Só os fortes sobrevivem
O vírus tinha devastado o mundo todo. Ninguém escapou. Lembro-me de que após o agravamento e colapso nos sistemas públicos e particulares de saúde e após a crise a crise nos governos, o caos se espalhava. Eu já tinha terminado meu banker e estocado suprimentos para mim e minha família por pelo menos quinze anos porque simplesmente tinha dinheiro. Só não podia fazer nada por Roberta.
Primeiro morreu minha mulher. Foi triste vê-la morrer intubada pois não conseguia respirar devido ao agravamento provocado pelo vírus em seu sistema respiratório. Depois morreram minhas duas filhas pequenas. Apenas eu continuava vivo. Grande bosta. Mas tudo o que eu queria saber era se Roberta estava bem. Então alguém apertou o botão do foda-se e em muitos lugares bombas de nêutron resolveram o problema apagando centenas de cidades do mapa.
Resolvemos dois problemas: o vírus e a pobreza no mundo. Dois coelhos numa cajadada só, como dizem.
Esperei por dez anos os efeitos radiológicos cessarem, isolado e sozinho dentro do meu banker. Eu não estava mais aguentando comer comida enlatada e jogar paciência. Mas quando eu finalmente deixei meu isolamento e respirei o ar puro depois de tanto tempo, eu só pensava numa coisa. Fui atrás dela. Procurei por todo canto. Finalmente encontrei.
Ela continuava linda como sempre fora.
– Pensei que nunca mais iria ver este seu sorriso lindo e tocar nestes cachos loiros – disse depois de um longo abraço. – Qual a primeira coisa que deseja fazer, minha querida?
Ela riu com aquelas covinhas.
– Vamos à um restaurante bem chique que é a última novidade do Novo Mundo, quero comer até minha barriga explodir. Comida de verdade, entende, meu amor?
Eu também desejava comer de verdade.
– E depois? – perguntei.
– Vamos tirar o atraso e relembrar os velhos tempos de amantes. E sua esposa, como está aquela songa monga?
– Morreu. Meus filhos também.
Roberta riu e fomos no tal restaurante comemorar nossa sobrevivência. Porque neste mundo só os fortes sobrevivem.