CRONOLOGIA DO TERROR.

Segunda feira. O céu nublado de Denver. A picape verde estacionou em frente a obra. A moça saltou do veículo, afundando as botas na lama. -"Stan. Ainda não consertou esse vazamento?" O homem colocou o capacete branco. O cigarro na boca. Uma mesa cheia de documentos e desenhos. Ele abriu uma lata de cerveja. -"Bom dia, senhora Sabrina. O piso da edícula está pronto. Quer uma cerveja? Hoje é aniversário do Peter, o marceneiro. O Steve foi comprar uma torneira nova. Esse vazamento está com os dias contados." A moça apontou o céu. -"Dispenso a cerveja. Vai chover e o telhado não está pronto. Não viu minhas mensagens? Pedi prioridade ao telhado, Stan!" O mestre de obras coçou o queixo. Sabrina falava ao celular. Alguns funcionários saíram de perto deles, prevendo nuvens negras. -"Robert não me passou nada, patroa. Ele está em São Francisco." A moça deu um murro na mesa. -"Incompetente! Está fora, vou chamar o Jeffrey! Pegue seu pessoal e vai embora daqui." O mestre de obras estava revoltado. -"Como assim, estou fora? Eu fiz os alicerces e as paredes. Estou no projeto dessa casa desde o início. Há um contrato." Sabrina sorriu e afundou o dedo indicador no peito de Stan. -"Sim mas também há prazos e você não os cumpriu." Stan terminou de tomar a cerveja. Amassou a lata com raiva. Olhou para Elliot, pedreiro e seu braço direito. O rapaz fez um gesto com a cabeça. Stan percebeu que não valia a pena brigar. -"Está certo. A senhora decide pois é quem dá as cartas. Não vai ficar assim." Sabrina engoliu em seco. Encarou Stan. -"Isso é uma ameaça?" Stan manteve a calma. -"A gente se vê nos tribunais. Dispensei outras obras, mais rentáveis, para colaborar com você. A obra está atrasada pois seu namorado alterou o projeto, querida. Não tenho culpa." Stan assoviou. -" Vamos pessoal!" Os dez funcionários começaram a se preparar pra deixar a obra. Uma van chegou. Um carro conversível atrás. Sabrina correu para a calçada. -"Jeffrey! Finalmente, meu caro." Stan olhou para eles com desdém. Os funcionários de Jeffrey entraram na casa. Stan recusou o cumprimento de Jeffrey. -"Assuma a obra, rapaz. Não use meu trator, virei buscá-lo amanhã." Stan se foi, após bater forte a porta de seu carro. Sabrina deu um suspiro. -"Não sei onde estava com a cabeça quando concordei com Robert. Contratar Stan foi um erro." Jeffrey olhava tudo. -"O piso da edícula está perfeito, ponto para Stan. Acho que você fez um inimigo." Sabrina estava mais calma. -"Consegue fazer o telhado até a quarta? Há previsão de chuva na quinta." Jeffrey olhou a planta da casa. -"Tenho oito homens apenas. Teremos que trabalhar a noite. Estenderemos uma lona sobre a casa, por segurança." Sabrina sorriu, agradecida. -"Eu sei que vai conseguir, Jeff." O rapaz colocou um capacete. -"Ao trabalho, Sabrina. Gutierrez, conserte aquele vazamento de água, por favor." Terça feira. Sabrina levou o filho Thomas a escola. O rapaz de quinze estava empolgado pois fora convocado para o banco de reservas do time de basquete do colégio. O trânsito caótico. Sabrina freou a picape. O farol vermelho. -"Os remédios da mamãe.... esqueci de comprar. Droga!" O carro atrás dela freou bruscamente. As buzinas. Os xingamentos. Um rapaz desceu do carro. -"A senhora tirou a carta pelos correios, idiota!?!? Quase bati o carro. Meu filho está assustado!" Sabrina abaixou o volume do rádio. O vidro fechado. -"Perdão, vou fazer o retorno." Ela gritou. O rapaz apontou um revólver para a moça. Sabrina estava tremendo. Uma mulher com uma criança de colo surgiu. Ela implorava para o rapaz sair dali. Uma sirene da polícia. -"Ramon. Não vai querer voltar pra cadeia. A polícia está vindo. Vamos embora." O