O palhaço no milharal
Com enredo envolvente, sabendo dosar o suspense com uma impiedosa hecatombe de adolescentes, talvez a carnificina até desponte como um dos principais atrativos que “O palhaço no milharal” de Adam Cesare tem a oferecer, embora a história possua outras facetas, sendo mais que uma trama a ostentar uma noite tétrica regada a mortes descomunais e sangue de inocentes.
O pontapé inicial abre mão da complexidão, apostando em uma perspectiva sem aparente inventabilidade, bem característica do slasher. Isso não quer dizer que a obra rechace esse elemento, pois ele está presente, ficando evidente durante o desenrolar da narrativa. O autor entrega originalidade no âmbito de uma história apinhada de particularidades, sem falar no verossímil conjunto de revelações, notáveis, ideadas sob o crivo de uma aguçada imaginação.
A idílica Kettle Springs é uma daquelas urbes pacatas como tantas outras, com fileiras de milho espalhadas por todos os lados. O que a diferencia é a presença de um bizarro símbolo, uma espécie de mascote que orgulha a população local: o peculiar palhaço Fredo. A bucólica cidade é adornada também pelo incessante conflito de gerações, de um lado os mais velhos, altamente conservadores, do outro os jovens ansiosos, capazes de tudo para debelar o tédio e alcançar a diversão. A relação fica ainda mais estremecida após um fatídico incidente, retratado nas primeiras páginas da narrativa.
Tendo o clima de inconstância como pano de fundo, Quinn e seu pai chegam à cidade, buscando na vida interiorana uma oportunidade de recomeço. Sem perceber, os dois se veem envolvidos pelo conflito perene, ficando sob as garras de um inclemente palhaço assassino, com sede de sangue e sofrimento. Mais do que um mero símbolo, Fredo agora desponta como a vingança de Kettle Springs, disposto a lavar a plantação com o sangue dos jovens incautos.
Diante da ação do palhaço homicida, a história assume seu caráter inventivo, com o enredo caminhando para a imprevisibilidade. A narrativa é bem estruturada, os eventos se tornam não apenas reais, como horríficos aos olhos do leitor, em passagens que mesclam tensão, violência desmedida, pânico e aquela nefanda sensação de confinamento. Nesse instante, o leitor enevoado perde o controle sobre as rédeas, exasperado pelos momentos intempestivos, pois até ali acreditava estar diante de uma história alicerçada no “água com açúcar”.
Apenas quando se debruça sobre suas páginas, é possível compreender porque “O palhaço no milharal” tornou-se um livro aclamado. Os personagens até poderiam ter sido mais bem delineados, mas são envolventes, conseguindo cativar o leitor sem grande esforço. O enredo criado por Adam Cesare talvez não atinja a condição de obra extremada, mas tende a agradar os adeptos a um bom slasher, a ponto de desejar uma sequência, conforme o próprio enredo sugere a possibilidade.