COLAGENS
Quando acordou, olhou no canto do quarto, o velho e rasgado tênis all star azul, deixara ali de propósito, lembranças de suas lutas e das suas utopias, que estavam em frangalhos, tal qual o seu velho all star azul.
_Torturei sim, arrependo de não matado todos eles, gente ordinária! Naquele é que era bom, a gente resolvia tudo no cacete, no pau-de-arara, era só neguinho falar em revolução que o pau comia. Hoje não, é uma esculhambação só, tremo só de ouvir falar nessa tal de democracia, de direitos humanos, que nojo!
Meus pais me disseram que iam viajar e que voltariam em poucos dias, tinha seis anos, hoje tenho trinta anos, e até hoje não sei o paradeiro deles, às vezes sonho com eles voltando, naquele fusca vermelho, felizes, me tomando em seus braços, me abraçando e me beijando, em vão os procuro, como outros filhos de desaparecidos políticos, nada de resposta, continuam insepultos em uma vala comum, mas quanta dor isso me causa!