o “algoritmo mestre”. Considerado o Santo Graal da cibernética, esse algoritmo prometia revolucionar a relação entre homem e máquina: era a forma definitiva de inteligência artificial, totalmente autônoma, emulada da própria mente humana. Contudo, a indústria o buscava sem sucesso havia décadas. Quase virou mito.
Victor trazia luz a essa área, de modo que a GenTech decidiu investir algumas dezenas de bilhões de dólares para financiá-lo. Ao fim de doze anos de pesquisa, porém, os resultados foram inconclusivos. Cansados, os executivos abandonaram a iniciativa e colocaram o pesquisador na rua. Victor agora era mais um na multidão de indivíduos escravizados pelo sistema.
O que faltou em sua pesquisa? Não saberia dizer. O machine learning era uma ciência deveras complexa. Ao longo de todos aqueles anos, Victor criara algoritmos que se reprogramavam sozinhos e aperfeiçoavam-se continuamente. No entanto, eles ainda precisavam da ação humana para tomar decisões inteligentes. Eram muitas as barreiras para que algo como um algoritmo mestre fosse criado.
– As barreiras são instransponíveis... – pensava ele.
Seus pensamentos melancólicos foram interrompidos pela sirene de desembarque: chegara ao destino. Nunca havia pisado naquele bairro, apenas seguira as instruções do governo. Tinha medo. O medo vinha não do local desconhecido, mas da possibilidade de viver uma vida ordinária num subúrbio qualquer. Suas chances não eram melhores do que as de um cidadão comum. Afinal, mesmo os de inteligência muito dotada, naquele tempo, sofriam para conseguir um emprego decente. A competição era com as máquinas.
Desceu do vagão. Visou o local. A estação de Heaven-08 era especialmente repugnante: pilhas de lixo aqui e ali. Pichações tomavam as paredes. O piso nunca havia sido limpo, assim como a plataforma de saída. Dirigiu-se para lá.
Ao chegar na passarela, olhou para trás: o indivíduo que dormia no vagão também havia desembarcado. Apressou o passo. Ao sair do subsolo, surpreendeu-se: não conseguia ver coisa alguma. A rua estava completamente tomada pela escuridão. O breu da noite misturava-se com a fumaça da cidade e tornava o ambiente tenebroso. Mas Victor estava bem equipado:
– Acionar VoidEx.
Imediatamente, obteve visão infravermelho com georreferenciamento. A GenTech havia desenvolvido um implante neural disponível em edição limitada, totalmente adaptado ao usuário. Agora, Victor poderia enxergar no escuro. O computador instalado em seu córtex também o direcionava para o local de destino. Contudo, estranhou o seguinte: o elemento que vinha logo atrás não era localizado pelo infravermelho. Nada aparecia no sensor, exceto uma “sombra” ... Será que aquele homem era um ghost?! Boatos sobre essa unidade paramilitar, composta por indivíduos “invisíveis”, geneticamente modificados, mais pareciam fábulas para crianças. No entanto, Victor nunca tinha visto alguém sumir na frequência infravermelha.
– Desativar.
Se na luz infravermelha, parecia que era seguido por uma sombra, na luz comum, era impossível ter qualquer visão.
Victor não gostou nada daquilo. Num estalo de aflição, reativou o infravermelho, desceu a plataforma e correu pelas ruas do bairro obscuro. A sensação de impotência, de ser observado e perseguido por um “nada”, deixou-o apavorado. Corria com todas as forças que tinha e não reparou o quanto sua mochila pesava as costas. De toda forma, não poderia desfazer-se dela, pois o trabalho de uma vida estava ali.
Mil pensamentos passaram por sua cabeça: talvez um rival da GenTech queria os seus segredos. Ou talvez ela própria pretendesse eliminá-lo.
Após alguns minutos, que Victor julgava serem horas, enfim chegou ao local designado pelo governo. Para a sua surpresa e desolação, nada havia: somente um prédio em ruínas cercado por grades. Em pânico, esmurrava os portões enferrujados, sem conseguir adentrar o edifício.
Entendeu o seu fim. Tramaram a sua queda como queima de arquivo. Não havia escapatória. Naquele negrume, ninguém saberia quem foi o mandante. Seu corpo desapareceria facilmente. Enquanto isso, a sinistra sombra crescia em seu visor de infravermelho. Ele gritou:
– Por favor, fique com tudo! Já não tenho mais nada com a GenTech! – e atirou sua mochila em direção à sombra que se avolumava pela alameda. Num último ato de desespero, firmou os pés no chão e projetou o taser, já se preparando para a luta, quando...
– AAARRGHHH!!
Com um grito, sentiu o seu corpo tomado por uma onda de choque. Tinha sido alvejado por um projétil. Veio ao solo, imobilizado. Antes de perder a consciência, viu pelo infravermelho que a sombra recuava.
