O PREÇO DA MORTE III
O PREÇO DA MORTE III
O defunto gritou na capa (da cela):
- Preciso cobrar o preço da minha morte!
O “parça” ouvindo o brado levantou-se de um papelão no chão.
Entreolhou o defunto.
E disse:
- Me tira daqui!
- Mas, o que foi que aconteceu? – interpelou o defunto.
- Você parou o carro, e desceu... De repente o outro carro atirando, você não se lembra?
- Eu não me lembro de nada!
- Só lembro asfixiado.
- Me tira daqui!
- Você sabe que não tenho nada a ver!
O Delegado de Polícia interveio, esclarecendo ao defunto.
- Tem um revólver que estava com ele.
O “parça” não escondeu o deslize.
- Peguei lá mesmo, achei que tivesse morrido, e a Polícia ia dar geral na tua casa.
O defunto, alquebrado, não desejou achar que o “parça”.
Era suspeito do assassinato.
A aparência do “parça” era deixar logo o xilindró.
O advogado desfalecido surge do nada e teoriza.
- A PM deve ter notícia do encalço do carro.
O Delegado de Polícia abafou a conversa, precisava tomar conta da Delegacia.
Pessoas velavam na porta querendo ver o defunto.
O defunto era benquisto, pelos parentes nem se fala.
A notícia da ressurreição se espalhava.
Ver pra crer.
A mãe do defunto confabulava com os familiares, que a morte do filho exigia vingança.
O pai, por seu turno, nem se importava mais com o filho, caçou um jeito de se aproximar do advogado e pedia conselhos de um seguro DPVAT antigo, que achava que tinha na Justiça, e que até hoje não recebido nada.
Em cidade pequena é tudo perto.
Fizeram então o cortejo.
Não em direção ao cemitério.
Mas em sentido à funerária.
Porquanto o defunto havia de devolver o veículo e o uniforme, usados como a maneira que encontrou, para alardear o próprio homicídio.
Ninguém havia dado conta de suas feridas.
O defunto pedira à empregada serelepe que lhe trouxesse uma muda de roupas.
Ao trocar-se, na sede da funerária.
O defunto ficou apenas de cueca, diante da mãe que o acompanhava.
A esposa do defunto pensava em fazer churrasco.
A filha, quem mais chorava durante o velório, repaginou o visual, e cintilava de felicidade com as amigas, pela vivacidade do pai.
O defunto também tinha ex.
Discreta, só desejava o bem do maltrapilho.
Um compadre católico poetizou na praça principal:
- Já que há tanto tempo ressuscitou o bem, o mal se achou no direito de ressuscitar também.
Para alguns aquilo podia ser obra do Mal.
E o morto-vivo seria encardido.
Parecia que não.
A mãe do defunto, que não se chamava Maria.
Viu as chagas, enquanto Ele se trocava.
O defunto era inoxidável.
As perfurações de tiros...
O defunto saiu da funerária, pedindo pra ver o carro Dele.
Estava recolhido no pátio da Polícia Militar, peneirado.
Outros julgavam o defunto, por causa de sua vida um tanto quanto perturbada.
Mais Ele se portava, de agora pra frente!
Convicto de cobrar o preço da sua morte.
Mas como se o covarde assassinato, tivesse ficado para trás.
Havia morrido com o caixão vazio.
Muita gente ia perdendo o medo.
Chegavam a admirar o aguerrido defunto.
A visita ao pátio foi ficando pra depois.
Ele precisava de um pouco de Paz.
Aos poucos a multidão se dava conta, que aquilo tudo não tinha explicação.
Uma senhora evangélica testemunhou que o defunto era um anjo:
- Olhos azuis e cabelos encaracolados, ressuscitou um anjo! – ela comentava.
Cheguei a pesquisar na Bíblia algum tempo atrás todas as passagens que envolvem anjos, desde o livro do Gênesis até o Apocalipse.
Interessante que nós humanos, não somos mais valiosos que os anjos.
E os anjos nunca foram culpados por nossas mazelas.
Contudo.
Por que um moço haveria de ressuscitar, para cobrar o preço da sua morte?
Falando sério.
Se conjecturarmos que Lázaro verdadeiramente haja ressuscitado, possivelmente vive nas redondezas de Jerusalém, com a idade estacionada no vigor dos seus 80 (oitenta) anos; e os pés cascudos de mais de 2.000 anos de sola.
Antes que o (nosso) defunto encontra-se alento com a esposa, o Delegado de Polícia mandou um investigador notifica-lo para prestar depoimento na Delegacia, na manhã do dia seguinte.