Paulo e Marcela passaram pelo mesmo ponto de ônibus, na mesma avenida… em horários diferentes. E acordaram hoje, sexta-feira em lugares diferentes… Os dois gritaram escandalosamente, desesperadamente na cama. Os dois acordaram gritando em seus apartamentos.
Marcela tinha uma NOVA PERNA saindo da pá de suas costas… A perna tinha o mesmo tamanho das outras com uma pequena diferença (que Marcela nem quis olhar): Seus pés e dedos novos, não tendenciavam para lado algum, mas… para frente. Eram dois dedões de cada lado, num pé reto, de uma perna que apontava exatamente para a linha reta. Ela gritava e rolava prum lado e pro outro da cama tentando alcançar o membro novo com a mão…Sua perna nova – como um ser recém-nascido – chutava e chutava freneticamente, desesperada por ainda não saber como andar… como pisar e ficar em pé… como seguir em frente.
Paulo (ainda muito sonado) sentiu coisas que penicavam seu braço. Coçavam um pouco… Parecia ser, a princípio: vários furúnculos que resolveram desabrochar e coçar ao mesmo tempo. Involuntariamente levou a mão querendo coçar um deles. Estava com a unha grande e passou com força no lugar. Foi quando despertou de vez, sentindo uma dor aguda e terrível. Jamais sentida antes. E quando viu o que era começou a gritar ainda mais, sem parar. Paulo tinha quatro NOVOS OLHOS que piscavam e piscavam… observando, chorando, lacrimejando… Dois deles pareciam ainda não ter habilidade para ficarem abertos por muito tempo. Já os outros, abriam por um tempo e fechavam rapidamente em seguida. Todas as vezes que os olhos conseguiam abrir… Paulo podia enxergar com eles. Ele podia ver o quarto de baixo pra cima em ângulos novos… assim como podia SE VER gritando pelos olhos de seu braço. Olhava o braço com repulsa, completamente perplexo e enojado. Porém, seus olhos novos também olhavam-no de cima. Assustados e sem muito compreender a respeito daquelas cores e formatos.
(continua)