Se estiver com medo não peça ajuda a qualquer um...
*Adriana Ribeiro
Zé de Finha, nascido e criado na roça, já era um homem feito quando arranjou uma namorada na cidade. Para onde ia todas as tardes de domingo a fim de cortejar a futura esposa.
Alzira, moça recatada e bem cuidada pela mãe viúva e uma tia materna, só recebia o namorado acompanhada pelas anciãs.
A casa onde as três moravam ficava na Rua da Redenção um pouco depois do cemitério, por onde Zé de Finha era obrigado a passar sempre que vinha visitá-la, apesar do medo terrível que tinha daquele lugar.
Por causa desse medo, costumava chegar à casa da noiva cedo da tarde e antes de escurecer voltava pra o povoado onde morava.
Ninguém sabia o motivo mas a rotina semanal começou a chamar a atenção das mulheres mais velhas da casa que começaram a especular.
Quando chegou o domingo, a tia começou a questionar a moça:
__ Elzinha! Era assim que a tia a chamava. __ Por que Zé sempre vai embora tão cedo?
__ Sei não Tia Sinhá! Respondeu a moça sem saber a verdadeira razão daquela conversa.
E a velha Senhora continuou:
__ Você já reparou que ele sempre se despede antes do escurecer?
__ E não Tia! E o que tem isso?
Dona Esmeralda, a mãe da noiva, entrou na conversa dizendo:
__ Hoje é dia de Reis, vou convidar o Zé para cear conosco. O pobre homem todos os domingos vai embora com fome.
Elzira, ainda inocente respondeu:
__ Sei não mãe! Zé é todo acanhado! Acredito que ele não vai aceitar ficar pra comer.
A mãe da jovem continuou:
__ Que nada menina! Você é que não insiste pra ele ficar. O coitado não vai se oferecer para jantar.
Como de costume, de tarde cedo o noivo chegou. Conversa vai e conversa vem, a sogra fez o convite:
__ Zé! Hoje você vai ficar para cear com a gente. E vou logo avisando que não vou aceitar recusa.
A irmã também reforçou:
__ É meu filho, fique! Esmeralda fez um guisado de porco que tá de comer rezando.
A noiva então entrou na conversa:
__ Fique Zé? Se você recusar mamãe não vai perdoar a desfeita. Ela passou o dia todo fazendo a Ceia de Reis.
Zé lembrou do cemitério. O medo fez sua fisionomia mudar de cor, mas para sua sorte as mulheres não deram fé.
Pensou no guisado de porco, mirou os três rostos ansiosos das mulheres. Tornou a lembrar-se do cemitério... Imaginou o guisado novamente...
Mas, por fim, resignou-se a aceitar o convite. Daria um jeito na hora de ir embora.
E foi assim que Zé de Finha jantou pela primeira vez na casa da noiva.
Lá pelas tantas horas da noite, o assunto já estava estagnado e as mulheres deram para cochilar sentadas. Então ele aproveitou para se despedir.
Saiu na calçada e olhou a estrada. Não havia ninguém na rua indo naquela direção, apenas um velho guarda caminhava tranquilamente em sentido contrário.
Resolveu pedir ajuda e para disfarçar sua vergonha inventou uma estória.
__ Boa noite Seu guarda! Não quero atrapalhar a sua viagem mas estou precisando de ajuda. Fui ameaçado de morte ali no bar e o indivíduo sabendo que eu moro para as bandas lá de cima, disse que ia me esperar na frente do cemitério. O Senhor poderia me acompanhar até passar o perigo?
O velho guarda não se fez de rogado. Virou o corpo e seguiu em silêncio ao lado do rapaz até passar uns dez metros do muro do Campo Santo.
Até ali sem dizer uma palavra...
Quando o guarda parou o rapaz resolveu confessar o real motivo do pedido de ajuda e disse:
__ Senhor! Por causa da vossa gentileza não posso deixar de dizer-lhes a verdade. Eu não fui ameaçado de morte como lhe falei. De fato o que acontece é que eu estou com 32 anos e nunca passei à noite na frente do cemitério, desde que era um rapazola e meu cavalo empacou ali em frente, corcoveou e disparou como se estivesse assombrado. E se eu não fosse acostumado a montar teria caído estatalado ali mesmo. O estranho é que não havia viva alma no lugar, nem homem nem bicho.
E como o Velho guarda continuasse calado continuou:
__ Eu sei que isso é uma vergonha, e o senhor vai achar que estou mentindo de novo, mas confesso que desde então tenho um enorme pavor de passar por ali.
O homem nada respondeu.
Mas Zé de finha insistiu:
__ Sem mal lhe pergunto: O senhor não tem medo não?
O velho guarda já havia lhe dado às costas e começava a caminhar de volta, mas dessa vez respondeu:
__ No tempo que eu era vivo tinha medo sim!
Adriribeiro/@adri.poesias