Beijo de fogo - BVIW
Tema: Pensando na estrada
Durante o dia, com o sol nascendo ou no meio do céu, a estrada era bonita e insuspeita. No mês de julho, o Cipó de São João descia das árvores que margeavam a estrada e fazia um tapete alaranjado no acostamento. Os barrancos vermelhos davam sinal de que a terra era boa lá pros lados de João Topázio. Alguns trechos de sebe ou de eucaliptos faziam-na fresca quando os meses eram de calor forte. Mas corria um boato entre as gentes do lugar que à noite, principalmente de lua cheia, na porteira velha da Fazenda Sucupira, um assombração fora visto várias vezes. Parecia uma mulher de bom corpo, cabelos compridos, sempre de roupas brancas e esvoaçantes. O povo da região evitava de trafegar à noite. Dizem que ela acenava para os carros pararem e quando chegava perto do motorista, dava-lhes um beijo de fogo. Isso piorava muito quando o motorista usava barba, sendo maiores as queimaduras. Os caminhoneiros eram avisados pelas vítimas, mas alguns incrédulos gostavam de abusar da sorte. Tião do Asfalto, homem grande, valente e barbudo, se aventurou a parar e mexer com o Assombração. Ao tentar laçá-la pela cintura, seu braço furou as roupas esvoaçantes dela. Então quis correr, mas era tarde demais! Ela agarrou sua barba grande e lhe deu o beijo de fogo. Tião foi encontrado pela manhã, desacordado e todo chamuscado. Ele ficou em choque vários dias enquanto permaneceu no Hospital Saúde. E nunca quis tocar no assunto do Assombração da porteira. Há pessoas que precisam experimentar o mal para acreditarem que o bem esteve em suas mãos.