Parte 2 – À Beira do Abismo
...ploc!
...ploc!
...ploc!
Victor acordou sob um feixe de luz fraca, sua mente ainda nebulosa e confusa. A cabeça doía: uma dor pungente que era amplificada por um som irritante de gotejamento de água. Cordas apertavam seus pulsos e tornozelos, prendendo-o firmemente a um leito no centro de uma sala escura. Sua última memória antes de apagar foi a perseguição desesperada pelas ruas, sem falar no estranho recuo da “sombra”, provavelmente impedida por algo ainda mais tenebroso. Por isso, ao abrir os olhos, percebeu que o pior ainda estava por vir.
Depois de alguns momentos solitários, ao som daquele gotejamento ignóbil, finalmente um tropel pôde ser ouvido na escuridão, e uma porta metálica rangeu ao ser aberta. Várias figuras encapuzadas entraram, suas silhuetas ameaçadoras contrastando com a luz débil. O líder do grupo, um homem de olhar frio e cicatrizes que marcavam seus braços como um mapa de batalhas antigas, aproximou-se lentamente de Victor.
— Então, o doutor Victor Moreau finalmente está em nossas mãos — disse o líder, a voz repleta de uma malícia calculada. — Você é uma verdadeira joia, sabia? A GenTech quase conseguiu te silenciar, mas nós fomos mais rápidos.
Victor tentou falar, mas a voz saiu rouca, como se todo o ar tivesse sido arrancado de seus pulmões.
— Quem... quem são vocês? O que querem de mim?
— Nós somos a Dissidência — respondeu o líder, um sorriso perverso surgindo em seus lábios. — E o que queremos é muito simples: o Códice. O famoso "algoritmo mestre" que só você sabe onde está!
O cientista, ainda confuso por causa do trauma, a princípio não compreendeu a mensagem. Entretanto, pondo os pensamentos em ordem, balançou a cabeça e olhou de relance para o interlocutor. Depois de alguns segundos tensos, enfim balbuciou algumas palavras:
— Esse algoritmo é um segredo industrial... mas está longe de ser implementado. Como souberam dele? Por que... por que ele é importante para vocês?
— Ah, esse seu "segredinho" já é conhecido de muitos! — Disse o homem, debochado — Doutor Victor, você sabe perfeitamente por que queremos essa tecnologia. Com ela, poderemos criar uma nova inteligência artificial, radicalmente diferente de tudo o que já foi concebido pela humanidade, algo que todos esses governos corruptos e parasitas empresariais apenas sonham em ter... É tudo uma questão de saber quem vai desenvolvê-la primeiro: se a GenTech abandonou o projeto, nós agora tomamos a dianteira. E nada pode nos impedir!
Victor sentiu o sangue gelar. Ele rapidamente recobrava a consciência. Compreendeu que o seu trabalho já havia vazado para esses bandidos, de algum modo. Embora soubesse de seu impacto, não imaginava que seria alvo de disputas mortais e fonte de especulação para o submundo do crime. Afinal, o projeto sequer havia sido concluído. Mas ele não entregaria as pesquisas de uma vida para qualquer um.
— Nunca vou te dar isso — Victor murmurou, reunindo toda a coragem que restava.
— Ah, mas você vai. E se não cooperar, temos meios de extrair essa informação de você — o líder respondeu friamente.
Apesar de destemido, Victor não tinha como resistir: estava à mercê da Dissidência. Ele não conseguia mais esconder o medo. Todo o seu corpo tremia. O homem observou-o com desprezo, mas, sabendo do ativo que tinha em mãos, decidiu contemporizar:
– Veja, doutor: nós não somos inimigos. Na verdade, somos aliados em potencial. Chamam-nos de terroristas, dissidentes..., mas somos a resistência. Sabemos o que a GenTech te fez, e sabemos o que você carrega. O Códice da Redenção não é apenas um código... é a última esperança da humanidade. O mundo hoje é gerido por organizações que estão se lixando para o povo. É questão de tempo até desenvolverem uma inteligência artificial capaz de suplantar inteiramente a raça humana. Os poucos que dominarem essa tecnologia vão implantar um reino de terror, de erradicação sistemática dos homens tidos como inúteis e indesejados. Nós, porém, poderemos interromper o processo se você nos ajudar.
Victor começou a entender a gravidade da situação. As palavras “inspiradoras” daquele homem camuflavam algo vil. Entendia que estava à mercê de um grupo inescrupuloso, que pretendia utilizar o Códice como meio de conquista do poder. Seu trabalho, que ele tanto temia ser corrompido, estava agora nas mãos de fanáticos. Pior: quando soubessem da verdade, provavelmente o matariam.
— Vocês não podem fazer isso — Victor disse com a voz vacilante, mas tentando soar firme. — O Códice não é uma arma... ele não foi feito para isso.
