O LIVRO DE CASSANDRA KELLER- CLTS 21
Rio de Janeiro, RJ- 2018
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Sem ideias para escrever seu próximo livro, Murilo Xavier estava sentado diante do computador pensando se deveria abandonar a carreira de escritor e se dedicar somente ao trabalho de jornalista, quando um sinal sonoro interrompeu seus pensamentos.
Um e-mail acabara de chegar. O remetente era uma mulher chamada Cassandra Keller, nome artístico de Isabel Malta, ex atriz de cinema. Ela pedia para ele escrever a história dela em livro. Anexo estava um número de telefone para contato.
Murilo lembrava vagamente de uma atriz chamada Cassandra Keller. Acessando o Google, digitou o nome dela na barra de endereço e encontrou algumas informações na Wikipédia.
“ Isabel Conceição Malta, nasceu em Itabuna, Bahia, em 21 de outubro de 1948— ( 70 anos). Em 1966 ela ganhou uma bolsa de estudos da Fundação Rockefeller, passando a morar e a estudar nos Estados Unidos onde tornou-se atriz de cinema usando o nome artístico de Cassandra Keller. Voltou para o Brasil em 1982. No ano seguinte, a atriz sofreu um acidente de carro e a partir desse dia desapareceu da mídia e do cenário artístico. Seu paradeiro é desconhecido. Muitas teorias foram criadas, uma delas diz que Cassandra ficou com o rosto desfigurado e se escondeu do mundo “.
Murilo considerou que ali estava o assunto que ele procurava para escrever. A revelação de que a atriz estava viva e morando no Brasil, despertaria a curiosidade e o interesse de muita gente.
Pegou o celular para marcar uma entrevista. Quem atendeu foi a secretária de Isabel, Susana Vergara.
O endereço que ela deu era Chácara do Salgueiro, no Alto da Boavista. De Benfica até lá de o carro foi uma viagem de 30 minutos.
A casa era em estilo colonial, cercada pelo verde. Réstia de alhos estavam pendurados em cada lado da entrada.
Ele bateu e logo surgiu uma mulher de uns 40 anos com os cabelos presos num coque, de fisionomia séria.
— Boa tarde. Sou o Murilo
— Sou a secretária, Susana. Dona Isabel espera pelo senhor na biblioteca.
Susana notou a curiosidade dele pelos alhos.
— A madame acha que isso afasta maus fluidos.
— Pensei que era para afastar vampiros. — disse Murilo, em tom de brincadeira.
— Também.- respondeu a mulher sem se alterar.
Cassandra Keller, aliás, Isabel Malta, estava sentada numa poltrona perto da janela. Murilo a cumprimentou e foi convidado
a se sentar no sofá em frente.
— Então? Está disposto a ouvir a minha história e escrever o livro?
— Claro. Colocarei nesse trabalho todo o meu talento e conhecimento literário.
— Sei disso. Fiz uma boa pesquisa até escolher o senhor. Podemos começar? Veio preparado?
Murilo retirou um gravador pequeno de sua pochete e colocou sobre a mesinha de centro.
— Por enquanto é só o que preciso.
— O que você quer saber primeiro?
— Algumas informações peguei da internet.
— Sim, grande parte de minha história é conhecida. Minha adolescência, os filmes que trabalhei. O que vou contar ninguém sabe.
Em 1975 eu estava morando em um apartamento no Gramercy Park, em Nova Iorque. Certo dia resolvi visitar o Metropolitan Museo off Art. Estava lá, olhando as obras quando uma voz soou perto de mim.
— Lindo, não?
Olhei para o lado e vi uma jovem loira, de olhos verdes, muito bonita.
— E quem não gosta de Van Gogh? - respondi, encantada.
Resumindo, fomos caminhar no Central Park para continuar a nossa conversa e nos conhecer melhor. O nome dela era Adele Franco Arnel, tinha a minha idade, 27 anos. Era modelo exclusiva da grife Valentina Mordecay. Morava em Nova Jersey. Estava de férias, passeando por Nova Iorque.
Suzana entrou na sala, pediu licença e anunciou:
— A doutora Cintia chegou.
— Podemos continuar outro dia? — perguntou Isabel. Murilo desligou o gravador e se levantou.
