Ragana
Aninha tem oito anos. Deitada no escuro de seu quarto naquela noite chuvosa ela quer gritar, mas não tem coragem. Sente o xixi escorrendo e encharcando o lençol.
Deitada em sua cama no escuro, com o cobertor felpudo puxado até o queixo, ela sente a presença da coisa acocorada sobre ela. Aninha sente o hálito de podridão e a respiração pesada e ansiosa. Apenas quando uma garra afiada com navalha toca seu rosto ela grita: "Paiii".
No quarto ao lado, Anselmo levanta-se de um pulo, jogando o edredom para o chão. Atravessa o quarto escuro, abre a porta. Num segundo está segurando a maçaneta da porta do quarto da sua única filha. Ele entra apressado e acende a luz. "Aninha" chama ele desesperado. Procura embaixo da cama, no guarda roupa, verifica a janela que está fechada. Lá fora um relâmpago ilumina a noite chuvosa. Ele sai apressado, dece a escada para a sala e verifica todo o térreo. E constata que está tudo fechado. Cada canto da casa, dentro dos armários, no banheiro, atrás das poltronas, Aninha se foi. Anselmo chama pela filha, mas só escuta o tic tac do relógio de parede e a chuva lá fora. Então deixa-se cair sentado no chão da sala, uma lágrima solitária a escorrer pela face