Namorada imaginária
“Se as crianças inventam amigos imaginários, por que ele não poderia criar uma namorada imaginária?”. Foi o que pensou Ronaldo. Um jovem triste, solitário, sem amigos, que sonhava em conhecer uma menina que lhe desse uma chance. Queria construir um relacionamento, contudo os dias, meses e anos passavam, e isso se mostrava cada vez mais difícil. Formou-se um tabu em sua vida.
Foi quando lhe veio a ideia de criar uma namorada. Ela teria todas as características físicas e psicológicas que ele admirava nas mulheres. Vale dizer que Ronaldo não era bonito, segundo os padrões valorizados pela sociedade, mas deseja mulheres que o eram. Uma grande contradição sobre a qual ele não refletia. Fantasiou uma garota de estatura mediana, loira, busto avantajado, traços faciais delicados, com nariz pequeno e fino. Se real, era uma menina que atrairia olhares. Deu-lhe o nome de Michele.
A partir de então, o jovem começou a agir como se estivesse namorando. Ficou mais solto, se expressava mais. Até nas aulas da faculdade os colegas e professores notaram uma melhora na sua postura, que embora sempre tenha sido um excelente aluno, poucas vezes participava. Passou a andar de peito estufado, cabeça erguida, cheio de confiança. Não sentia-se mais um fracassado.
A namorada imaginária estava sempre com ele, os diálogos, contudo, aconteciam em sua cabeça. Sabia que não seria entendido se começasse a falar com alguém que apenas ele via. O internariam.
Ronaldo verbalizava os seus pensamentos apenas quando tinha certeza de que estava só. Um dia ele se distraiu enquanto estava no refeitório da faculdade. Acreditava estar na companhia apenas da sua namorada imaginária. Enquanto “dialogava” com ela, três conhecidos o observavam com risadas silenciosas. Quando Ronaldo percebeu a presença indesejada, já era tarde. Havia sido visto.
Desesperou-se e procurou sair do refeitório e da faculdade, mas foi perseguido pelos três, que queriam rir às suas custas, chamando-o de louco. Tentou desvencilhar-se das piadas e até empurrões. Tudo em vão.
Naquele dia em especial a faculdade estava quase vazia. Ronaldo começou a correr, foi alcançado e derrubado no chão pelos agressores, com suas piadas e risadas grosseiras. Informaram que iriam contar para todos, publicar na internet. Estavam com celulares nas mãos fazendo fotos e gravando vídeos do jovem caído.
Foi quando um golpe atingiu o peito de Fábio, um dos escarnecedores. Ele voou para trás uns três metros, até atingir a parede, bater violentamente a cabeça e cair sem vida. Os outros dois olharam o companheiro. Não entendiam nada. Flávio ia dizer algo, quando sentiu mãos ao redor do seu pescoço e queixo, agarrando-o por trás. Uma rápida torção quebrou-lhe o pescoço sem que ele entende-se que a sua via tinha se esvaído.
Ao ver os dois amigos caídos e aparentemente mortos, Carlos, o terceiro dentre os zombadores, sentiu um arrepio e tentou correr para longe, mas o seu pescoço também foi agarrado por duas mãos que pareciam feitas de ferro. Este foi comprimido aos poucos enquanto os olhos dele queriam saltar das orbitas, esperneou quando foi erguido do chão. Não dava para gritar. De repente, o ar lhe faltou por completo e ele caiu sem vida.
A tudo Ronaldo assistiu do chão, sem se mexer. Conseguia ver quem quem havia feito tudo. Michele se aproximou dele e lhe estendeu a mão. Ele levantou e os dois saíram dali. A namorava imaginária se materializou. Continuaria invisível para os demais, contudo seria mais do que um par romântico, seria uma protetora. Os dois riam enquanto corriam.
Ao imaginar, sonhar, fantasiar, pedir, Ronaldo não sabia que “alguém” havia notado o seu sofrimento e lhe havia atendido, concedendo-o bem mais do que ele imaginava e pedira.