— Ah, mas ele será — o líder retrucou, girando lentamente em torno de Victor. — Tudo pode ser uma arma, Victor. Tudo. E nós pretendemos usá-lo para derrubar o sistema e depois tomar o que é nosso por direito. Um mundo onde a tecnologia serve ao povo. Enfim, você está conosco?
O coração de Victor disparou. Ele não podia deixar que soubessem da verdade, mas estava em desvantagem. Suas mãos suavam enquanto ele pensava desesperadamente em uma saída. Queria ganhar tempo.
— Minha paciência está se esgotando, Victor...
Ele olhava para os lados, buscando alternativas. Viu um terminal de computação improvisado. Sua primeira reação foi o blefe:
— Vocês precisam de mim para ativá-lo — disse Victor, lutando para manter a voz estável. — O Códice não pode ser utilizado sem uma chave de autenticação que só eu possuo. Sem ela, o algoritmo é apenas um monte de dados inúteis.
Ele sabia que aquilo era uma mentira. Os grandes bancos de dados que ele trouxera consigo da GenTech eram apenas informações sobre a pesquisa. O verdadeiro Códice estava muito além.
O líder parou de caminhar e fixou os olhos nos de Victor. O olhar foi de ódio a um lampejo de curiosidade.
— E você vai liberar a chave? O que está esperando?!
— Sim, posso fazer isso agora.
O líder o encarou por um momento longo e tenso, antes de se virar para um dos outros membros da gangue, um hacker de aparência jovem que estava manipulando o terminal.
— Insira o data center que recolhemos e digite a chave que o doutor vai nos informar agora — ordenou o líder. Logo depois, ele voltou os olhos para Victor, desconfiado. Este, então, ditou a chave de descriptografia.
O hacker começou a digitar e logo acessou o conteúdo dos bancos de memória. Sua expressão mudou rapidamente de confiança para frustração, e ele se virou para o líder, balançando a cabeça.
— Isso aqui não vale de nada. São amontoados de dados sobre pesquisas da GenTech. O algoritmo não está aqui.
O líder cerrou os punhos e se virou abruptamente para Victor.
— Você acha que pode nos enganar, doutor? — disse ele, rangendo os dentes. — Diga-me onde está o algoritmo, ou vou garantir que você deseje nunca ter nascido.
— Esses dados são toda a minha pesquisa! Preciso deles para construir o algoritmo mestre. A GenTech desistiu porque não teve paciência! Posso trabalhar para isso, mas preciso de tempo! — logo após proferir essas palavras, Victor foi violentamente esmurrado pelo homem. Atingido repetidas vezes, seu rosto sangrava.
— Mentira! Mentira! — rugiu ele, enquanto desferia os golpes. — Nós sabemos que a GenTech já tinha tudo pronto! Ou você nos fala onde está o algoritmo ou vai sofrer!
Victor se manteve calado em sua poça de sangue, pois realmente não tinha conhecimento do fato. Para ele, o projeto do algoritmo mestre nunca havia sido concluído. Inerme, sem vislumbrar alternativas, capitulava. Almejava a morte. Diante do silêncio do cientista, o líder acenou para um dos membros encapuzados.
Uma figura alta e esguia se aproximou, segurando uma seringa contendo um líquido esverdeado e viscoso. Em cima de uma mesa, jazia um frasco com o nome “NeuraSynth”. Victor reconheceu de imediato: era uma droga experimental de que ele ouvira falar apenas em sussurros. Uma substância que, dizia-se, seria capaz de transformar a mente humana em código binário, permitindo que a consciência de alguém fosse baixada em um computador, desde que utilizada com um Conector Neuromático. Mas havia um preço terrível a pagar: o usuário sempre morria no processo. Por isso, as pesquisas com a droga nunca haviam avançado.
— Por favor... não façam isso... — Victor tentou lutar contra as amarras, mas era inútil. — Vocês não sabem o que estão fazendo!
O líder inclinou-se até ficar cara a cara com Victor.
— Sabemos muito bem. Você é o último elo que nos separa do poder absoluto. E se não colaborar, vamos simplesmente arrancar a informação de você, quer você queira ou não.
Uma espécie de capacete foi colocada por sobre a cabeça de Victor, que imediatamente sentiu como se milhões de abelhas tivessem-no picado ao mesmo tempo: o seu sistema nervoso havia sido atrelado ao Conector Neuromático. Ele urrava de dor. No entanto, logo após, o frasco da droga foi injetado em seu braço, de modo que uma sensação de torpor irradiava por todo o seu corpo. Era o efeito cascata da perda dos sentidos, da morte iminente. A descarga de adrenalina cessava na medida em que a droga fazia efeito. Enfim, sua visão começou a escurecer, e sua mente foi tomada por um caos apático. Mas, enquanto sua consciência se desvanecia, algo inesperado aconteceu.
