Planeta dos Vampiros — CLTS 21.
By: Johnathan King
PRÓLOGO.
... Sebastian queria ficar ali caído e desmaiar, mas precisava reagir ou seria morto. Ele se levantou com esforço. Uma sombra o cobriu. O gigante agarrou seu pescoço e começou a apertar com força. Ele encarava o garoto com uma ira assassina. Sebastian sentia o corpo mais leve, como se tivesse flutuando em nuvens de algodão-doce — algo agradável, que o estimulava a relaxar e se entregar...
1. APOCALIPSE.
Sebastian era um adolescente de dezessete anos magricela de orelhas pontudas, com cabelos castanhos e encaracolados, e uma cara fofa de bebê chorão. Ele vestia calça jeans desbotada, um tênis Nike incrivelmente gasto, usava um boné enfiado na cabeça e a única coisa visível eram os olhos pequenos que pareciam mudar de cor, como um caleidoscópio... amarelo, azul e verde. Vivia em Londres com os pais. Moravam no subúrbio da cidade, numa daquelas casas que ficavam coladas umas nas outras, formando uma enorme fileira. Naquele dia em especial, um evento apocalíptico global, descrito depois por muitos como "o dia do fim do mundo", iria mudar para sempre a vida do garoto e dos pais.
Pesadas nuvens negras se espalhavam pelos céus dos quatro cantos do planeta, transformando o que era dia em noite, e o que já era noite em absoluta trevas. As lâmpadas elétricas deixaram de funcionar, assim como as lanternas comuns e as dos celulares. Foram acesas velas nas casas, e o fogo nas lareiras e nas fogueiras espalhadas por cada esquina das grandes e pequenas cidades do mundo brilhavam tanto quanto em uma noite sem luar. As aves se retiravam para os poleiros como que para dormir, os animais do campo se ajuntavam nos estábulos e berravam, os pássaros entoavam seus cantos costumeiros como fazem quando chega o crepúsculo; os morcegos e aves noturnas voavam em derredor. Na maioria dos lugares do globo, as trevas foram tão intensas durante o dia que as pessoas não podiam distinguir as horas.
Depois de um tempo que não se soube calcular, aquela escuridão profunda começou a se dissipar lentamente, e o sol, ao se tornar visível outra vez em alguns lugares, tinha agora a aparência de sangue. E nenhum governo mundial soube dar uma explicação para o fato que foi enchendo gradualmente o espírito das pessoas de temor, ansiedade e pavor de acordo com que as horas se passavam e nenhuma resposta era apresentada.
Sebastian saiu de casa para procurar pelos pais que estavam fora, preocupado com a segurança dos dois após assistir pelos noticiários tudo o que estava acontecendo pelo mundo antes das redes de mídia deixarem também de operar. Nas ruas, loucura e desespero diante do desconhecido. Pessoas totalmente ensandecidas atacavam outros feito feras raivosas, enquanto muitas fugiam para longe. Ninguém se entendia mais.
O garoto ouviu passos ligeiros vindos em sua direção, e quando olhou para trás viu uma mulher correndo para cima dele com a boca aberta cheia de dentes pontiagudos semelhantes aos de uma piranha adulta, era a sua mãe. Ela voou pelo ar tão depressa que não deu tempo de Sebastian desviar do ataque. Eles caíram no chão e entraram em luta corporal, o garoto incrédulo tentava entender o que diabos estavam acontecendo, em simultâneo, em que sua mãe totalmente fora de si, tentava a todo custo alcançar e morder seu pescoço.
Sebastian alcançou uma barra de ferro caída na calçada e pegou, cravando a ponta fina no peito da mulher, que gritou de dor e saiu correndo para longe. O garoto não percebeu, mas uma segunda pessoa com dentes de piranha se aproximou sorrateiramente, dessa vez um homem, seu pai, que cravou seus caninos no pescoço dele, certeiro, tirando sangue. Mas Sebastian estava em choque. Demorou muito para entender. Ele sentiu os olhos pesarem, a escuridão tomando sua mente, e seu último pensamento foi de estar morrendo. Então desabou, e tudo escureceu.
A luz veio devagar muito depois, e o garoto ficou se perguntando há quanto tempo já estava morto. "Um dia, uma semana, um ano?"
2. HOJE EM DIA.
Sebastian estava submerso nas águas turvas de uma lagoa em meio a escuridão da noite. Observava com cautela aquelas criaturas de peles pálidas e corpos esqueléticos, que mais se assemelhavam a mortos saídos das tumbas, estavam à escuta, farejando o cheiro da caça e tentando ouvir qualquer ruído que pudesse denunciar o paradeiro de sua presa. As águas eram tão negras quanto a noite era densa, um cobertor perfeito que absorvia qualquer resíduo de luz e desviava qualquer som.
Sebastian permaneceu submerso naquelas águas escuras, aguardando que seus algozes se fossem. Ficou em silêncio o tempo todo, até notar que os grunhidos que as criaturas faziam quando se sentiam perdidas em suas próprias convicções foram ficando mais baixo e aos poucos sumindo, como passos que se afastam numa calçada da cidade.
