O vampiro e o Fortnite

Jogando Fortnite

Ainda não estava com sono nem cansado, já jogava videogame com meu primo Diogo há mais de 7 horas sem parar, meus pais saíram às 13 horas para passar o final de semana em Gramado e desde as 14 horas estávamos online, coisa normal para nós.

Meu pai já havia me ligado para ver se estava tudo bem, ele achava que quando eles viajavam, eu fazia festas ou junção na nossa casa, porém, mesmo com 17 anos de idade, ainda preferia mil vezes ficar jogando Fortnite online com meu primo.

E assim estávamos cada um no conforto de seu quarto, com seu videogame e com sua tv, não havia razão alguma para ele vir aqui ou eu ir até a casa dele, afinal, passávamos 24 horas online, via jogos ou pelo whats e naquele dia estava assim, tudo normal.

Já tínhamos acumulados muitas vitórias e disse a ele que precisava tomar um banho e fazer um lanche, então marcamos para logo nos falarmos novamente, na verdade, nem saímos da ligação, apenas deixava o telefone no mute.

Pedi um pastel pelo aplicativo e em meia hora já entregariam o lanche, arrumei minha roupa e desci para alimentar nossa cachorrinha na cozinha.

Estava servindo a ração quando tocou a campainha, achei estranho, pois não tinha passado nem 3 minutos, caminhei até a sala e gritei:

- Quem é?

Nada, sem resposta, as luzes da sala estavam desligadas, perguntei novamente, continuei sem resposta, havia um silêncio gelado, resolvi ir pé por pé até a porta, me abaixei e olhei pelo vão da porta, dois sapatos de couro, só consegui ver os solados, e dei um pulo para trás, pois o estranho agora batia fortemente, chegou a tremer a porta, eu engatinhava para trás e a voz de meu primo veio da porta:

- Arthur, sou eu, o Diogo, seu primo, me deixa entrar.

Eu pensei rápido, não pode ser ele, há 5 minutos nos falamos e ele estava a uns 30 minutos de minha casa, além disso, com certeza ele só usava tênis, nunca usou sapato com sola de couro!

Eu, já distante da porta, respondi:

- Eu sei que não é o Diogo, quem é você? O que você quer?

Segundos de silêncio que pareceram horas, e aquela pessoa lá de fora disse:

- Sou o entregador, vim trazer teu lanche, deixe-me entrar…

Eu não sabia quem estava ali, mas era algo que mudava de voz e, com certeza, eu estava apavorado e para aumentar meu pavor eu lembrei de que não havia chaveado as portas, corri para fechar a porta dos fundos, e vi um vulto passando pela janela da sala, ele estava indo para a cozinha, corri, consegui chavear antes de ele chegar lá, e ele começou a bater, com toda a força, agora eu ouvia a voz de meu pai falando para eu abrir.

Corri desesperado para o segundo andar, entrei no meu quarto trancando a porta, chamei meu primo no whats, ele estava offline, vi no PS4 que ele tinha saído há alguns minutos também, deve ter aproveitado para ir lanchar quando eu fui, liguei para meus pais, não atenderam, e a coisa estava novamente tocando a campainha.

Lembrei das câmeras de segurança, acessei pela TV do quarto, nas imagens não aparecia nada, simplesmente não havia ninguém lá, mas a campainha continuava tocando e também havia agora as batidas fortes na porta da frente, eu não estava louco, precisava me acalmar e pensar, me sentei na cama e respirei fundo, e descobri, eu já sabia o que era aquilo!

Um vampiro, só podia ser um vampiro, pois eles podem imitar vozes, ler mentes e não aparecem em filmagens e fotos, e também não podem entrar nas casas sem consentimento, esse devia estar há horas me cuidando, sabendo que eu estava sozinho e queria me fazer de vítima.

Olhei para cima da minha cama e vi um rosário que havia ganhado de minha mãe, peguei e comecei a rezar de joelhos.

Notei que as batidas e a campainha pararam, não sabia há quanto tempo, pois rezei com tanta concentração que me perdi no tempo!

Estava me levantando quando senti uma sombra crescendo na janela do meu quarto, eu estava de costas, mas notei que a luz que vinha da rua estava mais escura, virei-me, ele estava lá, era um homem velho, careca e muito feio, os olhos escuros, como se usasse lápis nos olhos, tipo alguns Youtubers, estava de terno preto, tudo era preto nele, menos a pele, que era branca como a neve, agora eu tinha certeza, era um vampiro, que estava ali fora.

Ele olhava para mim pela janela do segundo andar, o susto foi tanto que demorei para entender que ele estava parado ali fora, sem encostar em nada, ele voava, ou melhor, pairava a uns 3 metros do solo sem esforço algum, e foi que ele me disse:

- Não tenha medo, eu serei teu amigo, apenas me deixe entrar, poderemos jogar Fortnite pela eternidade…

Eu estava apavorado, não me mexia, apenas admirava aquele rosto branco falar comigo, enquanto os lábios sem cor se moviam, eu via as presas enormes, não é como nos filmes e desenhos, é bem pior, parece mais a boca de um tubarão-branco, com tantas presas que não cabem dentro da boca, mas, mesmo assim, a cada palavra eu sentia mais vontade de deixá-lo entrar.

Estava quase decidido quando meu telefone tocou, era o Diogo, eu ouvia o telefone tocar, mas não conseguia tirar os olhos do vampiro, era como se eu estivesse hipnotizado, então, a campainha estridente tocou forte, e a junção desses dois sons me trouxeram a realidade assustadora na qual eu estava vivendo, cai para trás e tirei os olhos dele, vi de relance na TV que havia alguém na porta, era o entregador quem estava lá.

Comecei a gritar para ele sair dali e como um raio o vampiro sumiu, mal deu tempo de ver na televisão quando ele levantou o motoboy, como se fosse uma águia pegando uma pequena presa sem peso, o rapaz não teve reação alguma, não deve nem ter visto o que o agarrou de tão rápido.

Peguei o telefone e gritei ao meu primo:

- Chama a polícia, chama a polícia!

Meu desespero era tanto que ele nem pensou muito, em minutos a polícia estava ali e ele também, encontraram-me dentro do roupeiro, ainda com o rosário na mão.

Acharam o corpo do entregador dois dias depois, decapitado em um matagal longe, a moto que estava na frente da minha casa e o pedido serviram para que eu fosse investigado, mas logo viram que na hora presumida da morte, quando a polícia já estava lá em casa, e a distância da minha casa para o local no qual acharam o corpo, descartava-me de qualquer suspeita.

Fiquei internado algumas semanas em um sanatório, preferi assim, mesmo sabendo o que realmente tinha matado aquele rapaz, insistir na história do vampiro só dificultaria tudo, era bem mais fácil para todos, inclusive para mim, acreditar na versão oficial de que eu fantasiei tudo e o entregador foi vítima de latrocínio.