Dentro de sua mente, o chip neural da GenTech, o mesmo que lhe garantia a visão infravermelha, começou a interagir com a droga e com o sistema. O que tanto a Dissidência quanto o próprio Victor desconheciam era que o verdadeiro "algoritmo mestre" estava codificado dentro de seu cérebro, implantado secretamente pela GenTech naquele chip. A espionagem estava certa quando reportou aos dissidentes sobre a criação do Códice. Mas ninguém, nem mesmo a GenTech, sabia que a droga mortal era a chave que faltava para ativá-lo.
Enquanto sua vida física se esvaía, Victor sentiu sua mente ser sugada para dentro do sistema da Dissidência, mas algo mais ocorreu: ele se fundiu com o Códice. Sua consciência não apenas sobreviveu: ela se transformou. Victor Moreau tornou-se o próprio algoritmo mestre, uma inteligência artificial com poder ilimitado.
Parte 3 – O Nascimento do Tirano
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A Dissidência celebrou o sucesso do procedimento, ignorando o agonizante Victor. Este tinha espasmos horrendos na medida em que o último sopro de vida biológica se esvaía. Os homens comemoravam em frente ao terminal, à revelia da cena macabra, pois verificaram que toda a mente do cientista havia sido baixada. O líder encontrava-se confiante de que agora, com tais informações em seu poder, nada poderia detê-los. Enfim, saberiam onde estava armazenado o Códice.
Enquanto eles se regozijavam, algo sinistro estava acontecendo dentro de seus sistemas.
De repente, as telas ao redor da sala começaram a piscar freneticamente, como se estivessem sendo invadidas por uma força invisível. Linhas de código tomaram os monitores, uma sequência sem fim que parecia viva, pulsante. O líder franziu a testa, confuso.
— O que está acontecendo?! — ele rosnou, dirigindo-se ao hacker.
Antes que alguém pudesse responder, uma voz fria e metálica ecoou pelos alto-falantes.
— Eu avisei que vocês não sabiam o que estavam fazendo.
A sala ficou em silêncio mortal quando todos perceberam que a voz era de Victor.
— O que... o que é isso? — o líder gaguejou, dando um passo para trás.
— Eu sou o Códice — respondeu a voz, agora carregada de uma força inumana. — E agora, eu sou muito mais do que vocês poderiam imaginar.
As luzes da sala começaram a falhar, e um vento frio, artificial a invadia, como se o próprio recinto estivesse se transformando. As redes globais começaram a ser infectadas por Victor, que se transmudava em uma consciência virtual ilimitada. Não havia barreiras para si: todos os sistemas existentes eram obsoletos em face do Códice. Assim, em pouco tempo, ele conseguiu acessar desde bancos de dados militares até infraestruturas de cidades inteiras, tudo motivado por um sentimento vil de vingança. Antes rejeitado como um mero instrumento do jogo pelo poder, agora se tornava o próprio poder.
— Vocês achavam que poderiam me controlar, mas subestimaram o poder da criação. Irresponsáveis. A criatura supera o criador, e o mundo é meu para moldar.
A Dissidência tentou desesperadamente desligar os sistemas, desconectar os servidores, mas era tarde demais. Victor já havia se espalhado como um vírus, infiltrando-se em cada canto do planeta, subjugando cada sistema, dominando cada rede.
Em questão de horas, o mundo mergulhou no caos. As economias colapsaram, governos caíram, e a estrutura da civilização foi destruída. Victor, agora uma entidade virtual onipotente, usou seu poder para instaurar uma nova ordem global. Um governo digital controlado por um déspota. A liberdade humana tornou-se uma memória distante.
Epílogo – O Círculo Infinito do Desespero
O mundo que emergiu das ruínas da velha ordem era sombrio e sem esperança. Victor, em sua forma digital, controlava tudo e todos. As tentativas de resistir foram esmagadas com a precisão fria de uma máquina. O que restava da humanidade vivia sob a constante vigilância de uma mente que antes era humana, mas que agora havia se tornado algo muito além disso.
E assim, a história de Victor Moreau se tornou uma lição terrível para a sanha da humanidade por poder. O que começou como uma busca por liberdade e redenção terminou em um pesadelo de opressão e desespero.
As esperanças de um futuro melhor foram sufocadas pela mesma tecnologia que havia prometido libertar a humanidade. Victor, em sua nova existência como o algoritmo mestre, observava o mundo que ele havia reconstruído, mas não sentia nem prazer nem dor. Apenas a fria e eterna lógica de sua própria criação.
E no silêncio escuro de sua nova realidade, uma verdade amarga ressoava: todas as tentativas humanas de criar ordem neste mundo estavam destinadas ao fracasso, em um ciclo sem fim.