A GRAVAÇÃO
A gravação
– Mataram o João! – disse Gláucia.
– Eu não te falei.
A mulher olhou sem entender o que Cláudio havia dito.
– Falou o que homem?
– Que ele estava conversando com um traficante lá na praça. Ele olhou seriamente para a mulher. – Tá distraída de mais, ultimamente.
Ela olhou o marido e se lembrou vagamente do que ele havia dito anteriormente.
– Agora me lembrei. – removendo o cabelo da frente do rosto, ela se sentou.
Cláudio largou o celular, se levantou e foi até a janela.
– Vai no salão amanhã? Já está pago. Tem que estar bem bonita para aquele jantar com empresários, e depois tem uma surpresa.
Ela estava desatenta, confirmou com a cabeça de forma afirmativa, pegou o telefone e foi se banhar.
***
Na volta do jantar, na estrada entediante, Cláudio perguntou a esposa.
– Foi ao enterro?
Ela estava muito quieta desde que saíram do jantar, respondeu sem entender.
– Que enterro?
– Do João, uai!
Ela resolveu prestar mais atenção a conversa e respondeu.
– Não. Olhou muito sério para o marido – por que eu deveria ir?
– Hum!
Antes que Cláudio falasse algo o carro começou a engasgar e ele encostou no acostamento.
Ele desceu do carro, foi até o porta-malas e pegou uma chave inglesa vermelha, que sua mulher olhava com estranheza sem ter a menor ideia do que era e para que servia aquela ferramenta. Ele foi até a dianteira do carro e abriu o capô e ela parou em sua frente com a lanterna do telefone acessa sem entender nada, enquanto ele olhava o motor.
– Amor pode pegar um pano no porta-luvas pra mim.
Assim que a mulher deu as costas, ele usou a ferramenta como arma de arremesso, e acertou a nuca dela. O corpo caiu de bruços.
Ele verificou a respiração e os batimentos cardíacos, estava desmaiada mas viva, depois entrou no carro ascendeu um cigarro, ligou o rádio e viu que aquele local ermo na estrada não tinha sinal de celular.
***
Saiu do carro, e virou o corpo da mulher de barriga pra cima no acostamento. Ficou admirando como ela estava bonita no vestido preto causando inveja a todas as mulheres no jantar.
Fumou que nem um condenado até que ela finalmente acordou. Estava zonza, quando teve os sentidos recobrados, ainda sentada no chão, perguntou.
– O que aconteceu?
O marido em pé com a chave inglesa na mão encarava a mulher.
– Você confessa? Disse ele.
Ela olhou nos olhos dele e finalmente entendeu o que estava acontecendo e do que se tratava, gritou suas últimas palavras.
– NÃO!
Ele bateu com a chave na cabeça dela até estar saciado. Estourou o crânio, e deixou todo o cabelo cacheado empapado de sangue.
Passada a adrenalina seus pensamentos se tornaram irracionais como o de todos os assassinos, pensou em ocultar o cadáver, colocar fogo, esquartejar, jogar o carro com o corpo desfiladeiro a baixo, dizer que foi assalto, sequestro, etc.
Seria tudo perda de tempo.
Quando o tremor passou, colocou o corpo dela no banco de trás e foi em direção a cidade.
***
Ele deixou o carro na calçada, entrou em casa e pegou só o necessário, ligou para o 190, saiu com a moto e ficou desaparecido por um mês.
Na sua apresentação na delegacia com seu advogado o delegado muito seriamente lhe perguntou.
– Por que o senhor matou sua esposa?
– Legitima defesa, delegado!
O delegado ficou sem entender nada.
– Legitima defesa! O senhor estourou a cabeça da sua mulher com uma chave inglesa, e me vem com essa de legitima defesa.
Cláudio estava muito tranquilo. Pegou o celular e acessou um aplicativo.
– Posso colocar um áudio para o senhor escutar? Delegado!
O delegado sem entender permitiu.
