Quem vai ficar com a p*rra do VHS?! - (horror/terror/suspense/mistério/humor negro)

Sinopse: Baseado no filme "O chamado". Quem se lembra da época das fitas VHS? E das locadoras abarrotadas destas fitas? Quando aos finais de semana, o melhor programa pra se fazer em família era desfrutar de um rango especial, seguido pelo melhor catálogo de terror recém-saído das telas do cinema? Pois é, tio Ricardo, um eterno zombador, está com seus dias contados. Acostumado a tirar sarro da cara de Mateus, o sobrinho, e de Flávio, o cunhado, certa noite depara-se com um filme que lhe ceifa o sono... Sorte de pai e filho, que não perderão a rica oportunidade de dar-lhe o merecido troco.

Quem vai ficar com a p*rra do VHS?!

Sempre fui fã de filme de terror, e depois que me casei, o gosto pelo gênero se estendeu para toda a família. Lembro que antigamente, um dos nossos programas favoritos era a organização das sessões de cinema relacionado aos filmes que assistiríamos no final de semana. Para as sextas-feiras, o cronograma era simples; pegar meu filho na escola, comprar “aquele” franguinho assado com Coca-Cola e locar uns VHS de terror na melhor locadora do bairro. Filme de mistério ou suspense desde que tenha uma pegada envolvente, segura a gente por bastante tempo na poltroninha da sala. Às vezes, a estória é fraca, mesmo assim é sempre certo o arrepio na espinha, a tensão à flor da pele, e muita gritaria nas reviravoltas, seja do protagonista, seja, do monstro à espreita, ou daquele idiota que faz "barulho" em momento inapropriado.

Dentre vários títulos disponíveis na locadora, tem sempre um que se destaca mais que os outros. Um dos filmes que marcaram minha esposa Lívia na adolescência foi "O exorcista". Após a sessão, ela e seus irmãos ficaram tão perturbados que foi muito difícil pegar no sono, mesmo após tê-lo assistido semanas atrás. Conforme eles me relataram, de madrugada era comum de se ouvir: sons de passos palmilhando pela casa, gemido ou choro de bebê na madrugada, e a impressão angustiosa de estar sendo observado por alguém na penumbra do quarto. Essa é, com toda certeza, a melhor parte de uma obra prima: “hehehe!” Afinal, a estória não acaba com o subir dos créditos na tela escura da televisão. Se o filme for bom, bom mesmo, ele continua nos aterrorizado dias, semanas e até meses após; a todo instante despertando medo em nós, só por que trouxemos à baila, cenas que impregnaram o nosso inconsciente.

Lembro que certa vez, um filme na prateleira da sessão de horror da locadora, chamou muito a atenção do meu cunhado já bem acostumado a assistir filmes com este tipo de conteúdo. Na parte frontal da VHS, estava ilustrada uma garotinha horripilante saindo literalmente da tela da televisão. A figura monstruosa se arrastava com os pés avançando as mãos, derramando saliva esbranquiçada enquanto arregaçava o piso de madeira com suas garras atoladas no chão. Vestia-se com um simples vestido branco puído, mantendo os longos cabelos ocultando parte do seu rosto deformado. Expressava um olhar mal, vibrando energias carregadas de ódios extremos.

— Flávio, — disse Ricardinho, meu cunhado, de pé ao meu lado — eu achei “aquele” filme de terror que a galera está comentando.

— Que filme é esse? — perguntei.

Depois disso, Ricardinho leu a sinopse de horror para mim, mas sem antes me provocar — Topa ou não topa?!

— Será que dá pra assistir em família? — Perguntei. Depois olhei para Mateus — Temos que ver a classificação desse filme, se é adequado para meu filho...

— Vai amarelar Flávio?! — Ricardinho exclamou. Depois ele ficou me provocando, engenhando as mãos sobre os olhos em forma de choro — Achei que minha irmã tinha casado com um cara macho, tchê!

— Não é nada disso meu velho! — Falei firme — O Mateus só tem sete anos! Esqueceu-se?!

— Agora vai usar o meu sobrinho?! — ele disse tentando ironicamente me ridicularizar. Mas como sua provocação não afetou nem o meu semblante, ele continuou insistindo nas provocações — Não precisa ficar com medo não meu chapa, pois “tio Ricardinho” vai estar na “parada”. Durmo na sala pra variar.

