O ABISMO

Ele olhava constantemente para o Abismo. E o Abismo olhava para ele.

Ele via algumas pessoas lutando para sair de dentro daquele imenso vazio, via também pessoas entrando nele. Pessoas sendo seduzidas por sua voz, rouca e baixa, carregada de um grande terror hipnótico.

Era difícil recusar a promessa do Abismo, era difícil não aceitar a proposta de se entregar para o nada e perder-se no anonimato. As almas cansadas de carregar profundas dores se jogavam nele. Caiam, caiam e nunca paravam de cair. Algumas encontravam alguma coisa na qual pudessem se agarrar, evitar ir mais fundo.

O homem continuava a flertar com a promessa de não sentir mais culpa, sofrimento; na verdade, não sentir mais nada. A promessa de deixar de ser, cair na profundidade da inexistência.

Maldito Abismo! Continuava a encarar sua presa. Com sua voz dizia:

— Sou a resposta. Feche os olhos e me deixe te guardar em minhas entranhas.

Ele ouvia a voz, sentia arrepios pelo corpo. O Abismo continuava a sorrir, seu sorriso era tenebroso, capaz de cortar a pele.

Ele não queria ser como os pobres infelizes que se atiravam nas trevas do Abismo, mas a voz o tentava. Ele queria recuar, mas era atraído.

O Abismo sugava as esperanças, perto dele não havia manhãs de primavera, brisa quente do verão, dias de alegrias genuínas; perto dele havia apenas a solidão, o buraco gigantesco na alma. As pessoas continuavam sendo devoradas, enquanto outras tentavam ser regurgitadas.

E o Abismo continuava a sussurrar.

Felipe Pereira dos Santos
Enviado por Felipe Pereira dos Santos em 10/06/2022
Código do texto: T7534734
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