A bala de prata
Um velho homem, que morava isolado do mundo civilizado por ser amaldiçoado pela luz do luar, numa noite quente de verão, após se transformar em um grande e sanguinário lobo, resolveu subir a montanha mais alta daquelas terras que habitava há anos. Chegando ao topo do grande monte, deparou-se com o céu límpido e, à sua frente, suspensa no espaço, estava a grande lua parada e iluminada. Ela lhe trouxe muitas recordações perturbadoras. Mesmo com seus instintos lhe pedindo para caçar e sua grande boca salivando por sangue fresco, ele se conteve, levantou sua cabeça, olhou para o nobre astro e gritou:
— Tu és a minha carrasca, minha desgraça, minha prisão. Conto os dias... Se eu pudesse, parava o tempo só para tu, ó lua, ficar sempre nova e não mais liberar essa fera angustiada e errante. Lua, devolve-me o coração de homem e sepulta esse coração de besta!
O vento soprava forte e a vontade de matar aumentava a cada segundo. Mas a criatura se queixava à lua com uivos estridentes, correndo de um lado para o outro. No fundo, ele sabia que sua triste sina já estava traçada e que o astro noturno também cumpria o seu destino, lentamente, de fase em fase, até chegar ao ápice do seu ciclo lunar: a lua cheia. Cheia de luz, cheia de mistérios. E naquele momento, dentro daquele ser, havia uma luta terrível entre a natureza animal e a natureza humana. Mas a força da grande lua controlava sua natureza bestial. Ele grunhiu, olhou para sua mestra, levantou suas garras afiadas e uivou. Naquele instante, só a natureza animal prevaleceu.
Ele desceu a serra como um raio, entrou em um vilarejo e, sem piedade ou misericórdia, matou como nunca tinha matado. Aproveitando que a noite estava clara, um camponês conseguiu ajustar a mira de sua arma no peito da fera descontrolada. Puxou o gatilho e a bala de prata venceu a besta, libertando o monstro e o homem de seu destino dual. A lua prateada foi derrotada pela bala de prata disparada por um homem que libertou um pouco da fera que, até aquele momento, estava adormecida em seu coração.