rapaz concordou com a mulher. -"Marquei sua placa e vou atrás de você, dona." O sinal abriu. Sabrina avançou a toda velocidade em direção a farmácia. Ela olhava no retrovisor, temendo ser seguida por Ramon. O celular tocou. Era seu chefe, Osvald. -"Reunião as doze, não esqueça. Jon Bom Jovi quer ver uma mansão na cidade. Altos lucros a vista." A seguir, Sabrina ligou para Damiana. -"Oi, Dami. Pode levar o Thomas a escola para mim? Não, Robert não chegou. A obra está torrando meus miolos. Tenho reunião. Nosso passeio ao zoológico ficará para depois. Nosso curso noturno, não me esqueci. Vai pegar o Thomas, sabe onde escondo as chaves! Debaixo do vaso azul, na entrada. Não deixe ele comer donuts nem tomar refrigerante! Estou levando os remédios da mamãe. Um idiota no trânsito puxou um revólver. Tudo bem. Estou bem. Tchau." Quarta feira. Sabrina atirou o despertador na parede. Eram oito horas. Thomas estava acordado, amarrando o cadarço do tênis. -"Bom dia, Thomas. Está com o boné dos Lakers, bonito. Vai querer torradas com pasta de amendoim?" O garoto fez uma careta. -"Bom dia. A Consuelo já fez ovos com bacon para mim. Hoje é dia de fisioterapia e depois tenho natação, esqueceu?" Sabrina olhou para o calendário na porta do quarto. -"Mesmo? Hoje é quarta-feira! O telhado do Jeff." Ela correu para a janela. Algumas nuvens negras no céu. Thomas deu um suspiro. -"A excelentíssima senhora atarefada sem tempo pra mim." Sabrina não o escutou. Ela tomou um banho rapidinho. Um moletom. Tomou um copo de leite apenas. -"Estamos atrasados, Thomas. Consuelo, as compras. Os boletos, não esqueça." Disse pra empregada boliviana. Thomas entrou no carro. Sabrina atendeu o celular. Era Robert. O rapaz estava na cidade. -"Passe na obra, Robert. A gente se encontra lá. Até mais." O portão da garagem abriu. O carro passou por cima de algumas sacolas de lixo. Sabrina despejou um palavrão. Ela saiu do carro, furiosa. -"Quem espalhou meu lixo? Não creio nisso." Thomas tirou o fone de ouvido. Um homem negro estava ali perto. Sabrina apontou pra ele. -"Você, mexeu no meu lixo? Revirou meu lixo? Vai pegar ou não respondo por mim." O homem se aproximou. -"Surtou, madame? Está delirando." Sabrina notou que ele acenou para Thomas. Ela entrou no carro. -"Quero ver esse lixo recolhido quando retornar." O homem sorriu. -"Posso denunciar a dondóca por racismo. Estressada." Sabrina acelerou o carro. -"Não quero ver o mocinho conversando com aquele mendigo sem nome. Está proibido de falar com ele, Thomas!" O garoto não concordou. -"Ele é do bem. É primo do Scotty Pipen, sabia?!? Acho que não foi Louis que mexeu no lixo. O nome dele é Louis. Ele patrulha as ruas a noite, fazendo um bem a nós. Às vezes o caminhão da coleta espalha um pouco de lixo. Trocam de motorista, sei lá." Sabrina sentiu que fora injusta com o homem. Tempo depois, ela reencontrou Robert na obra. Jeff estava finalizando o telhado quando a chuva começou a cair. Quinta feira. Era meia noite quando Sabrina conseguiu fazer Thomas dormir. Ele brigava para sair do computador. Ficava horas jogando videogame. Uma buzina. Ela trocou de blusa e pegou a bolsa. Robert a esperava no carro. -"Enfim sós, Sabrina." Eles se beijaram. Em pouco tempo estavam na boate. -" Consuelo está de folga. Detesto deixar Thomas sozinho." Robert sorriu. Ele torcia as mãos. Ele estava bebendo mais que o habitual. Sabrina percebeu que uma garota, no balcão, não parava de olhar na direção da mesa deles. O casal foi para a pista de dança. Sabrina foi ao toalete. Robert fumava. Sabrina retornou. Notou que a tal moça do balcão não estava mais lá. -"Estou com saudades, Robert." O rapaz apagou o cigarro. Eles saíram do local. -" Que