AO APAGAR DA LÂMPADA - CLTS 15

De acordo com as crenças pré-islâmicas os Gênios foram criados de ar e fogo, 2.000 anos antes de Adão.

Vistos como eternos e imortais, eles eram criaturas extremamente fortes e astuciosas que possuíam grande destaque no paraíso (logo abaixo dos anjos).

Os Gênios teriam sido incentivados por seu líder a recusarem fazer reverências a mais nova criação divina: o homem. Como punição, todos os gênios foram expulsos do paraíso.

Embora vivam em um mundo paralelo, eles podem ir e voltar a Terra livremente.

Gênios também poderiam se tornar invisíveis quando desejassem, e utilizavam esta habilidade para sua diversão.

Comumente responsabilizados por doenças e acidentes, eles punem humanos por ações que não julgassem corretas.

Também se dizia que os Gênios ajudam quando a humanidade precisa de ajuda, mas provavelmente apenas quando isso fosse conveniente aos seus interesses.

O próprio Maomé revelou que ao escutar as revelações do anjo Gabriel sobre os ensinamentos de Deus (que posteriormente seriam reunidos no Alcorão), inicialmente teve receio de ser algum Gênio brincando com ele.

De acordo com as crenças pré-islâmicas, se você encontrasse um Gênio, dificilmente esta seria uma boa experiência.

Após a revelação do Alcorão, a visão que se tem dos Gênios é então alterada.

Deus informa a Maomé que alguns Gênios são bons e outros são maus, pois possuem o mesmo livre arbítrio que os humanos. Assim como nós, se seguirem o Islamismo também poderão se salvar.

Também diz que Satã jamais foi um anjo… sendo na verdade um Gênio que foi expulso ao questionar a palavra divina.

Meu amigo John, me provoca todas as vezes por eu ter 15 anos e ainda ter medo do escuro, eu levo de boa porque ele não viveu o que eu vivi.

Numa noite, com 10 anos fingindo ser mais corajoso do que realmente sou, resolvi ficar sozinho em casa quando os meus pais saíram para uma reunião com os amigos. Na verdade, não queria ficar sozinho, mas encontro de adultos são sempre chatos. Teria de ficar sentado sem ao menos pode ver meus vídeos no celular. Meu pai sempre dizia ser uma grande falta de respeito usar aparelhos eletrônicos na mesa.

Resolvi então criar meu próprio jogo. Aquela casa grande que morávamos me deixava cheio de ideias para inventar guerras com inimigos imaginários. Fiz dos sofás meu quartel general, as peças de lego viraram granadas e as armas eram as de agua.

Comecei por fazer uma varredura em todos os locais e colocar meus bonecos para serem os responsáveis por cada área. Estava tudo tranquilo, apenas eu dava as ordens a meus soldados e fazia sons de explosões. A cozinha foi o local do meu primeiro ataque, depois os quartos e banheiros e por fim, a garagem.

Sobrara apenas o sótão, nunca tinha entrado lá. Sabia que ali eram guardadas as lembranças da família, bugigangas que não eram mais usadas e provavelmente insetos.

Eu era o general da tropa, tinha que ser corajoso em frente a meus soldados. Puxei a escada e vagarosamente subi apenas com uma lanterna nas mãos. Assim que levantei a portinhola, percebi o interruptor a meu lado direito. Acionei rapidamente e tudo ficou claro, muitas caixas e meus brinquedos antigos.

Peguei a primeira caixa que vi e abri, muitas fotos de quando eu ainda era um bebê. A outra caixa havia brinquedos que aproveitei para fazer mais granadas e espalhar por todos os lugares. Comecei a jogar para cima, imaginando os inimigos revidando o ataque.

Foi quando joguei uma bolinha de tênis e acertei a lâmpada. Apagou. Apenas o feixe de luz que vinha de baixo iluminava uma parte do sótão. Fui em direção a lanterna que estava perto da portinhola, esbarrei na trava e ela se fechou. Não havia como abrir por dentro, o puxador estava quebrado. Liguei a lanterna e procurei algo que pudesse forçar a fechadura, mas não consegui. Irritado, comecei a bater as mãos no chão esquecendo que estava com a lanterna em uma delas. Parou de funcionar. A escuridão era angustiante, e o silêncio também. Algo que mudei imediatamente, quando comecei a gritar e pedir ajuda. Nada.

Deitei chorando e apavorado, não sabia quanto tempo demoraria para meus pais voltarem para casa. Nesse momento comecei a ouvir vozes, sentir um peso em meus ombros e o medo só aumentava. Acabei adormecendo sendo acordado pela minha mãe que depois de perceber que eu não estava dormindo em meu quarto viu a escada em direção ao sótão e me achou.

Contei tudo a John, e ele claro, riu mais ainda. Estávamos sós em minha casa, lá fora a violenta tempestade com muito vento fazia ranger as madeiras de nossa nova casa ainda em manutenção. Jogávamos vídeo-game enquanto eu contava o que aconteceu.

