I STILL VERMES YOU

“‘I still loving youuu… Ahhh! SCORPIONNNS!!… RUM! QUE CRETINO! Não sei se me sinto lisonjeada ou VELHA!”. Lilla riu enquanto encarava a carta cheia de coraçõezinhos e a cesta de presentes. “Parece um adolescente!”. Flores, vinho… Nada daquilo tinha muito haver com ela… Ou com eles dois. Mas Atila estava tendo ao menos ALGUMA reação. Estava dando notícias… Finalmente… demonstrando que todo aquele AMOR não tinha repentinamente acabado, com um “chá de sumiço”. Na carta ele parecia tentar explicar tudo, mas era confuso… Parecia mentira… Mas Atila não era muito de mentiras. “Pelo menos o Atila que eu pensava que conhecia…”.

 

Lilla tentava não devanear e tentava evitar pensamentos catastróficos… “Se tivesse conhecido outra pessoa ele simplesmente me diria. Não abriria mão de estar com ela, se gostasse. Não, NÃO. Não… se quisesse ficar com alguém, ele FICARIA! Não é traição, não pode ser… E parece que ele não abre mão de mim. Então por quê ele não aparece? Que mistério é esse?! Será que ele está me preparando…? Será que foi TÃO RUIM assim?! Meu Deus…!”

 

Lilla estava sentada entre travesseiros e presentes. Tudo que havia na cesta estava espalhado na cama como se fossem evidências. Provas que ela queria simplesmente engolir e dormir… Porém, as provas de amor estavam ali naquela manifestação adolescente. Só que ele continuava sumido, após uma semana de “Preciso de um tempo…”, “Conversaremos, eu juro!”, “Não estou em casa, por favor me dê só alguns dias… Te amo.” e agora aquela carta com aquela explicação terrível, sobre uma “NOVA CONDIÇÃO FÍSICA” que ele precisava ainda entender, e precisava de coragem para mostrar.

 

Perguntas por mensagens no celular simplesmente não eram respondidas… nem mesmo eram visualizadas. Seus amigos e colegas não sabiam onde ele estava e Atila não tinha família. Apenas um irmão que morava no Canadá e telefonava duas vezes no ano; em seu aniversário e no Natal. Lilla se sentia torturada. E talvez se ele tivesse anunciado o fim… ela soubesse melhor pra que lado ir. Saberia o tipo de dor que deveria sentir. Pois conhecia essa dor… Já tinha passado por isso outras vezes, então: Sabia quanto tempo mais ou menos a dor duraria. Dor de amor não é nada de outro mundo… Mas a conversa não era de outro amor. E nem de traição! Era uma vaga informação de uma enorme desgraça; “Nova condição física que ainda preciso entender…”. “MEU DEUS DO CÉU…”.

 

 

Na manhã seguinte… Lilla percebeu que tinha dormido em cima de um monte de flores e papéis de presente. A caixa de chocolate estava vazia. O vinho? Estava na metade… Lilla era fraca pra bebida. Sua barriga dava algumas “voltas” em direções que não eram as direções corretas. Correu pro banheiro e vomitou na privada. Um vômito escuro… com um cheiro horroroso e ácido. Mas se sentiu imediatamente curada. “Nossa! A ressaca mais curta que já tive…!”. Tomou um banho demorado e saiu de toalha, cantarolando e um tanto renovada. “Descansada” melhor dizendo. Vestiu uma camisola e parou em frente a sanduicheira pra fazer waffles. Estava leve e quase sorrindo… Seu inconsciente sabia que em alguns minutinhos Lilla se lembraria de todos os problemas do mundo; os dela, os de quando era criança; os problemas dos amigos; os problemas dos parentes, pais, colegas de trabalho… E afinal… o problema não resolvido e não determinado (em teor) do seu namorado sumido, o Atila. Sentou-se na frente da TV e olhou pra porta. Pronto! A porta foi o gatilho. Desejou vê-lo entrando e… Nada dele. O que faria agora? Mandaria presentes de novo? Atila parecia estar próximo de resolver o problema… Ela podia sentir. Não dá pra ficar se escondendo pra sempre… “O que quer que tenha acontecido, EU VOU FICAR COM ELE.” – disse em voz alta enquanto comia um waffle cheio de calda de chocolate por cima. “EU VOU FICAR COM ELEEEEE!!!! AQUELE IDIOTAAAA! AAAAA.…!!! Eu amo ele… AMO, AMO, AMO…”. Foi bem nesse momento que a porta se abriu… Lilla ouviu o clique atrás dela. Lilla estancou com medo de virar. Podia escutar algo que “se parecia” respiração, mas era algo mais sofrido. Mais dificultoso… “Será que sofreu um acidente?” e de repente uma voz. “Amor… Acho que essa será a última vez que nos vemos”. Diante de tanto mistério, Lilla paralisou com muito medo de olhar. “Mas… pra você se decidir… Pra a gente saber como vai ser… Você precisará fazer uma forcinha! Eu… eu… Eu sei que te deixei por muitos dias no limbo, mas… Me ajuda tá…?! Abra os olhos! VEJA O QUE ACONTECEU COMIGO!!”.

 

Lilla virou… Virou se arrependendo, desde o primeiro segundo.