acha de passarmos no motel?" Robert parou. -"Que acha da gente acabar por aqui, Sabrina?" A moça estava confusa. -"Acabar? Quer dizer, terminar tudo?" Robert acendeu um cigarro. As mãos trêmulas. -"Você tem outra, é aquela do balcão? Viagens demoradas, não me liga e agora quer acabar, dar um tempo?" Robert quis abraçá-la. -" Aquela do balcão é minha prima. Veio comigo para estudar na cidade. Tempo. Você não tem tempo nem para o Thomas, Sabrina! Obras, cursos, reuniões, trabalho, trabalho." Sabrina ligou o celular. -"Vou chamar um táxi. Adeus, Robert." O rapaz ficou surpreso. Ficou encostado no carro. -"Ficarei aqui até seu táxi chegar. É por segurança. Estou me demitindo da obra. Procure outro arquiteto." Um silêncio tumular se fez. O táxi dela chegou, finalmente. Sabrina chegou a obra com olheiras e uma garrafa de café nas mãos. Caía uma chuva torrencial. Jeffrey estava fazendo um bom trabalho. Era estranho para ela não ter a companhia de Robert, embora a palavra final fosse sempre dela. Após o almoço, ela encontrou a amiga Damiana. A moça levaria Thomas a escola. Sabrina precisava dormir um pouco. Combinou uma noite de tacos com a empregada. Chamou Damiana, Jeffrey e alguns colegas do escritório. Thomas adorava tacos. Damiana levou os três filhos. Sabrina contou uma história para o filho, antes de dormir. Há tempos não fazia isso. Adormeceu na cama dele. Sexta-feira. Sabrina pensou muito nas palavras de Robert. Tinha sido dura com Stan. Não tinha sido uma semana boa. -"Você pegou o Thomas?" Sabrina sentiu uma tontura. -"Está louca, Damiana! Você o pegou!" Sabrina desligou o celular. Saiu a toda velocidade pelo escritório. -"Chefe, tenho que ir. Depois a gente conversa." O homem ficou imóvel, sem entender nada. Sabrina correu para o estacionamento. Em minutos estava em frente a escola de Thomas. Damiana estava sentada na calçada. -"Os alunos já se foram. Thomas não saiu!" Elas se abraçaram. Sabrina chorava. Ela fez várias ligações. Ninguém sabia do rapaz. -"Vamos para casa, talvez tenha ido a pé. Às vezes ele faz isso. Thomas deixou o celular no seu quarto." Disse a mãe desesperada. A noite caiu. Sabrina e Damiana foram até a delegacia. Os policiais iniciaram as buscas por Thomas. Sabrina e Damiana percorreram as ruas e praças. Sábado. Domingo. Nenhum sinal do rapaz. Os pais de Sabrina estavam com medo que algo de ruim acontecera ao neto. Os vizinhos ajudando nas buscas. A polícia investigando. Sabrina contou o que acontecera com Stan. Ele a ameaçou. Sabia onde ela morava. Era uma suspeita. Stan foi interrogado e liberado. Ele sorriu malicioso para Sabrina, na porta da delegacia. Ramon, o moço do trânsito. A polícia o achou de malas prontas para viajar. Ele confirmou sobre a briga de trânsito. -"Não faria mal a um garoto! Estou indo visitar minha madrecita doente." Disse ele ao inspetor. Ramon foi liberado. Sabrina se lembrou de Louis. Ele conhecia Thomas e frequentava as redondezas da casa. A polícia o encontrou num albergue. Estava com febre e doente. Louis era inocente. Sabrina pensou em Robert. Era um suspeito de ter sequestrado Thomas? Talvez. O rapaz foi levado a delegacia. Robert era inocente, há tempos não tinha contato com Thomas. As fotos do garoto nos postes e na mídia. As câmeras de segurança de um supermercado flagraram Thomas andando sozinho por uma avenida. Robert foi liberado e se prontificou a ajudar nas buscas. Sabrina estava abalada psicologicamente. Segunda feira. Jeffrey fez um café quente e forte para Sabrina. Damiana estava sentada no sofá, aguardando a amiga acordar. A viatura da polícia em frente a casa. -"O delegado vai reiniciar as buscas na mata. Vamos ter esperança!" Disse a mãe de Sabrina. Os