Tarde Demais
O gosto de sangue me deixa zonza, eu estou sozinha, ninguém poderá me ajudar agora é... tarde demais.
Tudo começou com um convite misterioso, nesse convite havia um ingresso de uma dessas bandas de momento e, não, eu não iria, mas na última hora resolvi aceitar o ingresso anônimo, seguindo o endereço presente no convite cheguei a uma estrada deserta sem me dar conta conscientemente.
Nessa estrada não havia nada, nada além de árvores e terra, fiquei olhando em minha volta com certo receio, conferi o convite, não errei o caminho... então, onde eu estava?
Um barulho me fez girar as chaves do carro e apertar o acelerador, porém nada aconteceu, algo estava errado, cada centímetro meu gritava isso.
Desci do carro, a lua e os faróis que ainda funcionavam era a única claridade...
O que está acontecendo? Eu me questionava. Chequei o aparelho celular... sem área.
Parada no meio da estrada, sem ninguém visível por perto... Sim, eu tinha certeza que havia alguém me observando a cada passo, cada segundo, como num jogo, num filme de suspense com uma dose exagerada de terror. De repente, um homem saltou do meio do arvoredo, eu me assustei, mas ele me avisou para correr ou eu não sobreviveria, ele sangrava, sangrava muito. Eu não tive coragem de correr e deixá-lo ali e, também, para onde eu correria? Não havia nada, nada além de árvores e terra... caminhei em sua direção, mas algo o alcançou antes de mim...
Corri pela estradinha de terra deserta sem um destino certo, algo me perseguia eu sabia, mas apesar do medo tentava me manter calma, falhando miseravelmente a cada centímetro que percorria desesperadamente.
Me afastei do carro, já não havia mais a luz dos faróis...eu mal enxergava... foi então que alguma coisa me atingiu com força suficiente para minhas pernas cederem e meus sentidos atrasarem, eu cai, com os olhos fechados eu ouvi passos pesados e velozes em minha direção, abri meus olhos, o susto foi inevitável, apesar da escuridão pude ver que um rosto conhecido me encarava, seu olhar frio encontrava o meu de suplicação, tentei dizer algo, mas as únicas palavras que saltaram de meus lábios foram um trêmulo e angustiante ”Por que?”
Ele me olhou friamente e respondeu “Não tenho nada contra você, isso para mim é apenas um jogo de vida ou morte, um de nós dois hoje morrerá, posso te garantir que não serei eu.”
Eu podia sentir o ódio em seu olhar.
Quem era ele? Eu direi... ele era o garoto que todos ignoravam, que todos desrespeitavam e difamavam, o garoto tristonho, sozinho... Mas porque eu? O que teria feito à ele? Nem o cumprimentava, mal lembrava de sua existência...
“Não tenha tanto medo, vai doer apenas um pouco” Ele disse com um sorriso desdenhoso que lentamente tomava sua face, senti meu estômago revirar na mesma hora.
“Vai me matar, não vai?” Perguntei por impulso, o medo me dominava, mas eu já sabia a resposta.
“O que você acha?” Disse ele friamente.
“Posso ao menos saber o por que?” Minha voz saiu tremula, mais do que eu esperava...
“Outra vez? Preste atenção! Agora será a última explicação que te darei, isso é um jogo, já te expliquei as regras, como todo jogo há um vencedor e um perdedor, que será você... O que eu ganho com isso? Hum, vejamos... serei breve, você morre e eu ganho paz.” Os olhos dele estreitaram-se.
“Não acho que minha morte te trará paz.” Argumentei na utópica esperança de fazê-lo desistir de tudo.
“Você não está aqui para achar nada, mas te digo com plena certeza, minha paz depende de sua morte.” Ele desviou o olhar para uma pedra próxima.
“Não estou entendendo. O que eu te fiz?” Eu tinha que tentar.
“Escute e cale-se, eu não terminei...” Havia euforia em sua voz, eu me calei e ele voltou a dizer...
“Eu não consigo viver sabendo que você respira, sabendo que seu coração bate e sorrisos brotam em seus lábios frequentemente. Isso me incomoda porque sei que você sorri, respira e vive por outras pessoas, nenhuma delas sou eu... e justo eu, aquele que mais te protegeu, mas isso acaba hoje, te matando não terei mais o porque de te amar.”
As palavras dele pareciam vidros em minha garganta, não consegui dizer nada, absolutamente nada.
Senti algo rasgando minha pele, uma faca sedenta que agora, neste momento, jaz em meu corpo sem proteção... O gosto do sangue me deixa zonza, ele me olha nos olhos, como se esperasse um gesto, alguma palavra de ódio para se vangloriar.
Reunindo forças, encarei seus olhos, mas não consegui dizer nada além de "Me desculpa.”
Essas palavras não saíram tão altas como eu gostaria, mas sei que chegou aos ouvidos dele, uma lágrima rola por minha face.
Ele chora, como uma criança perdida, não sei se é por arrependimento, ele passa suas mãos em seus cabelos castanhos com nervosismo e me diz com os olhos cheios de lágrimas...
“Agora é Tarde Demais.”