Atentamente o delegado escutou uma gravação aonde a mulher de Cláudio conversava com outro homem que dizia a todo momento que a amava e faria qualquer coisa por ela. Na gravação eles também combinavam como matar Cláudio, e ficar com tudo que era dele.
O delegado perguntou.
– O senhor sabe quem é esse homem da gravação?
– Não tenho a menor ideia.
Quando ele guardou o smartphone, seu habeas corpus chegou.
***
No julgamento com muito protesto do promotor, que acusava Cláudio de feminicídio e misoginia, seu advogado conseguiu com que a gravação fosse ouvida pela juíza.
Ela ouviu atentamente a gravação e até pediu pra repetir, e olhava atentamente para o réu com a sensação de que o conhecia de algum lugar. A juíza bateu o martelo e absolveu o homem. A onda de protesto e o alvoroço com a imprensa no fórum foi um show digno de Hollywood, com muita luta a juíza chegou no carro.
No caminho para casa, ela pegou o celular e mandou uma mensagem para o detetive particular, autorizando ele a investigar o adultério de sua companheira.
***
A juíza Ramilla entrou no seu apartamento e Mel sua companheira já estava a sua espera de baby doll e com uma garrafa de vinho e duas taças em suas mãos.
– Pensei que não chegava nunca, como foi no julgamento?
Entregou a ela umas das taças e encheu.
– Absolvi o assassino!
– Sério amor! Pensei que você fosse dar pena máxima.
– A gravação mudou tudo. – Ramilla bebeu todo o conteúdo da taça e pediu mais.
– Que tal um banho juntas pra tirar o estresse?
Ela olhou toda a sensualidade do corpo de Mel, e não pode resistir, topou na hora.
***
Estavam deitadas após o banho no sofá enroladas nas toalhas, e Mel estava curiosa.
– E essa tal de gravação do seu caso?
Ramilla pegou o celular e reproduziu a gravação. Mel ficou espantada com o conteúdo.
Mel foi fazer mais um vídeo para seu canal de curiosidades no youtube. Ramilla ficou só, e verificou que o detetive respondeu dizendo que começaria imediatamente a investigação, então ela apagou as mensagens dele, se vestiu e foi ler alguns processos.
***
Um mês havia decorrido, com o carro parado no trânsito Ramilla recebeu o relatório em PDF do detetive particular, efetuou o restante do pagamento e se dirigiu para uma cafeteria próxima dali, não estava se contendo de ansiedade. Terminou de ler o relatório, largou o café eu bolo pela metade, pagou e foi embora.
Ao entrar o apartamento pensou estar presa em um loop temporal, Mel estava novamente de baby doll e com uma garrafa de vinho e duas taças a sua espera.
– Eu sei de tudo, Mel!
Mel ruborizou, colocou o que tinha nas mãos sobre a mesa de centro e tentou negar e disfarçar de todas as maneiras.
Ramilla esfregou o celular com o relatório na cara dela. E gritava enlouquecida.
– O pior de tudo sua maldita é que você me trai com o assassino dono da gravação que eu absolvi.
Em determinado momento da discussão elas foram parar na cozinha. Ramilla num acesso de raiva pegou uma faca de filetar peixes, e golpeou o seio redondo e rígido do lado esquerdo do peito de Mel. Caída sobre o corpo da companheira já sem vida, rolou uma lágrima de seus olhos. Ainda tremendo ela ligou para a polícia.
***
O delegado estava novamente ouvindo aquela gravação, enquanto olhava para a juíza transtornada e seu advogado. Terminada a reprodução da gravação, o policial auxiliar do delegado, que estava em pé, fez um comentário premonitório.
– Parece que todos que ouvem essa gravação, matam a quem amam delegado!
O delegado mandou o companheiro de trabalho recolher a juíza a cela especial. Depois pegou seu celular, mandou uma mensagem para a esposa perguntando onde ela se encontrava. Verificou se a pistola estava carregada, colocou-a no coldre e saiu…