GERONTOFOBIA - fim

Aldrin preferia morrer antes de ficar velho. Idosos são tratados com preconceitos, rotulados como inválidos, rabugentos, frágeis, teimosos, um fardo para os outros. Ele havia encomendado uma pizza para ser entregue. Ao abrir a porta para receber, o entregador apontou para ele uma pistola e apertou o gatilho. A arma falhou três vezes, então o atirador se virou e foi embora. Era a terceira tentativa fracassada de matá-lo. Mais tarde Aldrin foi ao parque fazer ginástica ao ar livre. No banco sentados estavam alguns velhos conversando bobagens, se lambendo ao ver uma mocinha passar. Uma idosa apoiada num andador passou perto dele, ela tinha os cabelos pintados cor de fogo, tatuagens, um vestido colante acentuando as pelancas e celulites. A cena o repugnava e incomodava, decidiu voltar para casa, longe de velhos. Uma mulher jovem se aproximou dele:

— Aldrin, é voce mesmo ? Custei a reconhecê-lo !

Na sua frente estava a única mulher que significou algo em sua vida.

— Karen, o que voce faz aqui ?

— Vim buscar minha avó, mas minha mãe já tinha vindo buscá-la.

— Vamos para minha casa conversar, moro aqui perto.

— Voce vive sózinho nesse casarão enorme ?

— Eu nunca me casei, meus pais são falecidos.

— Sou odontóloga, ainda solteira, moro num apartamento. Meus pais vivem no sítio de minha avó. Depois daquele dia, eles passaram a se encontrar regularmente e pretendiam se casar.

— Karen, voce me devolveu o ânimo de viver. Preciso te revelar algo grave. Eu sofro de velhofobia, sinto pavor da velhice, pânico de envelhecer, contratei um pistoleiro para me matar.

— Então precisamos encontrá-lo, impedi-lo de cometer essa asneira.

— É inútil, sua página foi desativada.

— Mude-se para meu apartamento, vista-se de mulher para não ser reconhecido. Tire férias do seu trabalho, até conseguirmos localizar o pistoleiro.

Assim ele obteve as férias e passou a morar com Karen no apartamento dela. Ela havia ido passar alguns dias no sítio dos pais, sua avó estava com pneumonia. Sentindo-se solitário, vestiu um manto e um chapéu, e sentou-se no banco do parque, evitando de olhar para os velhos.

Um motoqueiro de capacete se aproximou dele :

— Eu desisto. Voce é o pior caso que já tive. MATE-SE SÓZINHO !

O pistoleiro se foi roncando a motocicleta.

Aldrin aliviado, telefonou para Karen avisando que o caso havia sido resolvido.

— Ótimo, voce não precisa mais se esconder. Venha passar o final de semana aqui no sítio, contato com a natureza faz bem, reduz o estresse. Ele arrumou a mala e ao anoitecer deixou a cidade, o sítio ficava há 15 km dali. No céu passeavam alguns relâmpagos, anunciando chuva. O vento começou a soprar forte seguido dum aguaceiro. No caminho uma árvore caíu sobre o carro. Ele conseguiu abrir a porta emperrada e sair para fora. Teria que andar ainda 2 km até o sítio. Depois de caminhar alguns metros, um homem veio ao seu encontro.

— Aonde voce vai ?

— Estou indo para o sítio dos meus sogros, uma árvore tombou sobre meu auto.

— Voce nunca chegará lá Aldrin. Olhe dentro do seu carro. . .

Ele se virou e viu no auto o motorista morto, tombado sobre o volante, com um ferimento na cabeça.

— Voce está morto Aldrin. Venha comigo, no lugar para onde vamos, todos são eternamente jovens.

— O que estamos esperando ? Vamos logo !

Os dois vultos se esvanesceram na escuridão da noite.

Algumas horas depois Karen recebeu a noticia do acidente, onde Aldrin havia perdido a vida. No dia seguinte depois do funeral, ela retornou para seu apartamento, sentindo um grande vazio.

Olhou para as flores ressequidas no vaso. A vida é como uma flor, que nasce, vai perdendo as pétalas, murcha e depois morre.

— Sim, a vida é uma flor. 🥀

FIM

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NACHTIGALL
Enviado por NACHTIGALL em 28/03/2024
Reeditado em 28/03/2024
Código do texto: T8029577
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