MINHA PAZ
Até hoje me pergunto porque fiquei assim, embora eu saiba mais ou menos a resposta.
Você se isola por várias coisas: a perda de alguém, um trauma, o fim de um relacionamento, uma mudança de bairro até.
No meu caso não foi nada disso, eu só me enchi das pessoas. Peguei ranço delas, como costumam dizer por aí.
As vozes humanas, todas elas, começaram a me dar náuseas, e por isso fui pra longe delas, pro meio do mato.
Vendi minha casa, juntei a grana com umas economias há muito guardadas e consegui comprar o sítio onde moro bem afastado de tudo, como sempre sonhei.
Meu vizinho mais próximo vive há dois quilômetros daqui, e felizmente não casei e nem preciso de empregados pra me ajudar nas tarefas.
Mas de um mês pra cá resolveram me importunar, e isso só cresce.
Primeiro o cara dos Correios, que mesmo sem nenhuma correspondência pra me entregar toda hora aparece do nada e vem puxar assunto.
Depois a moça da Regional da Prefeitura que veio inspecionar o poste de luz, e agora quase todo dia bate na minha porta querendo me cobrar isso e mais aquilo...
Até meu irmão, que ficou anos sem falar comigo e depois veio pedir dinheiro emprestado não sai mais do quartinho de hóspedes faz uma semana.
Meu velho cão Fila, a única companhia que gosto, nem late mais pra essa galera como fazia antes, parece que se acostumou.
Mas eu não, nunca vou me acostumar com esse povo tagarelando na minha orelha.
Tanto que às vezes penso: será que vou ter que descer o machado, esquartejar e enterrar todos eles na mata de novo?
Será que vai ser essa a solução mesmo?
Porque sinceramente não tô aguentando mais, de verdade.