O LOBISOMEM

O LOBISOMEM

by: Johnathan King

***

A noite estava clara. As estrelas, frias e brilhantes, cintilavam, enquanto a meia-lua banhava a cena com a sua luz suave e difusa.

Na praia, rolos de neblina rastejavam pela areia molhada, formando uma camada densa, sobre a qual o chão parecia flutuar como um estranho navio num mar nebuloso.

Uma sombra escura assomou por trás das rochas, saindo do nada. Um homem despido e com semblante abalado. Ele mancou até próximo da água.

Caiu.

Ajoelhado na areia molhada, sentiu uma torrente de adrenalina misturada com dor. Ele bradou ferozmente, encarando o céu.

A lua.

A neblina tornava aquele lugar parecido com o paraíso.

Como se alguma espécie de demônio estivesse-lhe controlando o homem começou a rolar na areia, parecendo sentir uma dor insuportável. Arranhando desesperadamente o rosto, a sua pele feriu e sangrou.

O homem abaixou a cabeça e fechou os olhos com toda força. Ele lutava para não se deixar dominar por aquele sentimento conhecido... "aquela força que costumava arrastar a sua mente para o vazio", transformando-o numa fera selvagem.

Começou aí então uma torturante transformação.

Os seus ossos começaram a estalar, parecendo que estavam a ser quebrados. O homem urrou de dor. O rosto foi se alongando para a frente, ganhando contornos caninos. Os pelos do corpo cresceram. Eram grossos e negros. As orelhas ficaram pontiagudas e os caninos ameaçadores. Os seus olhos vermelhos encaravam o alto.

A dor do homem por fim desapareceu e agora, transformado em fera, ele uivou.

O grande cão negro saiu a correr para a beira da orla, na direção da cidade.

***

Os cães da cidade despertaram com o uivo da besta. Cada um procurou abrigo para se esconder, visivelmente amedrontados.

Uma mulher estava a deixar o trabalho de garçonete num café. Ela também escutou o uivo do animal e ficou intrigada. Não ao ponto de dar muita importância, achou ser um cachorro vadio de rua. Enquanto andava, ela tentava concentrar os seus pensamentos em coisas triviais do quotidiano.

Outra vez o mesmo uivo aterrador. A mulher tremeu e reagiu, andando mais rápido, enquanto que procurava a chave de casa dentro da sua bolsa.

Às ruas se encontravam vazias àquela hora, já passando da meia-noite, e as únicas almas visíveis eram os gatos em cima dos telhados das casas, parecendo agitados.

A mulher começou a dar passadas longas e fluidas... uma certeza perturbadora no andar. Ela arriscou uma corrida quando sentiu algo se aproximando dela, por trás, e parou instintivamente.

O sangue esfriou.

A lua brilhava lá no céu. A rua estava envolta sob uma neblina sobrenatural, espessa e definida. De repente, a mulher ouviu o som fraco de patas vindos de algum lugar daquela névoa bizarra.

Ela arriscou olhar para trás e viu duas chamas brilhando vivamente ao luar, parecendo flutuar no vazio. A mulher saiu a correr completamente apavorada, enquanto seu perseguir emergiu de dentro da neblina.

Um cão, enorme e negro, com olhos que brilhavam estranhamente e uma bocarra mortal. Era uma criatura horripilante.

Um lobisomem.

A mulher corria desesperada, olhando para trás, com o rosto pálido iluminado pelo luar e as mãos erguidas em horror, observando impotente a coisa assustadora que a perseguia.

Com grandes saltos, a enorme criatura estava a alcançar sua vítima, que corria e gritava de horror, se sentindo esgotada fisicamente. A mulher chegou num beco, estava encurralada. Mesmo assim, ela não se deu por vencida e tentou pular um muro que dava para uma rua lateral, em vão.

O lobisomem pulou sobre a mulher, jogando ela no chão e dilacerando a sua garganta.

***

De repente, a cidade acordou assombrada com os gritos de terror da mulher. Os cães se encolheram nos seus esconderijos e os gatos fugiram dos telhados temerosos.

Os homens da cidade procuraram se armar, enquanto as mulheres ficaram em casa com as crianças. Um grupo se formou na praça central, nenhum deles sabia com o que estavam a lidar, o que surpresas aguardava por eles aquela madrugada.

Não foi preciso andar muito para terem a primeira delas, a um quilômetro e meio de distância os homens encontraram o corpo da vítima. A visão era grotesca, e muitos não conseguiram conter a ânsia de vômito.

O corpo da mulher, ou o que sobrou dele, pedaços espalhados por todo o lado, uma cena chocante e bizarra. Algo inimaginável de se acreditar. De uma coisa todos ali estavam convencidos -"aquilo não tinha sido obra de uma pessoa, mas sim de algum animal selvagem".

À medida que as buscam pelo misterioso agressor da mulher prosseguiam, uma estranha sensação de que estavam a ser observados por uma força invisível e maligna tomava conta do inconsciente de cada homem, fazendo com que temessem por suas vidas.

O primeiro a experimentar a sensação de terror foi um rapaz jovem de corpo magricela e bastante alto. Ele estava sozinho, havia ficado para trás e se separado do seu grupo. Quando ele deu pela presença da fera assassina próximo dele, não tinha muito mais o que fazer. A cor da sua face sumiu naquele instante. Os seus lábios secos foram incapazes de emitir qualquer que fosse o som.

O vento frio da madrugada batia nos rostos dos homens com força, os deixando despertos. Eles tinham a nítida impressão de que estavam a andar no escuro e dando voltas no vazio.

Nada acontecia.

Rastejando nas sombras e protegido pela neblina, o monstro ia a fazer uma vítima atrás da outra, usando sempre a tática do ataque surpresa, impossibilitando a defesa da presa.

O lobisomem começou a se mover, lentamente, na direção dos caçadores, mas audacioso. A besta saltou sobre o grupo. Antes de ter a hipótese de fazer uma nova vítima, ela foi pega de surpresa por um caçador que havia se distanciado do restante. Ele acertou um tiro no monstro, o fazendo soltar um urro terrível.

Os outros olharam para trás, todos ficaram paralisados de horror diante da visão do monstro. De fato eles estavam olhando para um lobisomem.

O animal saiu a correr, uivando de dor. Os homens despertaram do transe que se encontravam, ainda abalados. Agora, ainda mais determinados, eles foram atrás da criatura. O bicho estava ferido, havia sentido o impacto do tiro, sinal que era vulnerável, podia morrer.

Os caçadores foram a seguir o rastro de sangue deixado pelo lobisomem, não tardaram em encontrá-lo.

Tiros.

O monstro urrou furiosamente, era horrível em tamanho e força. Continuou a correr, agora mais lentamente, até cair, ofegante. Com um último uivo de agonia, o lobisomem rolou para o lado, e ficou imóvel. A besta estava morta.

Os presentes arregalaram os olhos quando viram o monstro voltando ao seu estado natural, um homem de meia-idade e corpo robusto.

FIM

Johnathan King
Enviado por Johnathan King em 15/06/2020
Código do texto: T6977890
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