Minha mente

Com um caderno e uma caneta em mãos, encontro meu único refúgio neste ambiente fechado, quente e desagradável onde tenho permanecido por muitos anos, devido a problemas do passado, dos quais continuarei a enfrentar caso deixe este lugar. Pretendo registrar minhas memórias neste caderno.

Desde a juventude, eu testemunhava o que os outros não viam, sentindo um medo constante no peito. Temos medo do que não conhecemos. Um espírito, um demônio, um fantasma - eu não sabia ao certo. Todas as noites, ao deitar-me, uma presença no fim do quarto fitava-me intensamente, e o medo me impelia a correr para o aconchego dos meus pais. Contava-lhes o que via, mas eles não enxergavam nada, e, por isso, não acreditavam em mim.

Com o passar do tempo, acostumei-me com a presença daquela figura que me observava todas as noites, sem emitir uma palavra. Uma noite, ao despertar na escuridão, deparei-me com ela bem diante de mim, revelando sua terrível aparência. Seu rosto desfigurado, desprovido de pele, olhos arregalados, cabelos longos e um corpo coberto por pelos. Em silêncio, fitava-me fixamente, e o medo avassalador tomou conta de mim. Tentei gritar, mas nenhum som escapou de meus lábios; meu corpo imóvel recusava-se a obedecer. A sensação de impotência era indescritível. Meu coração pulsava descontroladamente enquanto a figura se aproximava cada vez mais, e, pela primeira vez, seu semblante transformou-se em um sorriso. Nesse instante, consegui fechar os olhos e deixar escapar um grito; meus sentidos retornaram.

Ao abrir os olhos novamente, nada mais estava lá - havia desaparecido por completo. Levantei-me ofegante e exausto, como se tivesse corrido uma maratona. O terror ainda dominava meu ser. Meus pais despertaram com meu grito e vieram até mim. Relatei-lhes o ocorrido, mas para eles não passava de um pesadelo tolo. Eu tinha certeza do que vi - era real, não um mero devaneio.

Na manhã seguinte, ao pesquisar na internet em busca de respostas para aquela madrugada assustadora, deparei-me com relatos sobre uma experiência denominada "paralisia do sono". Isso trouxe certo alívio, pois se encaixava perfeitamente no que vivenciei - ilusões criadas por minha mente. Ao anoitecer, fui dormir com um pouco de receio, porém também com a tranquilidade de saber que o ocorrido não era real.

Ao despertar na madrugada seguinte, deparei-me novamente com a mesma figura demoníaca fitando-me nos olhos, exatamente como na noite anterior. Paralisado pelo medo, mais uma vez o terror tomou conta de mim (aquilo parecia tão real). Desta vez, porém, ele não se contentou em apenas me assustar. Com uma das mãos tampou minha boca, enquanto na outra segurava uma faca com a qual fez um corte profundo em meu abdômen. Sangue manchou minha cama e a dor era palpável. Em seguida, moveu a lâmina lentamente em direção à minha garganta, cortando-a. Meus olhos piscaram e nada mais estava em meu quarto - meu abdômen e garganta estavam intactos; nenhum vestígio de sangue.

Aquilo não era paralisia do sono. Eu estava enlouquecendo.

Ao buscar meus pais para relatar o ocorrido, descobri que não estavam em casa - eu estava sozinho. Tentei dormir novamente, mas o medo era avassalador. Ao dirigir-me à cozinha em busca de conforto, avistei uma sombra rápida seguindo em direção ao quarto dos meus pais - eu sabia que era um chamado para mim. Empunhando uma faca, fui até lá determinado a pôr fim àquele terror.

Ao chegar ao quarto, deparei-me com meus pais deitados no chão, cobertos de sangue; ao lado deles estava a mesma figura demoníaca que me atormentava. Com um sorriso macabro, deitou-se na cama e adormeceu tranquilamente, como se nada tivesse acontecido. Aquela era minha oportunidade de vingança. Aproximei-me e cravei a faca em seu peito, ele abriu os olhos e começou a gritar, mas minha fúria era incontrolável. Finalmente, ele estava morto.

Ao olhar para o lado onde estavam meus pais, não havia mais sangue, e ao observar o demônio que havia matado, percebi que ele não estava mais lá - em seu lugar, estavam meus pais, cobertos de sangue. Eu havia feito aquilo, mas não podia ser real.

Um barulho na porta anunciou a chegada da polícia, alertada pelos gritos. Fui algemado e levado.

Durante o julgamento, relatei o que aconteceu, mas fui considerado mentalmente perturbado e encaminhado a uma clínica especializada. Lá, as coisas pioraram - via o mesmo demônio constantemente, relembrando-me do que fiz aos meus pais. Incapaz de conviver com outros, sempre tentava ferir alguém, convencido de que era o demônio de minha mente. Os medicamentos não surtiam efeito, e a linha entre realidade e ilusão desapareceu.

Após dois longos anos ferindo funcionários e pacientes, concluíram que minha condição era irreversível e me confinaram em um quarto à prova de som, trazendo-me apenas duas refeições diárias. O demônio insano permanecia no canto do quarto, fitando-me incessantemente e atormentando-me apenas durante as paralisias do sono.

O pensamento do suicídio me assombrava constantemente, mas uma pequena esperança de uma vida normal ainda persistia em mim. Conversar com outras pessoas seria um alívio bem-vindo. Contudo, nesse lugar isolado, sem distinguir quando é dia, quando é noite, eu apenas pedi um caderno e uma caneta ao funcionário que me traz as refeições diariamente, para me sentir menos só. Mesmo ele nunca ter dirigido uma palavra comigo, ele atendeu ao meu pedido.

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LS ALEXANDRE
Enviado por LS ALEXANDRE em 11/03/2024
Reeditado em 11/03/2024
Código do texto: T8017698
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