Primeiro Dia
O primeiro dia em um emprego novo é sempre assustador. Eu me encontrava em uma sala pequena onde as gavetas complementavam o cenário vazio que quase não possuía outras mobílias. Eu nunca havia trabalhado no período noturno. Era a primeira vez. Seria até mais horripilante se não fosse pelo fato de eu não estar sozinho. Comigo, havia um colega de trabalho. Seu nome era Marcos, um sujeito bacana, porém taciturno. Os outros funcionários do período diurno me ensinaram todos os meus afazeres durante o treinamento. Sendo assim eu não precisava da ajuda de Marcos. Além do mais eu já era experiente em minha área, apesar de estar reiniciando minha carreira em um novo emprego. Logo, eu fazia a minha parte sem nenhum problema e ele, Marcos, seguia com a sua rotina normalmente, sem dizer uma palavra sequer. Algum tempo se passou quando escutei uma voz me chamando. Olhei para Marcos, mas ele ainda estava quieto. “Pelo jeito estou ouvindo coisas”, pensei; afinal, Marcos estava de boca fechada até então. Eu sempre achei que poderia começar a escutar vozes. Segundo meu psiquiatra a esquizofrenia por parte da minha mãe poderia ser uma doença hereditária, pois há casos semelhantes espalhados pela minha família. Como eu tenho medo de enlouquecer, sempre procuro conversar com psicólogos e médicos para que essa minha insegurança em relação à minha sanidade seja devidamente tratada. Por isso suspirei fundo e coloquei meus pensamentos em ordem. “Provavelmente foi a minha imaginação”, conclui, mas fui surpreendido ao ouvir um grito desesperador e estridente que ecoou pela sala. Todos os sentidos do meu corpo entraram em ação fazendo com que meu coração acelerasse e minhas pernas começassem a tremer. Era o medo invadindo meu sistema nervoso. Olhei para trás rapidamente e me deparei com Marcos gargalhando, pois ele havia soltado um grito no intuito de me assustar: “Funcionou sua peste!”, respondi tentando sorrir, mas sem deixar de sentir os efeitos que restavam da adrenalina liberada em meu organismo. Eu não conhecia muito bem o meu colega, então depois dessa brincadeira começamos a conversar. Passamos a noite inteira falando sobre os mais variados assuntos. Eu ri quase a noite toda, pois Marcos era muito mais carismático e extrovertido do que eu achava. O tempo passou rapidamente, e logo a manhã começou a anunciar a sua chegada. Era a hora de encerrar o nosso expediente. Me despedi do meu colega apertando a sua mão gelada e empurrei o leito aonde ele jazia para dentro da gaveta oriunda da câmara fria. Girei a trava de segurança e tranquei a porta com o resistente cadeado enquanto me preparava para ir embora. Fui elogiado por tamanha dedicação ao meu trabalho no necrotério naquele dia, pois consegui fazer a autópsia de Marcos com sucesso. Para uma primeira vez até que eu me saí bem...
(Guilherme Henrique)>> Voltei ;D