— É claro. Telefonarei antes.
Susana pediu para ele acompanhá-la até o escritório, onde lhe deu um documento para ler e assinar, e um cheque para despesas pessoais. Era um contrato de trabalho, onde ele se comprometia a escrever a história para fins de impressão e comercialização, por um valor estabelecido em anexo. Valor que ele achou justo. Havia uma cláusula de confiabilidade. Se por qualquer meio revelasse que estava escrevendo a história de Cassandra Keller, que a usasse para outro fim que não fosse o do contrato, ele seria processado e multado. Ele assinou o documento e indagou:
— Dona Isabel está doente?
— Ela tem diabetes. A doutora Cintia faz exames periódicos e aplica insulina.
— Então, não tem problema continuarmos a entrevista?
— Eu creio que não. A doutor não proibiu.
Logo que chegou em casa, Murilo ligou o gravador e enquanto ouvia, digitava no computador.
****
Quando voltou à casa de Isabel na semana seguinte, ela estava sentada no mesmo assento. Usava um vestido curto até um pouco abaixo do joelho e, apesar das sombras, Murilo pode ver uma pequena borboleta vermelha tatuada no tornozelo direito.
Murilo ligou o gravador e Isabel continuou a relatar suas memórias.
— Foi no segundo encontro com Adele que começamos a namorar. Foi amor à primeira vista e sabíamos que dali para frente, uma não viveria sem a outra.
Num sábado fomos a uma boate. Dançamos e bebemos uns drinques. Dois rapazes se juntaram a nós, Johnny e Bob. Eram simpáticos e divertidos. Estavam de férias a procura de diversão e boa companhia. Aquela conversa de sempre. Bob nos convidou para ir ao apartamento dele, comer uma pizza e ouvir música.
Eu estava meio tonta. Adele foi quem aceitou o convite e me arrastou com eles para o apartamento num motel na Summit Avenue. Logo que entramos eles nos agarraram. Bob enfiou o rosto no meu pescoço. Johnny jogou Adele sobre um sofá e começar a tirar a roupa dela.
Ela não queria transar e o empurrou. Tentei interferir, mas Bob me segurou por trás e incentivou o colega a violentar minha namorada. Quando Johnny conseguiu abaixar as calças, Adele espichou o braço e pegou um saca-rolhas que estava sobre uma mesinha com uma garrafa de vinho.
Num gesto violento, Adele cravou o saca-rolhas no pescoço do rapaz. Em choque, ele levou a mão ao ferimento. O sangue esguichou entre seus dedos. Johnny desabou. Bob me largou e atirou-se sobre Adele, impedindo que ela usasse o saca-rolha novamente e começou a estrangulá-la. Ela me olhou de olhos arregalados, pedindo ajuda. Agarrei a garrafa de vinho e quebrei na cabeça do rapaz. Ele recuou e num ímpeto, Adele estraçalhou a garganta dele com o saca-rolhas.
No silêncio que se seguiu, só se ouvia a nossa respiração agitada. A essa altura a minha semiembriagues havia desaparecido.
Adele largou a arma improvisada, lambeu os dedos sujos de sangue. Um brilho de vitória relampejou em seus olhos. Me abraçou e me beijou com sofreguidão. Correspondi com igual tesão. Transamos ali mesmo, entre os dois corpos.
A primeira coisa que fizemos no dia seguinte, foi ler os jornais. Em três jornais locais saiu a notícia da morte dos dois rapazes. A reportagem afirmava que o autor, ou autores eram desconhecidos pela polícia. Também era desconhecido o motivo dos homicídios. As investigações prosseguiam.
Tivemos o cuidado em desfazer os vestígios de nossa presença no apartamento. Ninguém nos viu entrar ou sair. Naquele tempo ainda não existiam câmeras de monitoramento nas ruas e nem nas residências. De certa forma ficamos tranquilas, aquilo nos deu segurança. Não tivemos remorso.
A partir daquele dia, nosso relacionamento se fortaleceu. Eu até gostei de ver Johnny desesperado, tentando estancar o sangue do pescoço. Para mim parecia que borboletas vermelhas estavam saindo do pescoço dele.
Isabel calou-se. Fez uma pausa e disse:
— Por enquanto é isso. Continuaremos amanhã.
