O abraço
Jaqueline acordou atrasada naquela manhã, havia ficado até a madrugada navegando nas redes sociais e procurando roupa nova em sites da internet, além de trocar mensagens com amigas sobre namoros.
Estava de mau humor, com sono e cansada, mas precisava ir à faculdade, pois era época de provas.
Vestiu-se correndo e foi até a cozinha, lá sua mãe, que a criara sozinha desde os 3 anos de idade, quando o pai dela havia deixado as duas.
Dona Maria a esperava pacientemente, quando ouviu barulho no quarto da filha, parou as costuras que fazia para sustentar as duas desde sempre e foi preparar um café, pois segundo ela, a filha precisava de “sustância” para aguentar os estudos. Preparou o café e sentou, quando a filha veio correndo ela disse:
- Jaque, meu amor, senta aqui e toma um cafezinho que seja.
A filha asperamente disse:
- Não tenho tempo, estou atrasada, estudei a madrugada toda e perdi a hora..Mãe, me dá um dinheiro, quero passar no shopping e comprar roupas para uma festa no final de semana?
- Mas, filha, tu comprou roupas na semana passada, nem usou ainda. - respondeu Maria.
- Deixa de ser pão-dura, é só uma calça e uma blusinha, ninguém repete roupa, vai querer que eu seja a única a passar a vergonha de postar fotos no Insta repetindo roupa..
E assim, Dona Maria foi até um pote e tirou cem reais e alcançou à filha dizendo que era tudo o que tinha, e jovem olhou secamente para a mãe dizendo sarcasticamente:
- Só isso? Não dá nem a blusa, não aguento mais essa pobreza, assim que puder me mando dessa vida, igual meu pai fez. - e assim arrancou o dinheiro da mão da mãe.
Dona Maria, balançou a cabeça e repetiu que era tudo que elas tinham e levantou os braços pedindo um abraço a filha que já se dirigia para a porta.
Jaqueline se virou e secamente disse:
- Não vou te dar abraço nenhum, velha canguinha e miserável, eu tenho é vergonha de ti, e não precisa me esperar para a janta, que não sei que horas volto, se é que volto. - e bateu a porta, sem ver que a mãe chorava e dizia para si mesmo:
- Eu só queria um abraço, se ela soubesse o que eu daria para que ela fosse feliz comigo, mas ela é jovem, vai entender.
Já era mais de 21 horas quando entrou pela porta dos fundos, viu a mãe sentada na cozinha, com os olhos tristes e perdidos, deu oi de longe, na tv comentavam de um acidente que havia ocorrido há algumas horas ali no bairro delas, três jovens tinham morrido em um acidente de carro quando vinham do shopping da cidade, o acidente foi tão forte que ainda não tinham conseguido identificar quem eram as vítimas.
Dona Maria disse:
- Deus, proteja minha menina.
Jaqueline achou estranho e disse:
- Mãe, eu estou bem.
Dona Maria olhou vagamente para ela, com os olhos mareados, balançou a cabeça e suspirou profundamente.
A jovem notando que a mãe estava estranha pensou que era porque elas tinham discutido pela manhã, então abraçou a mãe pelas costas, um forte abraço por cima dos ombros e falou ao ouvido dela:
- Mãe, eu te amo, te amo mais que tudo, desculpa por ter te falado aquilo!
A velha senhora se levantou, Jaqueline achou estranho a mãe não ter correspondido o abraço, na verdade a mãe mal olhou para ela, mas sabia que tinha sido muito rude e que ela devia estar magoada, porém ouviu quando a mãe, já indo para o quarto dela, dizer:
- Eu te amo, minha menina, não importa o que você fez ou onde esteja, eu sempre te amarei.
Jaqueline se sentia cansada, muito cansada, se lavou e deitou, estranhamente, nem pensou em mexer no celular, só queria ficar quieta, se sentia mal pelo que tinha feito com a mãe, pois nunca a vira com a cara tão preocupada e triste assim, algo estava diferente.
Ainda estava acordada quando viu a porta do quarto abrir, ouviu a respiração forte da mãe, mas não se virou e ouviu quando a mãe disse:
- Eu só queria ter te dado mais um abraço, Jaque..só isso.
A jovem se virou e disse a mãe:
- Mas eu te dei quando cheguei e tu nem me deu atenção.
Quando acabou de falar a mãe já fechava a porta, sem nem lhe dar atenção, tentou levantar, porém se sentia tão cansada que desistiu, pensou que no outro dia, com as duas descansadas ficaria tudo bem.
Dona Maria, olhou para a cama da filha e pensou em voz alta:
- Eu só queria ter te dado mais um abraço, Jaque..só isso.
Fechou a porta do quarto da filha, sabia que nunca mais conseguiria olhar para aquela cama vazia, mas tinha que ser forte e saiu.
Precisava ir reconhecer o corpo da filha, que aguardava identificação com as outras duas vítimas do acidente.
Na porta da casa sem entender bem o porquê parou e falou:
- Filha, eu não estou braba, nem chateada contigo, não precisa me pedir desculpa, eu te amo e isso basta!
Nesse instante, lá em seu quarto, a jovem sentiu uma sensação de paz e dormiu.