Um estrondo no poste de luz fez com que pulássemos do sofá e a escuridão tomou conta do ambiente. Eu paralisei, fazendo com que John tentasse me acalmar. Mas não havia jeito. As lembranças estavam em minha cabeça e o pavor me fez começar a chorar. Ele disse que iria pegar velas ou lanternas. Perguntava onde poderiam estar, mas não conseguia responder.

- Vou ver se acho alguma coisa. – Disse.

Não queria que saísse dali, não queria ficar sozinho, mas não consegui dizer uma palavra sequer, tampouco consegui mover meus músculos. Alguma porta começou a bater, talvez fosse a da garagem que John teria entrado. Porém com muita força, consegui mover o pescoço e percebi a porta da frente aberta. Parecia estar travada. Os raios iluminavam momentaneamente fazendo com que eu enxergasse coisas sobrenaturais. Sabia que era fruto da minha imaginação, mas cada vez mais o pavor aumentava.

Minutos se passaram, para mim uma eternidade. John não voltou, talvez ainda estivesse procurando. Em mais uma clareada de um raio, vi uma silhueta passar correndo pela porta. John estava me abandonado, fugiu.

Consegui levantar e correr até a porta, ficar sozinho não era uma opção. O medo do escuro era maior do que a chuva ou os raios. Precisava arranjar coragem e segui-lo. Estava cansado de ser um medroso, mas nesse momento toda a vez que as luzes piscavam eu imaginava como seria bom se esse trauma fosse extinto de mim.

Gritei seu nome, ele não respondeu. Realmente fugiu. Me abandonou.

Ainda sem conseguir sair do lugar, questionava meu medo, lembrava das chacotas de John. Era o único que sabia que mesmo com 15 anos, ainda havia noites que dormia em meio a meus pais. Um dia ele disse que precisaria acabar com isso e que o escuro era simplesmente a falta de luz. Muito esperto!

Comecei a imaginar meus bonecos que fiz de soldados naquele fatídico dia, juntos em minha volta, rindo e tirando sarro de seu superior. Assim como fez John.

Corri. Passei pela porta sem sequer fechá-la. O bairro todo estava às escuras, precisava achar alguém, uma luz. Nada mais uma vez. Segui correndo sem rumo, tropeçando, caindo e levantando.

Todo o momento eu pensava em sair daquela condição, teria de perder o medo. Por que não liguei para os meus pais? Por que não fui a garagem para saber se era realmente John que passara correndo?

Meu coração parecia explodir a cada lembrança do sótão da antiga casa. As veias pulsavam forte com a lembrança da mudança depois que implorei aos meus pais para mudarem-se.

Vi a minha frente uma luz piscante, era minha salvação. Alguém estava lá. Não importava quem fosse, apenas fui na direção. Quanto mais perto, mais claro ficava e mais lentamente meu coração batia.

A poucos metros da luz, percebi que vinha de baixo de uma ponte. Aquele lugar normalmente escuro, parecia ser o único refúgio para o meu medo. Desci. Fui ao encontro do que parecia ser um abajur. Seguia piscando. Iria pegar e voltar para estrada. Peguei. Parecia ser uma lâmpada mágica. Como assim? Agora estava ficando louco? Mas se fosse verdade? Lembrei das histórias contadas pela minha mãe e a esfreguei na mesma hora. Se realmente fosse real, meu primeiro de três desejos seria perder o medo de escuro. Estaria curado.

Parecia delírio da minha cabeça, mas o Gênio saiu, seu rosto era parecido com o de John. Seria ele?

As palavras vieram rapidamente daquele ser.

- Meu amo, como estás?

Não consegui responder, meus ossos mais uma vez paralisavam.

- Acalme-se, estou aqui para conceder-te um pedido.

Por incrível que possa parecer, questionei.

- Apenas um?

Ele riu da minha pergunta e continuo:

- Sim! Apenas um. Sinto que tens um bem peculiar.

Até o Gênio sabia do meu medo.

- Sim, porém, se tenho apenas um, vou pensar melhor.

Ele esticou seu pescoço em minha direção, quase colando sua boca em minha orelha e disse:

- Pense bem! As vezes os traumas são para sempre.

Mas como desperdiçar um desejo com meu simples medo de escuro? Se eu fosse mais corajoso e poderoso, não teria mais medo de nada. Seria mais forte que John e quem riria agora seria eu.

- Já sei qual será meu desejo.

- Que bom. – Ele disse. – Qual será?

- Quero ser um gênio da lâmpada.

- Seu desejo é uma ordem.

O gênio estalou os dedos e imediatamente trocou de lugar comigo. Agora eu levitava e ele era eu. Ele disse que não aguentava mais ficar preso naquela escuridão e que eu havia o salvado.

Fiquei orgulhoso, porém em mais dois estalos de seus dedos, fui sugado pela velha lâmpada. Pelas minhas contas, já faz mais de duzentos anos que estou aqui. Não escuto vozes nem vejo vultos. Apenas a escuridão.

Lucas Baltra
Enviado por Lucas Baltra em 30/05/2021
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