O lobisomem e o barbeiro
No final do ano de 1960 turistas vindos do interior do Estado chegavam para veranear em Iguape; todos os hotéis, pensões, campings e quartos em casas de famílias estavam lotados. Alguns barcos faziam a travessia para a Ilha Comprida, um bairro quase deserto da Princesa do Litoral Sul.
Naquela sexta-feira a Praça da Matriz fervia; bares, lanchonetes, carrinho de pipoca, músicos no coreto central, footing em volta da praça, paqueras, piscadelas, caras e bocas, sorrisos marotos...
Quase 21 horas e algumas lojas permaneciam abertas, estavam aproveitando a presença de tantos visitantes para faturarem com os presentes natalinos e de Ano Novo... Até mesmo a “Barbearia Barbicha Caiçara” permanecia em plena atividade...
Zé Barbicha, sócio da barbearia, estava para encerrar o expediente quando um jovem serracimano entrou no seu salão;
o barbeiro baixou metade da porta informando ao moço que ele seria o último freguês da noite.
Seu Zé entre mil perguntas caprichava no corte, o rapaz aparentava ser muito tímido, mal balbuciava algumas palavras, e Seu Zé Barbicha estranhou um fato; aparava a barba do moço de um lado do rosto e quando partia para cortar a do outro lado, a barba que já havia raspado estava novamente crescida...
O Barbeiro estava admirado e não encontrava uma explicação para o fenômeno, e perguntou ao cliente; -“Sempre acontece isso quando cortam a sua barba?”
- “Não!”, respondeu o rapaz, “somente em noite de lua cheia é que acontece isso...”
- “Acredito que não temos uma lua cheia na noite de hoje, vou reabrir a porta para confirmar...”
Seu Zé Barbicha escancarou a porta, a luz dourada de uma imensa lua cheia invadiu o recinto; o barbeiro fitou apavorado o cliente sentado na cadeira, o rapaz sumira e em seu lugar estava um grande lobo peludo, e de olhos vermelhos, e aparentemente lendo o jornal do dia... O barbeiro desmaiou.
Seu Zé Barbicha nunca mais atendeu ninguém após as dezoito horas, e em noites de lua cheia nem sai de casa; costuma contar esse causo para alguns fregueses, na verdade para poucos clientes, e todos acham que é apenas uma história de barbeiro para torrar a paciência alheia enquanto apara a barba de mais um turista desconhecido.
Gastão Ferreira/2021