O mau que espreita
O cachorro latia insistentemente. Os ganidos variavam de raivosos a chorosos. Algo o perturbava a paz. Isso era fato. Mas o que poderia ser? E por que os cães da vizinhança não aderiram àquele protesto?
Apesar do estado de torpor, Lucas saltou da cama, calçou as chinelas e com o cobertor caído nos ombros saiu com a intenção de calar seu cãozinho. O Tommy.
Sentiu algo estranho assim que penetrou a sala. Os latidos de Tommy pareciam direcionados a porta da frente e não a rua.
“Tudo bem amigão? To tentando dormir”Carinhosamente disse o dono.
.... O cão latia obstinadamente. Desesperado com alguma coisa.
Ignorou o dono.
No cômodo não era possível divisar nada. A escuridão imperava. O rapaz deslizou o corpo premendo-o na parede. Tateando cada milímetro em busca do interruptor da luz.
O cachorro começou a riscar a porta.
“Tommy!!? Pare agora com isso!!. Sou eu. Não reconhece minha voz?” esbravejou irritado.
Não surtiu efeito algum...
Lucas achou o interruptor. Pressionou uma vez. O recinto continuou mergulhado na escuridão. Pressionou novamente. Nada.
“Que diabos, mas uma queda de energia noturna?” se questionou, confuso.
De repente algo caiu ao chão tilintando. O som denunciava o que pareciam ser chaves. Provavelmente o molho da casa. Que ficava na dependência de jantar.
Lucas rodopiou na direção do som: “Tem alguém aí? Vou ligar para polícia agora mesmo”
O coração dele foi acelerando. Cada batida começou a doer. Como se fosse explodir no peito e vazar por todos os orifícios. Tentou o interruptor mais uma vez. Sem sucesso.
Ignorou o cachorro à porta. Que agora, além de arranhar, choramingava mais que latia.
Espremeu os olhos. Nada conseguiu divisar. É como se a escuridão tivesse tomado a substância de uma buraco negro e desintegrado qualquer fragmento de luminosidade.
O rapaz foi de encontro a sala de janta. Ao caminhar, as pernas projetaram-se vacilantes. Sentiu o corpo gelar. A fronte, de repente, porejada. Foi tomado por um pressentimento estranho.
Teve certeza. Aquela escuridão aninhava algo insidioso. Malévolo. Fosse o que fosse, já estava dentro da casa.
Parou de andar a meio caminho do outro cômodo. Estava cego. Não havia penumbras para contornar o ambiente. Sentiu que estava bem próximo a coisa.
Bradou ameaças: “Se eu te pegar te quebro em dois. Seja quem for, saia da minha casa agora.” a voz aguda e engrolada ao se expelir das cordas vocais.
Num misto de fúria e desespero, começou a desferir golpes imprecisos. Como se lutasse contra o mal invisível.
Nesse instante o cão, que já estava enlouquecido, arranhava com mais força e determinação. Estava prestes a abrir caminho pelo carvalho da porta.
Lá pelo quarto murro desferido a esmo o punho de Lucas pousou num tórax forte, titânico. O agredido não cedeu posição. Não se abalou.
Lucas fez menção de gritar, mas o grito morreu na garganta. Teve seu pescoço contornado por mãos que pareciam de metal.
E o suspendendo no ar, as mãos começaram a comprimir sua garganta. O som de ossos quebrando tomaram a sala de jantar. Lucas gorgolejou e silenciou. Fluidos gotejavam e ressoavam no piso.
................................................
O corpo lívido e sem vida desabou ao chão. E algo, destruindo a janela dos fundos, partiu em retirada. Como um míssil esfarelando seu alvo.
Do lado de fora, o cão acamou, parou de choramingar e arranhar. Deu um uivo de finalização e também silenciou.