Disfarçando o seu espanto diante das revelações, Murilo desligou o gravador, colocou na pochete, despediu-se e saiu.
Susana o acompanhou até a porta. Antes de ir embora, ele indagou:
— É verdade o que Isabel está me revelando? Os assassinatos? Achei que ela contaria a história dela e não uma ficção.
Suzana olhou para ele, séria.
— Trabalho há 2 anos para dona Isabel. Ela me conta muitas histórias, se são verdadeiras ou não, não sei. Se houve realmente um crime, já prescreveu. O senhor vem amanhã no mesmo horário?
Murilo sacudiu a cabeça e foi embora.
***
No dia seguinte, Isabel voltou à sua narrativa.
— Era verão. Os dias estavam quentes e resolvemos passar o fim de semana na praia. Alugamos um apartamento em frente ao mar, em Long Beach. De manhã vestimos biquínis e fomos para a praia. Ficamos um tempo nos bronzeando e depois colocamos nossos apetrechos no nécessaire e saímos a caminhar.
Tinha muitas pessoas na praia. Notamos que um homem de bermuda jeans nos seguia, admirando nossas bundas. Devia estar ao redor dos 40 anos. De vez em quando Adele olhava para trás e o incentivava com um sorriso.
Percebi que que ela tinha algum plano. Eu confiava nela a seguia sem questionar. Chegamos a um ponto deserto da praia, sob um trapiche. O homem se aproximou sorridente e confiante como são os predadores amorosos praticantes do sexo casual.
Falamos banalidades como é o início de toda conversa informal e em seguida ele se aproximou de mim, me enlaçando com um braço e me acariciou com a outra mão. Adele assistia a cena com um sorriso estranho. Ela meteu a mão dentro da bolsa e pegou o punhal que tinha comprado dias antes. Golpeou as costas do homem várias vezes com fúria causada pelo ciúme, sabia que em seguida seria tomada pelo prazer porquê aquilo fazia parte de seu ato sexual primitivo, selvagem. O homem caiu, a vida se esvaindo lentamente. Enquanto ele agonizava, abracei Adele e a beijei. Transamos recostadas sobre o cadáver do sujeito. Aqueles assassinatos despertavam nossa libido. Transar sobre os cadáveres aumentava nosso prazer.
***.
Quando Suzana acompanhou Murilo até a porta, ele parou antes de sair e a encarou. Não estava convencido que Isabel contava uma história real.
— Não entendo como ela pode lembrar pequenos detalhes de algo que aconteceu 30 anos atrás.
Com seu jeito calmo e impassível, Suzana respondeu:
— Dona Isabel tem memória privilegiada. É o que os especialistas chamam de memória fotográfica. Até amanhã, senhor Murilo.
****
No dia seguinte, Isabel continuou a contar sua história.
— Em 1982 recebi convite do cineasta brasileiro, Sergio Ferrão Guimarães para estrelar um filme no Brasil. Li o roteiro e gostei. Ele tinha outros projetos para o futuro e achei que seria bom para minha carreira trabalhar no cinema brasileiro. Conversei com Adele. Ela tinha encerrado contrato com a Valentina e estava sem trabalho. A convenci a abrir uma agência de modelos no Brasil e naquele mesmo ano nos mudamos para um apartamento na Barra da Tijuca.
Em 1983, trabalhei no filme de Ferrão Guimarães. Depois que terminamos, dois dias depois, ele me chamou no escritório dele. Enquanto falava no projeto de seu próximo filme, ele abriu um pequeno envelope plástico e derramou um pó branco sobre a mesa. Imaginei que fosse cocaína e recusei usar. Mas ele me forçou a cheirar, quase quebrou meu pescoço sobre a mesa. Tive alucinações, fiquei meio inconsciente e ele se aproveitou para me estuprar. Eu não sabia se estava sonhando ou não. Não consegui reagir.
