Sexta-feira, 00:02
Acabo de acordar de um pesadelo. Desde que eu era criança eu não tinha um, mas esse foi totalmente diferente. Nunca um sonho foi tão vívido, nunca acordei tremendo, suando e com um grito preso na garganta. Acho que nunca tive tanto medo na minha vida.
Não sei por que resolvi pegar caneta e papel na mesinha de cabeceira para escrever este sonho que parece ter durado dois séculos, embora eu saiba que peguei no sono há quinze minutos atrás.
Sonhei que escrevia sentado em minha cama quando me senti observado. Aquele olhar queimava minha nuca, e por mais que eu me esforçasse para crer que tudo era obra da minha imaginação, não consegui e me virei lentamente. E lá estava ela me olhando da janela. Me apavorou o fato de que ela poderia cair daquela altura, pois moro no décimo andar, mas em nenhum momento me espantou o fato de que ela estava flutuando àquela altura. Apenas me senti incrivelmente feliz por ela ter voltado para mim mais linda do que nunca.
Lívia estava lá, apresentando o seu olhar mais doce para mim, com as ondas de seu cabelo emoldurando o rosto delicadamente rosado e descendo até o busto. Nenhum pintor na face da terra poderia imprimir na tela a luminosidade de sua face, a brancura de seu vestido e o castanho de seus olhos e seus cabelos, aquele castanho que é feito de luz do sol.
Ela havia partido há quase um ano e me deixado tão desesperadamente só, que quase morri. Partiu repentinamente na véspera do nosso casamento.
Nenhum médico pôde determinar porque ela morrera, apenas sabiam que “uma forte hemorragia interna de origem indeterminada” havia ocorrido no curto espaço de tempo de cinco minutos em que ela ficou sozinha no quarto. Ela experimentava seu vestido de noiva com o auxílio de sua irmã, que desceu as escadas para atender a porta e quando voltou a encontrou morta, ainda com o vestido.
O vestido... Dizem que dá azar o noivo ver o vestido antes do casamento. Mas não haveria casamento porque (que azar...) a noiva morrera! Morreu vestida como uma deusa grega.
E era com aquele mesmo vestido que ela me olhava agora. Mas num piscar de olhos ela sumiu, para aparecer agora à minha direita. Eu me virei para vê-la, mas não conseguia; apenas percebia sua presença ao meu lado. E foi então que tudo começou; eu a senti bem próximo, e ouvi sua voz dizendo:
- Corre!
[CONTINUA]