Depois de ele me ouvir resmungar: “que cara sacana!”, ele abraçou meu filho e estampou um olhar cintilante.

— Prometo que eu durmo lá — Ricardinho disse — Não precisa fiar borrando nas calças.

Estando irritado, foi só depois de um tempo que assenti dizendo “ok!” com movimentos verticais de cabeça. Afinal, com tanta chateação, acabei concordando com ele que, propondo-se a pagar a locação da fita VHS, e, contrário aos costumes, se propôs também a devolvê-la no dia seguinte.

Ao ouvir as gaitadas exageradas do tio, logo Mateus se aproximou.

— Papai, — ele perguntou — o filme que o tio Ricardinho locou é de terror?!

Eu já ia dizendo: “olha meu filho...”, mas ele logo me interrompeu pra me alertar:

— E se eu ficar com medo papai?! O senhor promete que vai me proteger?!

Depois que vi sua carinha receosa, fiquei com dó, e só pude assegurá-lo que estava tudo bem. Disse: “não se preocupe, filho, o papai vai te proteger!”. Ainda assim, percebi que ele não ficou de todo convencido, de forma que passou a vasculhar com seus olhinhos amedrontados, a sessão empoeirada de desenhos animados, no fundo da locadora.

Depois disto, eu o confortei; umas duas ou três vezes a mais, mas já arrependido de ter concordado com Ricardinho.

Foi só depois de um tempo vasculhando, que Mateus retornou silencioso pra perto de mim.

— Olha meu filho, — eu disse em uma tentativa de animá-lo — se o filme que o tio Ricardinho locou for muito pesado, vamos combinar que você vai dormir com a mamãe, certo?

— Certo papai! — Mateus respondeu. Depois me abraçou e disse com jeitinho formal: — Não podemos fazer desfeita com ele, né?! Ele tá pagando...

— É — respondi. Mas depois entendi que meu filho carregava uma carta na manga.

— Outra coisa papai… — Mateus falou com cuidado, e em seguida, amendoando o semblante, estendeu sua mãozinha pequena pra mim — Promete que amanhã de manhã, o senhor assiste esse filme “aqui”, comigo?!

“Vida de Inseto” era o nome do filme que ele segurava. Aliás, já assistido pelo menos umas cinco vezes consecutivas em família.

— Ok! — eu respondi com ternura e ele logo me presentou com um beijo singelo na bochecha.

***

A sexta-feira estava prometendo. Eu, a Lívia e o Mateus, tínhamos terminado de banhar, quando o velho motor da moto YBR roncou três vezes rente ao portão de casa. Ricardinho tinha chegado.

— E aí cunhado?! — como de costume, ele foi provocando, entrando com ar triunfal — Você e o Mateus já colocaram a fraldinha?!

— Já, tio, — Mateus falou entrando na brincadeira — eu e o meu pai já colocamos a fraldinha. Em seguida, meu filho olhou pra mim e falou baixinho — Esquenta não papai, tio Ricardinho tá se achando...

Sobre a mesa do jantar exuberava: arroz casado, feijão tropeiro, salada de alface com tomate, maionese com verduras, e o famosíssimo franguinho assado com Coca-Cola bem gelada.

— Ah, que delícia! — disse Ricardo passando a mão na barriga — se cozinha bem, hein, mana!

Após jantarmos, Lívia ficou organizando a cozinha. Eu, o Mateus e o Ricardinho, fomos organizar o filme na sala. Mateus ia contando os passinhos para não derrubar o balde cheio de pipoca.

— Bora assistir o filme seus medrosos?! — Provocou Ricardinho mais uma vez, enfiando a fita VHS com a mão ensebada de gordura.

Continua...

*** Está gostando?! Então, você pode concluir o final deste conto, baixando o e-book completo no aplicativo Google Play do seu celular. Não se esqueça de ajudar o autor, curtindo e compartilhando este trabalho nas redes sociais ***

Gláucio Imada Tamura
Enviado por Gláucio Imada Tamura em 15/08/2021
Reeditado em 18/08/2021
Código do texto: T7321310
Classificação de conteúdo: seguro