Não sei como e quando cheguei em casa. Ao me ver grogue, suja, abatida e com um hematoma no pescoço, Adele tirou minha roupa, me deu um banho e me colocou na cama para dormir. Quando acordei ela estava sentada ao meu lado, queria saber o que aconteceu. Contei e ela ficou furiosa. Descobrindo o endereço de Ferrão na lista telefônica, disse que iria falar com ele. Já era noite, tentei faze-la mudar de ideia, mas não adiantou, então fui junto. Quando chegamos na casa dele, em Jacarepaguá, o próprio abriu a porta. Ele se fez de inocente, disse que eu estava mentindo, que usei droga porque quis. De surpresa, Adele puxou o punhal da bolsa e cravou no peito dele. Ao ouvir o grito, uma mulher surgiu na sala envolta numa toalha de banho.
Ficou apavorada ao ver Ferrão caído, ensanguentado. Ela correu para o telefone, mas Adele a alcançou e desferiu várias estocadas nas costas dela. Logo em seguida descobrimos uma criança comendo cereais na cozinha. Ainda segurando o punhal sujo de sangue, Adele olhou para mim. Acho que ela pensou em matar a menina. Mas eu não concordei. Corri para a garotinha, cobri os olhos dela com a mão para não ver os pais mortos, e a levei para o carro. Deixamos a garotinha no saguão de um hospital e fomos embora.
Eu estava irritada com a decisão de Adele. Não pensei que ela fosse matar Ferrão. Eu não estava muito boa das ideias por causa da droga. Discutimos. Adele ficou nervosa, se descuidou do trânsito e acabou batendo em outro carro. Só vim a saber o que aconteceu quando acordei no hospital dez meses depois. Com a batida os dois carros pegaram fogo. Alguém conseguiu me tirar dos destroços, mas Adele morreu carbonizada.
Quando eu soube que ela tinha morrido, chorei muito. Minha companheira me apoiava e me dava forças. Sem ela me senti perdida e com muito medo de ser presa. Fiquei ainda alguns dias internada, fazendo fisioterapia. Quando me senti bem, fugi do hospital. Vendi minhas propriedades nos Estados Unidos e no Brasil, transferi meus bens e comprei essa chácara.
Isabel concluiu:
— Aqui vivo desde então. Essa é a minha história que você deve escrever com suas próprias palavras. Já pensou num título?
— Ainda não. Vou pensar nisso quando terminar de escrever.
***
Murilo decidiu fazer uma pesquisa para saber se os acontecimentos que Lara narrou, eram verdadeiros. Havia fotos na internet. No Brasil, descobriu uma foto dela e Adele na revista Manchete. Elas foram clicadas numa festa de fim de ano no Copacabana Palace. Estavam sentadas a uma mesa. Naquele tempo Adele estava de cabelos compridos. Dava para ver uma mancha pequena no tornozelo direito dela, que devia ser uma tatuagem.
Mas, não era Isabel que tinha a tatuagem no calcanhar? Murilo olhou novamente para a mulher loura. Isabel havia mencionado que Adele era loura. Será que ela também tinha uma tatuagem no calcanhar? Ou Isabel estava mentindo? Isabel não era Isabel, mas Adele?
Murilo continuando a pesquisa, encontrou no jornal, O Globo, a notícia do assassinato de Ferrão, acontecido no dia 23 de novembro de 1983. “ Morre o cineasta Sergio Ferrão Guimarães. Sergio e a esposa, foram encontrados mortos no apartamento do casal, em Jacarepaguá. A filha deles foi encontrada sozinha no saguão de um hospital. A polícia acredita que ela foi deixada lá pelos assassinos. A polícia não sabe o motivo do duplo homicídio. A identidade dos assassinos também é desconhecida”.
Tinha também, a notícia do acidente naquela mesma noite:
“ A atriz Cassandra Keller sofre acidente na rodovia Imperatriz Leopoldina. Ela foi internada no hospital Federal do Andaraí em estado grave. A modelo Adele Franco Arnel que a acompanhava, morreu carbonizada”.
***
Cassandra Keller, ou seja, Isabel Malta continuou a narrar os crimes que ela e Adele cometeram nas férias de verão nos Estados Unidos.
***
Murilo acabou de escrever o último parágrafo do livro e colocou o título; Borboletas Vermelhas.