dois policiais correram até a casa. -"Senhora, aquele homem. Ele disse que sabe onde o garoto." Sabrina viu Louis pela janela. Robert chegou naquele instante. Os policiais pediram reforços. Um helicóptero foi acionado. Sabrina se abraçou a Louis. -"Me perdoe por aquele dia. Traga meu filho de volta." Louis entrou no carro da polícia. Robert seguiu a viatura, levando Sabrina e Damiana. -" Ele falou de uma caverna, certa vez. Não é longe daqui. Thomas foi até aquela caverna com alguns colegas de escola. É um refúgio pra ele. Ele está lá, certamente." Uma estrada de terra. A mata fechada. Outros policiais chegaram com cães farejadores. Louis andava com dificuldade e isso comoveu a mãe do rapaz. Os megafones. Sabrina gritava pelo filho. Uma entrada estreita. Robert entrou com um policial. Thomas estava deitado numa pedra. Tinha tomado chuva. Estava fraco e com fome mas vivo. Robert o carregou nos braços. Sabrina estava eufórica. Aliviada. Ela abraçou o filho. Thomas, três dias depois, teve alta do hospital. Thomas passou a fazer tratamento com uma psicóloga. Sabrina o acompanhava. Apenas duas semanas depois foi que ele narrou os momentos de pavor na caverna. O medo. A solidão. As noites frias. A fome. -"Queria ficar só, com meus amigos imaginários. Eles me entendem!" Sabrina engoliu em seco. Ela deveria ser a melhor amiga do filho e não estava sendo. Ela não fazia muitas perguntas a ele. Sabia que o filho queria chamar a atenção dela. Sabrina teria que mudar e só queria agradecer e curtir cada momento com ele. Robert a abraçou. Ele não disse nada. Apenas sorriu e se foi. Sabrina reorganizou sua vida. Pediu demissão do escritório pois queria ter mais tempo para Thomas. Louis sempre visitava Thomas. Eles até jogavam basquete na quadra do bairro. Louis passou a dar aulas de basquete para as crianças do bairro, incentivado por Sabrina e Thomas. O rapaz estava diferente, mais positivo e sociável. -"Não creio. Isso é verdade?!! Jeffrey e Stan estão trabalhando juntos?" Disse ela ao telefone. Ela desligou e pegou o carro. Jeffrey e Stan estavam em frente a uma loja. A fachada coberta com uma ligação na preta. -"Olá, Sabrina. Bem vinda a nossa empresa do ramo de reformas." Disse Stan. -"Vamos ver a fachada agora. Será que ficou bonita?" Anunciou Jeffrey, fazendo suspense. Ele puxou a lona. JSS Empreendimentos e Reformas, no letreiro sobre a porta de vidro. Sabrina estava feliz com o sucesso dos amigos. -"São as iniciais dos sócios, Jeffrey, Stan e Sabrina. Que tal???" Sabrina emudeceu. Olhou para os amigos. -"Eu? Sócia de vocês?!?" Stan foi taxativo. -"Se não aceitar removeremos aquele S agora." Sabrina os abraçou. Ela, Stan e Jeffrey se revezavam na coordenação das reformas, a empresa estava indo muito bem. As equipes de Jeffrey e Stan, trabalhando juntas, dava mais dinâmica as reformas. Os prazos eram cumpridos. Robert apareceu, seis meses depois, no aniversário de Thomas. Ele abraçou o aniversário. Após entregar o presente, uma camisa dos Lakers, Robert quis ir embora mas Sabrina o impediu. -"Sobrou um pedaço do bolo de chocolate. Sei que você gosta." Ele aceitou. Thomas o sequestrou e fez Robert jogar videogame com ele. O rapaz foi ao quintal. Thomas queria mostrar seu cachorro a Robert. -"Thomas não vai deixá-lo ir, Robert. Ele te ama." Disse Sabrina, sorrindo. -"E você?" Ela ficou sem reação. Robert se aproximou dela, aproveitando que Thomas se distraía com o cão. -" Que acha de ficar pra sempre aqui?" Ela estendeu a mão. Robert a segurou. -"É tudo que eu quero." Puxou Sabrina e a beijou. FIM

marcos dias macedo
Enviado por marcos dias macedo em 14/03/2021
Reeditado em 17/03/2021
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