 

O que ela viu, parado na porta de sua casa e implorando pelo seu amor… Foi um monstro. Um verme gigante, um MOROTÓ BRANCO e suado, mais ou menos do tamanho da porta se não estivesse tão curvado; fosse pela natureza de sua estrutura; fosse pela enorme vergonha que Atila sentia – e com razão – pois a partir daquele momento em que Lilla abriu os olhos, a coitada não conseguiu mais parar de gritar e se afastar, enquanto jogava nele tudo que estava ao seu alcance. Mesmo com os gritos, Atila, com sua boca gigantesca e redonda, cheia de dentinhos enormes e brancos, tentava implorar… se explicar… e gesticular. Mas logo percebeu que gesticular deixava-a ainda mais perturbada. Então passou a simplesmente repetir as mesmas coisas, chorando. Desanimado… (no fundo ele já sabia que Lilla jamais conseguiria ficar com ele), Atila dizia: “Sou EU, meu amor! Sou eu! Sou EU, meu amor… O Seu Atila, seu gordinho…!” Lilla afinal, desmaiou.

Atila, com muita dificuldade, pois quase não tinha mais braços, levou Lilla pra cama. Lilla dormiu por uns 30 minutos e já acordou gritando quando o viu novamente; sentado na ponta da cama. Atila se afastou o máximo que pode “não olhe pra mim, Lilla… Talvez assim poderemos, ao menos, conversar pela última vez…”. Lilla pegou uma fronha de travesseiro e pôs na cabeça.

 

– Amor… – Ela falou.

– Sim, meu amor…

– Eu… eu não sei consigo acostumar, com “isso”. Mas… eu te amo.

– Eu sei que você me ama Lilla. Mas eu não sou mais o mesmo… Só por dentro.

– Existem “pessoas” assim?! Assim como você?

– Não, querida. Acho que sou o único…sou uma aberração.

– Não existe então, NENHUMA expectativa… de felicidade? Com seus semelhantes?

– Não, não. – Respondeu Atila chorando.

 

Lilla se levantou e foi até a cozinha, ficou mexendo nos armários por um tempo. Achou um frasco e voltou com ele.

 

– AQUI… É remédio de verme. Teoricamente se você beber. Você morre. Será? Mas acho que não deve doer tanto. Imagino que essa sua “transformação” tenha sido bem dolorosa.

– Pior que não, amor… Certo dia acordei de sonhos ATÉ que felizes! E acordei desse jeito. Mas… talvez seja a única opção, mesmo. Tomar um troço desses. Ou mais de um. Eu não vou conseguir trabalhar ou sair… E a coisa que eu mais amava eu não posso ter.

– Você está querendo dizer que EU sou a coisa que você mais ama?! … No mundo todo?!

– Me desculpa se nos bons momentos eu fui vago, meu amor. Eu deveria ter demonstrado melhor… Todos os meus planos de felicidade futura dependiam unicamente de continuar tendo você ao meu lado.

– Ownn… ATILA!… Se você soubesse O QUANTO SONHEI COM O DIA QUE VOCÊ ME DIRIA COISAS ASSIM!!! Eu te amei muito, MUITO, MUITO!!! Nunca amei ninguém desse jeito…

 

O verme humano de quase dois metros de altura, saiu um pouco das sombras, para tirá-la dos devaneios e a realidade vir a tona. A realidade monstruosa, nojenta… Que eles precisavam lidar justo agora.

– É, MAS… Se você abrir os olhos, Lilla… Eu continuo sendo um verme gigante. Um monstro. Então, se não for incomodo, Lilla, meu amor… Agora preciso ir embora. Decidi tomar esse líquido que você me deu. Mas… Acho mais conveniente bebê-lo em minha casa, sabe? Ou quem sabe até no esgoto, que é meu lugar. – Atila foi se arrastando desengonçado, deixando um rastro melequento, viscoso no chão. Se ainda tivesse canal lacrimal, provavelmente estaria em prantos agora. Quando estava parado na porta do elevador, rezando pra que ninguém aparecesse; ouviu um “Psiu!” e olhou pro lado. Lilla estava na porta de casa, olhando diretamente pra ele… segurando as flores que recebeu. Ela sorria… E ele voltou.

 

Mais tarde estavam deitados na cama lado a lado (mas ainda trabalhando o “contato direto”). Lilla ainda tinha dificuldade de olhá-lo, quanto mais encostar nele. Mas com paciência, as coisas voltariam ao normal. “Apague a luz…Eu fico mais calma…”, ela disse.

 

– Amor.

– Sim…?

– Quanto tempo vive um verme? A gente precisa saber essas coisas…

– Não sei. Mas acho que DESSE tamanho… Deve ser que nem humano mesmo!

– Hum, temos que procurar saber! E temos que saber de suas habilidades! Coisas que só você sabe fazer… Precisamos descobrir! Pra gente ver o que você pode ganhar com isso…

– Lilla… Eu ainda consigo digitar, sabia? Hehe.

– E filhos…?! Sairiam como eu?! … Ou como você?? E será que saem em quantidades enormes?

– Er…Lilla…

 

 

 

Henrique Britto
Enviado por Henrique Britto em 20/07/2023
Código do texto: T7841333
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