Exausto, tomou um banho e foi dormir. Estava naquele estado entre a vigília e o sono, quando ouviu um farfalhar. Abriu os olhos e vislumbrou uma figura branca, etérea, aos pés da cama. Assustado, tentou se levantar, mas não conseguiu, estava paralisado. A mulher, que ele sabia ser Adele Arnel, se inclinou sobre ele e cravou os dentes em seu pescoço. Ele despertou com um pulo. Acendeu a luz, foi ao banheiro e se olhou no espelho. Havia um corte em seu pescoço e da ferida sangrenta saiu uma borboleta vermelha.
Murilo acordou com o próprio grito. Acendeu a luz, passou a mão pelo pescoço. Foi apenas um pesadelo.
****
Isabel não chegou a ver o livro pronto. Morreu de insuficiência cardíaca no hospital depois de duas semanas internada.
Murilo compareceu ao velório. Quando se aproximou do féretro, observou o pescoço do cadáver, mas não encontrou nenhum ferimento indicando que ela foi mordida por um vampiro. Vampiros não existem, pensou.
Ninguém sabia que aquele era o funeral da atriz de cinema, Cassandra Keller. Só ficaram sabendo quando o livro foi lançado, causando um rebuliço na mídia. Murilo ficou com a agenda cheia. Na noite de autógrafos, a procura para pegar autografo do autor era grande.
Até Suzana, a ex secretária de Isabel, entrou na fila. Murilo fez uma dedicatória especial para ela. Mais tarde, quando ele fez uma pausa para comer um lanche, a encontrou na praça da alimentação tomando chá. O livro estava ao lado, aberto na segunda página.
Murilo achou que ela parecia mais jovem, mais bonita. Estava com os cabelos soltos, usava uma blusa bege de mangas compridas, saia justa azul-cobalto e sapatos de salto alto combinando com a saia.
— Posso me sentar?
— Claro. Esteja à vontade.
— Eu só queria lhe perguntar se você sabia que Isabel era Adele? Foi Isabel quem morreu no acidente e não Adele?
Susana não se perturbou.
— Não sei de onde o senhor tirou essa ideia. Conheci dona Isabel no hospital há dois anos quando ela fez uma cirurgia na coluna. Minha mãe também estava internada no mesmo quarto. Ficamos amigas. Ela me contou que era a atriz Cassandra Keller há poucas semanas quando resolveu contar suas memórias em livro. Tirando a cor dos cabelos, ela e Adele eram parecidas, sim. Mas pra mim pouco importa quem é minha patroa. Tenho por norma me preocupar apenas em fazer o meu trabalho com eficiência.
Susana fez uma pausa, tomou um gole de chá e continuou:
— Daqui a alguns dias o testamento de Isabel será aberto. Ela me confidenciou que incluiu a doutora Cintia na lista de herdeiros de seus bens. Aliás, semana que vem começo a trabalhar no escritório dela.
Susana fez outra pausa e encarou Murilo.
— Lembra da menina órfã que foi abandonada por ela e Adele no saguão hospital?
Murilo ficou surpreso.
— É a doutora Cintia?!
— Se Isabel fosse Adele, não teria pago os estudos dela, nem incluído na lista de herdeiros, não é mesmo? É claro que ela pagou os estudos de Cintia de forma anônima. Espero que o senhor seja honesto e honrado o bastante para guardar esse segredo.
— Não se preocupe. Guardarei.
Susana acabou de beber o chá, pegou o livro e se levantou. Sorriu brevemente, coisa que Murilo ainda não tinha visto.
— Assim espero. Até logo. A gente se vê por aí.
O ruído dos passos de Susana soou pela galeria e foi desaparecendo enquanto ela descia as escadas. Murilo sacudiu a cabeça para clarear as ideias. O perfume de Susana deixou-o meio tonto.
Naquela noite ele pesquisou na internet sobre vampiros. Encontrou um artigo que falava de outro tipo de vampirismo. Algumas pessoas tinham o dom do vampirismo sutil, principalmente as mulheres que continuam jovens e belas por muito tempo. O vampirismo é praticado por osmose, elas sugam a força vital da vítima sem tocá-la.
Seria Susana esse tipo de vampiro?
Um ruído sonoro interrompeu os pensamentos de Murilo. Um e-mail acabara de chegar
Era de um advogado. Ele convidava Murilo a comparecer no escritório como beneficiário do espólio de Isabel Conceição Malta, para abertura do testamento.
FIM