Agora, ensopado de pânico, o garoto amaldiçoou a noite em que foi transformado naquela criatura sugadora de sangue. Ele nadou para fora d'água e se deitou na grama seca que margeava a lagoa. Ficou olhando para o céu escuro e sem estrelas. Seu corpo todo doía como se ele ainda fosse humano, e ainda assim a dor nada significava diante da angústia de ter sido transformado em vampiro anos atrás.
Sebastian se levantou, a roupa ensopada e os pensamentos fervilhando junto com o ronco de sua barriga, não o deixavam raciocinar direito. Ele estava fraco, molhado e faminto. Fazia muitos dias que não se alimentava. O planeta havia se tornado um lugar hostil e perigoso de se viver, principalmente sozinho. No começo, o grande inimigo era os humanos que lutavam por sua sobrevivência e hegemonia. Com sua total extinção, o novo inimigo passou a ser os outros vampiros.
3. O VAMPIRO GIGANTE.
Sebastian andava pelas calçadas se esgueirando nas sombras como um fantasma, tentando se manter invisível diante dos perigos ocultos em cada beco e esquina da velha Londres. Mas tanto cuidado e precaução não foram o suficiente para mantê-lo longe do inimigo. A apenas cinquenta metros, diante dele, a silhueta monstruosa de um grande vampiro negro espreitava-o através de olhos felinos treinados enquanto de quatro se alimentava de um outro vampiro que teve a má sorte de ter cruzado seu caminho.
Sebastian tentou dar alguns passos para trás, mas suas pernas pareciam feitas de chumbo. O vampiro se levantou, limpou o sangue da boca na manga da camisa, depois sorriu, exibindo restos de carne presos em seus dentes serrilhados. Por um momento, Sebastian sentiu como se seu antigo coração tivesse voltado a bater no peito. As mãos outra vez quentes e suando de nervoso, o corpo vacilando e o medo começando a lhe dominar, enquanto sentia que morreria pela segunda vez naquela vida a cada passo que o inimigo dava em sua direção.
O vampiro de pele escura começou a se aproximar muito mais rápido de Sebastian, sorrindo para ele com seus dentes pontiagudos ainda sujos do sangue da última vítima. O garoto cambaleou como se tivesse levado um soco, mas suas pernas reagiram instintivamente diante do perigo eminente que avançava com pressa para cima dele. Sebastian saiu correndo, sabendo que daquela fuga covarde dependia sua existência como vampiro.
Os olhos do gigante negro se estreitaram. Ele rosnou feito um cão raivoso e se lançou contra Sebastian, determinado a alcançar seu alvo. O garoto continuava correndo para longe daquele monstro de pele escura e cheio de músculos, numa Londres ainda mais cinzenta e melancólica do que fora no tempo em que ainda existia humanidade. A velha cidade de Reis e Rainhas do passado não passava agora de um grande sepulcro nostálgico. Havia muito tempo que as calçadas de Londres foram esvaziadas de toda forma de coisas mundanas.
4. SALVADOR.
Sebastian chegou em um beco sem saída, literalmente. Ele estava de pé em uma rua interditada por uma grande cratera que havia engolido boa parte do quarteirão de casas e lojas que funcionavam ali um dia. Nuvens cinzentas e baixas se misturavam à neblina que começa a se formar na madrugada, e havia uma chuva fria e fina no ar. O garoto se virou, trêmulo. À sua frente, seu algoz o encarava com um grande sorriso de triunfo no rosto. Seus olhos brilhavam como fogo incandescente na neblina e sua pele tinha a mesma cor de chocolate avermelhada em contato com a água da chuva.
O negro abriu a boca, e seus dentes serrilhados começaram a brilhar. Depois correu para cima de Sebastian. O garoto cerrou os punhos e resolveu encarar seu algoz, mesmo sabendo que aquilo seria um ato de suicídio e burrice. Os dois se chocaram com violência, e Sebastian foi jogado para longe com o impacto. O negro cambaleou na outra extremidade, e caiu para frente. Ele rosnou de dor. Lentamente, a compreensão surgiu nos olhos dele. O vampiro olhou, incrédulo, para o sangue que caia no chão, deixando o asfalto vermelho. Sua cabeça estava ferida. Ergueu os olhos na direção de Sebastian, que ainda estava caído do outro lado tentando se recuperar. Imediatamente o vampiro se levantou de um pulo.
Sebastian queria ficar ali caído e desmaiar, mas precisava reagir ou seria morto. Ele se levantou com esforço. Uma sombra o cobriu. O gigante agarrou seu pescoço e começou a apertar com força. Ele encarava o garoto com uma ira assassina. Sebastian sentia o corpo mais leve, como se tivesse flutuando em nuvens de algodão-doce — algo agradável, que o estimulava a relaxar e se entregar.
O gigante negro estava se preparando para finalizar Sebastian, quando percebeu tarde demais o ataque que veio por trás, que arrancou literalmente sua cabeça fora. Nos seus olhos ficaram apenas a incompreensão e o medo, estampados para sempre em seu rosto carregado de maldade.
Quando Sebastian despertou, seu mundo parecia mais nítido. Ergueu à vista e olhou com atenção para o jovem que havia salvo sua vida se afastando lentamente para longe. Tentou falar alguma coisa, mas a voz não saiu. Aquela cama era macia como uma nuvem, há muito tempo não se sentia tão bem. Voltou a dormir.
TEMA: Vampiros.